Empresa familiar de Pedro Nuno Santos fez ajuste direto com o Estado. Ministro arrisca demissão?
07-10-2022 - 21:01
 • Renascença

Lei estabelece que uma empresa detida em mais de 10% por um titular de cargo político e um ascendente está impedida de beneficiar de contratos públicos. Ministério das Infraestruturas diz não haver qualquer incompatibilidade, alegando que proibir a participação em concursos públicos de empresas detidas por familiares dos titulares de cargos políticos, "atentaria contra a liberdade de iniciativa económica privada", o que, "em última análise, implicaria a sua inconstitucionalidade".

Uma empresa detida pelo ministro das Infraestruturas e da Habitação, Pedro Nuno Santos, e pelo pai, beneficiou de um contrato público por ajuste direto, o que configura uma incompatibilidade, avança o Observador.

Em causa está a lei que estabelece o regime do exercício de funções por titulares de cargos políticos.

O gabinete do ministro defende-se com um parecer da PGR de 1993, anterior à lei atualmente em vigor.

Nestes casos, a consequência é a demissão do ministro.

A polémica remonta a finais de junho: o Centro de Formação Profissional da Indústria de Calçado de São João da Madeira, concelho de origem de Pedro Nuno Santos, fez um ajuste direto com a Tecmacal, no valor de mais de 19 mil euros, para a compra de equipamentos no setor da marroquinaria.

De acordo com o artigo 11.º, esta “infração” implica que “titulares de cargos de natureza não eletiva, com a exceção do primeiro-ministro, a demissão.

Américo Augusto dos Santos, pai do ministro Pedro Nuno Santos detém 44% da Tecmacal.

Na declaração de rendimentos entregue pelo ministro no Tribunal Constitucional, a 28 de junho de 2022, Pedro Nuno Santos detinha 0,5% da empresa. Segundo o Observador, o ministro tem mais de 10% de uma sociedade “conjuntamente” com um ascendente.

Nestes casos, a empresa fica impedida de fazer contratação pública.

Na reação, o gabinete de Pedro Nuno Santos, considera que não existe nenhuma qualquer incompatibilidade, argumentando com um parecer da Procuradoria-Geral da República de 1993, logo anterior à lei das incompatibilidades.

Contudo, num esclarecimento enviado à Renascença, o Ministério das Infraestruturas diz que "as questões agora colocadas são inteiramente coincidentes com as que motivaram, em 2019, a solicitação de um pedido de parecer do Governo ao Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, o qual concluiu pela inexistência de incompatibilidades".

O parecer em questão, disponível para consulta no Diário da República, conclui que que "o então artigo 8.º da Lei n.º 64/93, deve excluir situações à partida abrangidas pela letra da lei".

"De outra forma, ao proibir a participação em todos os concursos públicos, por empresas detidas por familiares dos titulares de cargos políticos, atentaria contra a liberdade de iniciativa económica privada de forma desproporcional, o que, em última análise, implicaria a sua inconstitucionalidade", acrescenta a nota.

Por outro lado, o Ministério das Infraestruturas lembra que o ajuste direto em causa não foi celebrado numa área diretamente tutelada por Pedro Nuno Santos, o que invalida a tese da incompatibilidade.

"Nos casos em que as participações sociais não sejam detidas pelo próprio titular, apenas devem relevar quando se referem a concursos que foram abertos ou correm os seus tramites sob a direção, superintendência ou tutela de mérito do órgão do Estado em que o titular de cargo político exerce um cargo, o que não é o caso do Centro de Formação Profissional da Indústria do Calçado, ficando desde logo prejudicada qualquer questão de incompatibilidade", pode ler-se.

[notícia atualizada às 21h36 com esclarecimento do Ministério das Infraestruturas]