O vice-presidente do Conselho Português para os Refugiados (CPR), Tito Campos e Matos, considera que “falta mais solidariedade e, sobretudo mais partilha de responsabilidades" na Europa para se evitar as tragédias no Mediterrâneo com refugiados.
Em entrevista à Renascença e à Agência Ecclesia, o responsável insiste na necessidade da criação de “rotas seguras e legais para a Europa” e lamenta o último naufrágio em Pylos, onde morreram, pelo menos, 78 pessoas.
Em relação a Portugal, o vice-presidente do CPR aponta falhas no plano do processo de integração: "Neste momento, o grande desafio que Portugal enfrenta é, realmente, trabalhar a integração dos refugiados, a verdadeira integração."
Tito Campos e Matos defende a melhoria do acesso dos refugiados ao ensino e diz ser necessário “tentar criar condições para que possam ver reconhecidos os seus cursos, as suas profissões”.
“Se as pessoas não desenvolverem o português e não se reconhecerem as suas competências escolares e profissionais, nunca passam daqueles empregos com baixa qualificação e de baixos salários”, argumentta.
Nesta entrevista em vésperas do Dia Mundial do Refugiado, o vice-presidente do CPR revela "algumas dificuldades" em matéria de financiamento das suas atividades, por causa do processo de extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF). Ainda assim, Campos e Matos diz que o processo de transição que vai levar à criação da Agência Portuguesa para as Minorias, Migrações e Asilo não está a colocar em risco o direito ao asilo, embora haja “atrasos na análise dos processos”.
Tito Campos e Matos aponta o Papa Francisco como das pessoas que “mais alerta para questão dos refugiados no mundo e para os seus problemas” e revela que o CPR dirigiu um convite para que Francisco possa visitar as suas instalações, aquando da sua presença em Portugal, por ocasião da JMJ Lisboa 2023. “Através do Governo, dirigimos esse convite”, conta.
No final de 2022, de acordo com dados do ACNUR, havia mais de 108 milhões de pessoas deslocadas em todo o mundo. Os conflitos internacionais potenciam a fuga contínua, como vemos, agora, no Sudão. É expectável que esse número possa ser superior no final deste ano?
É um pouco imprevisível, porque os conflitos também são imprevisíveis, mas, de qualquer forma, espera-se que o número venha a aumentar. Aliás, já aumentou relativamente ao ano anterior, sobretudo o número de refugiados, porque estes 108 milhões incluem os deslocados internos, que é um número bastante grande. São pessoas que não conseguem sair dos países onde estão, ainda que estejam em fuga. O número de refugiados também tem vindo a aumentar, foram 35 milhões nos últimos dados, e prevê-se que aumente mais, inclusivamente, também em Portugal, embora a realidade em Portugal seja muito mais simbólica, face ao contexto mundial.
Esta pressão dos números também se faz sentir no acolhimento em Portugal? E não me refiro à situação de refugiados oriundos da Ucrânia que têm canais próprios para chegar ao nosso país...
Em Portugal, o número de pedidos de asilo tem vindo a aumentar, havia uma tendência de grande aumento até 2019. Depois, com a pandemia, com o fecho das fronteiras, houve uma diminuição significativa. Não quer dizer que tenha diminuído o número de refugiados, quer dizer é que eles não conseguiam aceder aos territórios seguros.
No ano passado, já tivemos 2.136 pedidos, o que em Portugal é um número representativo de pedidos espontâneos, por pessoas que pedem asilo, só à chegada. Durante muitos anos, tivemos 200 a 300 pedidos por ano. O número, portanto, está a aumentar.
A eles juntam-se, depois, outros programas que temos, como o Programa Nacional de Reinstalação, que acolhe pessoas com estatuto de refugiado noutros países, ao abrigo de um acordo do Governo português e com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados. Também o resgate de pessoas de barcos humanitários, que tem acontecido com alguma regularidade, ao longo do ano, acresce a este número.
