O Conselho Superior da Magistratura (CSM) chumbou esta terça-feira a proposta de arquivamento do processo disciplinar aberto contra o juiz Neto Moura. Em comunicado, o CSM avança que vai continuar a analisar o caso, embora com mudança de relator.
"O Conselho Superior da Magistratura ponderou que a censura disciplinar em função do que se escreva na fundamentação de uma sentença ou de um acórdão apenas acontece em casos excecionais, dado o princípio da independência dos tribunais e a indispensável liberdade de julgamento, circunstancialismo que se considerou verificado no caso vertente, em virtude de as expressões em causa serem desnecessárias e autónomas relativamente à atividade jurisdicional”, lê-se no comunicado daquele órgão, divulgado esta terça-feira.
Com oito dos membros a votar a favor e sete contra, o plenário do CSM, reunido esta terça-feira, considerou que no caso em apreciação "as expressões e juízos utilizados constituem infração disciplinar, pelo que foi rejeitado o projeto de arquivamento apresentado a Plenário e determinada a mudança de relator, para apresentação de novo projeto na próxima sessão do plenário”.
O Conselho Superior de Magistratura instaurou o inquérito em Outubro de 2017.
Em causa está um acórdão da Relação do Porto, de outubro de 2017, no qual o juiz relator, Neto de Moura, faz censura moral a uma mulher de Felgueiras vítima de violência doméstica, minimizando este crime pelo facto de esta ter cometido adultério.
O juiz invoca a Bíblia, o Código Penal de 1886 e até civilizações que punem o adultério com pena de morte, para justificar a violência cometida contra a mulher em causa por parte do marido e do amante, que foram condenados a pena suspensa na primeira instância.
"O adultério da mulher é uma conduta que a sociedade sempre condenou e condena fortemente (e são as mulheres honestas as primeiras a estigmatizar as adúlteras) e por isso vê com alguma compreensão a violência exercida pelo homem traído, vexado e humilhado pela mulher", lê-se na decisão do tribunal superior, também assinada pela desembargadora Maria Luísa Abrantes.
O acórdão causou grande polémica na altura. A Associação Portuguesa de Mulheres Juristas, a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima, a UMAR - União de Mulheres Alternativa e Resposta, foram algumas das entidades que se manifestaram contra a fundamentação do Tribunal da Relação do Porto.
Foi também feita uma petição, que foi assinada por mais de cinco mil pessoas, que pede uma tomada de posição do CSM e do Provedor de Justiça e apela a uma "reflexão urgente e séria" sobre a necessidade de alterar o sistema de e/ou avaliação dos juízes, "para que casos como este sejam evitados no futuro".
O assunto provocou também muita crítica e vasta discussão nas redes sociais.
Sem se referir diretamente ao caso, o próprio Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, afirmou que em Portugal vigora a Constituição de 1976 e as leis que vigoram ao abrigo dessa Constituição."O Presidente da República jurou cumprir e fazer cumprir a Constituição da República Portuguesa, como, aliás, deve acontecer com todos os titulares de órgãos do poder político", realçou.