Uma auditoria às contas de 2017 da associação Raríssimas, antes do escândalo que abalou a instituição, não identifica erros materiais, mas encontra "procedimentos insuficientes", refere falta de informação e alerta que o futuro da associação que apoia crianças com doenças raras pode estar ameaçado.
Segundo o relatório da auditoria, com data de janeiro, mas só hoje publicado na página da associação, a 31 de dezembro de 2017 o balanço nessa data indicava um total de 6.163.541 euros e fundos patrimoniais de 3.743.959 euros, incluindo um prejuízo de 626.218 euros.
A sociedade que efetuou a auditoria entende que "as demonstrações financeiras anexas estão preparadas, em todos os aspetos materiais, de acordo" com as normas. Mas explica depois as bases para opinião com reservas, relacionadas com procedimentos insuficientes e falta de informação.
A Raríssimas -- Associação Nacional de Deficiências Mentais Raras, foi fundada em abril de 2002 e destina-se a apoiar pessoas com doenças raras. Em dezembro de 2017 uma reportagem na TVI denunciava irregularidades na gestão da associação.
O escândalo levou à demissão do então secretário de Estado da Saúde, Manuel Delgado, e afastou a presidente da associação, Paula Brito e Costa, que segundo as notícias da altura usava o dinheiro da Raríssimas para gastos pessoais.
"Os procedimentos contabilísticos adotados pela Entidade no registo das compras, doações de inventários, inventários e respetivos consumos, são insuficientes para garantir o seu controlo efetivo. Adicionalmente, os procedimentos seguidos durante o período foram objeto de várias alterações", lê-se no relatório de auditoria.
Por esse motivo, os auditores não se pronunciam sobre valores de inventários de 28.498 euros, nem sobre o custo das mercadorias vendidas e matérias consumidas no montante de 122.204 euros.
A auditoria nota também que os fundos patrimoniais não sofreram alteração desde 2016, quando devia ter sido reduzido em 2017.
"Não tendo sido possível obter informação sobre quais os ativos subsidiados ou doados, não nos é possível identificar o valor das respetivas depreciações, nem, consequentemente, determinar os respetivos impactos nos resultados e nos fundos patrimoniais da Entidade que resultariam de tais imputações", lê-se no documento.
Nele nota-se também falta de informação sobre dois outros montantes, um pouco acima de 100.000 euros e outro de quase 150.000 euros, e regista-se que os auditores não tiveram respostas a todos os pedidos dirigidos às entidades bancárias.
"(...) Pelo que não podemos concluir sobre a razoabilidade e a adequação dos saldos apresentados na rubrica de Caixa e Depósitos Bancários, em 31.12.2017, no montante de 157.032 euros", dizem os auditores.
O documento fala ainda de valores que "não conciliam" e de 62.894 euros que apresentam "claros indícios de imparidade".
No relatório, os auditores apresentam ainda dúvidas sobre a capacidade de a Raríssimas continuar a trabalhar, por um passivo corrente superior ao ativo corrente, por indicações de retirada de apoio de doadores, por rácios financeiros adversos, por "perdas operacionais substanciais", por incapacidade de pagar aos credores nas datas e por dificuldades laborais.
Na auditoria de 2016 (feito por uma outra empresa) evidenciava-se "três reservas por limitação de âmbito relacionadas com as rubricas de créditos a receber, subsídios e caixa e depósitos bancários que se mantém na nossa opinião expressa no presente documento", pode ler-se ainda no relatório hoje publicado.