Temos também o programa de emergência do Afeganistão, que foi bastante representativo. Portugal recebeu um número bastante significativo de pessoas. Mesmo entre estes 2.136 pedidos espontâneos, verifica-se que há mais de 73 nacionalidades, o que quer dizer que Portugal, apesar de não ser um país de grande procura, o que também tem a ver com a sua localização geográfica, acaba por acolher pessoas de uma grande diversidade de culturas, muito diferentes. Isso acaba por ser uma riqueza, mas também apresenta desafios, claro.
É de sublinhar esse aumento significativo de pedidos espontâneos de ajuda?
Exato. Em 2019, já eram mil e tal, portanto, tem vindo a crescer ao longo dos anos. Em 2023, até 31 de maio, tivemos 880 pedidos. Normalmente, no segundo semestre há sempre mais pedidos do que no primeiro. Provavelmente, vamos ultrapassar estes 2.000 por ano. Vamos chegar aos 2.500 ou mais.
Estamos muito voltados para as consequências da invasão da Ucrânia. Esquecemos, ou desvalorizamos, a importância de outros conflitos à escala global, no aumento do número de refugiados?
Sim, acho que falta essa sensibilidade. É humano as pessoas terem uma atenção maior para os conflitos que acontecem perto do seu território. Nesse aspeto, a Ucrânia é palco, pela primeira vez em muitos anos, de um conflito dentro da Europa, muito próximo e com escala elevada.
No caso do Afeganistão, houve um programa de emergência. Também havia a questão de haver portugueses que trabalhavam lá e alguns desses afegãos terem familiares portugueses. Portanto, é uma situação também diferente, mas, em geral, as pessoas não têm muito essa percepção e, sobretudo, a percepção de que em África, na América Latina, em muitos outros países do mundo há conflitos que geram refugiados, sendo necessário dar proteção às pessoas. Se calhar, não têm essa noção tão presente no dia a dia.
Nesta altura, para além da Ucrânia, de onde chegam mais refugiados?
No ano passado, foi sobretudo do Afeganistão, da Índia, da Gâmbia e do Paquistão. Mas, como disse, são 73 nacionalidades…
Falou da Gâmbia. É provável que a maioria das pessoas não saiba o que se passa nesse país…
Exato, a maior parte das pessoas não tem essa noção, até porque a cobertura noticiosa nesses países é muito mais restrita. Por exemplo, há a questão da Venezuela, que afeta muitos milhares de pessoas em todo o mundo, e que não é coberta de forma tão sistemática como outras situações. Até porque, por vezes, há uma grande confusão entre migrantes económicos e refugiados.
Da última semana chegam-nos mais notícias trágicas de naufrágios no Mediterrâneo. O que falta para uma resposta à altura dos valores europeus, nesta matéria?
Eu acho que falta mais solidariedade e, sobretudo, mais partilha de responsabilidades. Portugal recebeu dois mil pedidos de asilo no ano passado, mas esse é um número muito baixo, se compararmos com a Espanha, com a Itália, com a Grécia, com outros países onde a pressão dos refugiados é muito maior.
Efetivamente, falta mais partilha e mais solidariedade entre os Estados-membros. O programa de resgates humanitários no Mediterrâneo é um exemplo de como se pode fazer esse tipo de apoio e como, coordenadamente, se pode receber pessoas que estão nessa situação. O programa de reinstalação com o ACNUR também é um exemplo disso, de como podemos acolher pessoas que já têm estatuto noutro país, mas que não podem ficar nesse país por qualquer razão. Mas falta mais partilha de responsabilidades e uma solidariedade maior, no sentido de percebermos que a proteção internacional dos refugiados é diferente.
