Eis mais um final de legislatura à portuguesa numa verdadeira arte de deixar centenas de diplomas para o último dia de votações no plenário do parlamento. Esse dia é esta sexta-feira e promete ser longo, começando logo às nove da manhã com a leitura da mensagem do Presidente da República sobre o veto à lei que regula o lóbi, depois a discussão sobre o relatório da comissão de inquérito à recapitalização da Caixa Geral de Depósitos ou ainda o relatório anual de segurança interna e o da provedora de justiça.
Antes das votações ainda há tempo para discutir uma petição de Associação ANIMAL, “Por um circo livre de animais em Portugal” e depois, então, entramos nesse período que não se sabe a que horas irá terminar. O guião ordinário tem 110 páginas, mas poderá como que duplicar ou mesmo triplicar, tendo em conta a previsível quantidade de pedidos de avocação de diplomas para plenário com direito a discussão.
Será o caso da lei de bases da saúde, em que já é certo que o PS irá avocar o texto da comissão, apresentando a alteração que irá permitir que PCP e Bloco de Esquerda viabilizem um dos pacotes legislativos mais polémicos desta sessão legislativa e que dividiu os parceiros da maioria parlamentar. Deverá ser também o caso da legislação laboral em que a expectativa é que o PSD dê a mão ao PS e ao governo. Em votação vão estar alterações ao Código de Trabalho, a regulação dos contratos a termo certo de trabalhadores à procura do primeiro emprego e desempregados de longa duração, o banco de horas ou as regras para o trabalho temporário. Tudo assuntos acordados em concertação social e em que a esquerda apresentou alterações, que o PS deixou passar à especialidade, mas rejeitou em comissão.
Ainda na área da saúde, registo para o texto final da comissão e que é votado esta sexta-feira e que dispensa a cobrança de taxa moderadora nos cuidados de saúde primários e nas demais prestações de saúde, sempre que a prescrição seja feita por médicos do Serviço Nacional de Saúde. Em votação vai estar também uma recomendação do PSD ao governo para a realização de um estudo que permita avaliar os termos da revisão da carreira especial de técnico superior das áreas de diagnóstico e terapêutica.
A gestação de substituição também está de volta ao plenário da Assembleia. O diploma vulgarmente conhecido por “barrigas de aluguer” regressou ao parlamento por imposição do Tribunal Constitucional, já que na primeira lei não constava o período de arrependimento da gestante. O que é proposto agora é que esse período possa ir até ao registo da criança, ou seja, até vinte dias depois do nascimento. Mas o PSD, que dá liberdade de voto na lei, mas impões disciplina de voto no artigo relativo ao arrependimento da gestante, pode inviabilizar o novo articulado ou, então, pode ser aprovado um articulado
O pacote da transparência também deverá ficar fechado esta sexta-feira. Para além dos acertos pedidos pelo Presidente da República no que diz respeito à prática de lóbi, o texto que vem da Comissão Eventual vai votar projectos com vista à criação da Entidade para a Transparência do exercício de cargos públicos.
Da primeira comissão surgem vários diplomas. Há várias resoluções a recomendar ao Governo a revisão da lei que regula as custas processuais, há também a proposta de lei do governo que aprova o estatuto do Ministério Público. Da comissão de assuntos constitucionais surge também um extenso rol de legislação relativa à violência doméstica e que implicam alterações ao Código Penal. O PSD, por exemplo, pede o aumento das penas relativas a este crime, com as diversas bancadas a pedirem mão de ferro em relação à prática do crime de perseguição, violação, coação sexual e abuso sexual de pessoa inconsciente ou incapaz.
Dos parabéns à seleção de hóquei à sesta no ensino pré-escolar
Dos dossiês difíceis às bagatelas legislativas. Assim pode ser descrita a sexta-feira mais longa das votações em plenário da Assembleia da República. Da autêntica salada de frutas de diplomas há a registar algumas que não dão tanto nas vistas, mas que assumem interesse relevante paras as bancadas parlamentares que as apresentam e colocam a votação.
Vejamos exemplos. O PCP e o PAN recomendam ao Governo que estude a possibilidade de introdução da sesta na Educação Pré-Escolar. Ainda o PAN, partido do deputado único André Silva, apresenta um projecto de lei que determina a admissibilidade de alimentação de animais errantes. Ou o Bloco de Esquerda que propõe uma resolução que protege a importância histórica e social das repúblicas de estudantes da cidade de Coimbra.
A sessão de votações deverá abrir com o voto de congratulação pelo reconhecimento do Real Edifício de Mafra e do Santuário do Bom Jesus, em Braga, como Património Mundial da Unesco e a inclusão também do Museu Nacional de Machado de Castro, em Coimbra. Depois, há também a saudação pela conquista do título do Mundial pela seleção portuguesa de Hóquei em Patins, na sequência do jogo que decorreu frente à Argentina e que os portugueses venceram nas grandes penalidades.
Há também algumas provocações entre bancadas. A do PCP ao PAN, por exemplo. Os comunistas apresentam um voto de condenação “pela atitude discriminatória e xenófoba assumida por uma representante do PAN”, a que a bancada de André Silva responde com um voto de condenação pela “repressão e perseguição aos cristãos e católicos na China” ou com uma outra condenação “pela perseguição aos Uigures pela China”.
Mas, há também uma saudação do PS pelos “50 anos da ida da Humanidade à Lua” ou ainda o projecto de lei do PAN sobre o destino a dar às pontas de cigarro, vulgarmente conhecidas como “beatas”. Da comissão de ambiente, PCP, Bloco de Esquerda e PAN trazem projectos com vista a acabar com pratos, copos e talheres de plástico descartável na restauração e estabelecimentos comerciais.
Expectativa ainda para saber o que pode acontecer a diplomas como o do PCP que propõe a “declaração da atribuição de 1 por cento do PIB ao Orçamento do Estado para a Cultura como meta a atingir no sentido da democratização cultural” ou ainda ao texto final da comissão de educação que “estabelece mecanismos de regularização de dívida por não pagamento de propinas em instituições de ensino superior públicas”.