Obviamente que toda a gente tem o direito de migrar, é natural que as pessoas migrem, mas a migração económica e a proteção Internacional são distintas. Na proteção internacional, as pessoas não têm escolha e, portanto, têm de sair do sítio onde estão porque correm risco de vida ou porque estão a ser perseguidas, individual ou coletivamente. Não há outra possibilidade senão sair e, nesse aspeto, há uma obrigação Internacional, de acordo com a Declaração Universal dos Direitos Humanos, com a Convenção de Genebra, de proteger estas pessoas e de dar proteção Internacional a estas pessoas.
Diferentes associações e instituições alertam para a necessidade de serem criadas rotas seguras para os refugiados. Há progressos a este nível?
Falta ainda um grande percurso e também falta garantir que as pessoas, efetivamente, podem pedir asilo. Basta ver o número de deslocados internos, que é muito superior ao número de refugiados: quer dizer que a maior parte das pessoas nunca chega a ter a possibilidade de sair do país onde está e pedir asilo. Portanto, logo aqui há um acesso aos direitos que é negado.
De facto, há um controlo das fronteiras que é necessário, que é preciso fazer, mas que não pode pôr em risco o direito ao asilo e o direito a aceder à proteção internacional. Há melhorias a fazer nesse aspeto, com mais partilha de responsabilidades e um investimento maior nesta nesta área.
Por cá, estamos a meio de um processo que vai promover alterações no organismo que trata da legalização. Falo da extinção do SEF. No terreno, notam dificuldades acrescidas por causa disso?
Há alguns desafios que temos encontrado, nomeadamente a nível financeiro, do financiamento das nossas atividades do CPR, organização não-governamental sem fins lucrativos que, ao abrigo de um acordo com o Estado português, presta apoio a todos os requerentes que pedem asilo espontaneamente em Portugal, para além de participar nos outros programas de que eu já falei. Sendo a única organização que presta apoio a estes requerentes de proteção internacional, temos um acordo com o SEF que permite oferecer acolhimento e, portanto, garantir que as pessoas têm alojamento, têm apoio social, que têm apoio jurídico, no processo de asilo.
Neste processo de transição, temos sentido algumas dificuldades, porque as coisas não funcionam nas dinâmicas que nós queremos, nas dinâmicas de que precisamos. Às vezes, é difícil garantir o financiamento das atividades. Também é verdade que o SEF tem feito um esforço grande para garantir o apoio aos requerentes, juntamente com os outros organismos do Estado e, portanto, temos trabalhado em conjunto para resolver estes problemas e para assegurar que o direito ao asilo durante este processo continua a ser garantido.
Mas não tem posto em causa esse direito ao asilo?
Eu acho que não. Aliás, os números mostram que o número de pedidos de asilo tem vindo a aumentar. Portanto, a questão da transição não tem posto em causa o asilo.
Mas demora mais tempo…
Demora mais, sobretudo ao nível da análise dos pedidos. Obviamente que há atrasos, porque neste momento há um processo de extinção em curso e isso implica menos recursos humanos. A análise dos processos é mais demorada e, por outro lado, também ao nível do financiamento temos tido dificuldades acrescidas. Apesar de já estar criada a nova agência, ainda não está em funcionamento e, portanto, temos aqui alguns desafios acrescidos.
Não diria que o direito ao asilo está em causa ou em risco. Diria, sim, que os processos estarão mais atrasados e que, efetivamente, isto coloca desafios às organizações que apoiam.
Apesar da autorização do Governo para que os documentos e vistos relativos à permanência em território português permaneçam válidos até ao final de 2023, há dificuldades práticas para quem tem de responder aos refugiados?
O processo de asilo é diferente do processo dos emigrantes, em geral, e nesse aspeto há mais garantias. Houve uma importante alteração legislativa, no ano passado, com o qual o CPR se congratula, que foi o facto de os requerentes poderem agora trabalhar durante o processo de admissibilidade, durante o processo de asilo, o que não acontecia antes. Eles só podiam trabalhar se fossem admitidos na primeira fase, mas quem tinha uma decisão negativa ia para recurso e, durante esse período, não podia trabalhar. Às vezes, o recurso demorava um ou dois anos, o que queria dizer que as pessoas ficavam numa situação vulnerável, numa situação social muito vulnerável,, Neste momento isso já não acontece, as pessoas podem logo aceder ao mercado de trabalho. Portanto, nesse aspecto há garantias.
Sabemos que, do ponto de vista prático, e porque a maior parte dos pedidos de asilo na segunda fase do processo, quando passam para a Segurança Social, são colocados em municípios pelo país todo, não escolhem onde querem ficar. Os reinstalados estão na mesma situação, por vezes há problemas operacionais de acesso à saúde, de criar o cartão de utente, de reconhecer algumas competências, há problemas operacionais, mas, em todo o caso, desde há uns anos para cá foi feita uma evolução muito positiva. Realmente, podemos dizer que hoje, comparando com há 10 ou há 15 anos, a situação é francamente melhor. Obviamente, ainda subsistem problemas…
Depois de se instalarem em Portugal, alguns ou muitos refugiados tem, pouco tempo depois, tendência a deixar o país. Há explicações para isso?
Isso, hoje em dia, já não é tão suportado pelas estatísticas. Efetivamente, durante o programa de recolocação de refugiados na Europa, verificou-se, em 2015 e 2016, que uma grande parte dos recolocados que vinham para Portugal acabava por ir para outros países. Na altura, estudou-se ao de leve esse fenómeno e verificou-se que isso acontecia porque em Portugal havia poucas estruturas de apoio aos refugiados, porque também muitos deles tinham comunidades da mesma nacionalidade noutros países, como a Alemanha. Portanto, preferiam ir para esses países onde tinham uma comunidade mais alargada. Neste momento, isso já não será tanto assim. Aliás, se nós formos analisar o programa nacional de reinstalação, o número de pessoas que sai do país já é muito mais reduzido,
Até porque se vão criando comunidades também por cá, não é?...
Exato. Também se criam comunidades porque nós tivemos uma grande aposta no acolhimento e na criação de vagas de acolhimento para estes grupos.
Talvez o que ainda esteja por fazer é trabalhar mais a integração, mas houve um grande investimento. Começaram-se a gerar essas comunidades e, efetivamente, as pessoas acabaram por ficar também em Portugal.
Também há outra questão. Durante o programa de recolocação o nosso país estava em crise económica, o que obviamente também não era gerador de ofertas de emprego, de oportunidades de formação, etc. Hoje em dia, a situação é um pouco diferente. Nós sabemos que até há muitos migrantes a virem para Portugal porque há muitas oportunidades de emprego e, à partida, os próprios refugiados acabam por ter mais acesso a essas oportunidades e, portanto, mais razões para ficar. Além de que nós temos outros aspetos que funcionam muito bem, como seja, por exemplo, o acesso à educação das crianças, a saúde em geral, comparativamente com outros países. Até com o Reino Unido.
Uma reflexão, agora, sobre o tema que as Nações Unidas escolheram para o Dia Mundial do Refugiado 2023 que vamos celebrar na próxima terça-feira: "Esperança, longe de casa, por um mundo inclusivo, com as pessoas refugiadas". Falamos das oportunidades que são criadas para que estas pessoas possam desenvolver-se, mas também do que a integração dessas pessoas representa para a valorização das comunidades que as acolhem. Isso é importante de ter em vista, também?
Sim. Acho que neste momento o grande desafio que Portugal enfrenta é trabalhar a integração dos refugiados e a verdadeira inclusão. Como eu disse, trabalhamos muito na criação de vagas de acolhimento, em trazer pessoas e garantir que elas tinham acesso a um território seguro, mas, efetivamente, ainda não estruturámos muito bem o desenvolvimento do processo de integração, que tem duas partes. A parte do refugiado, de tentar criar condições para que possam ver reconhecidos os seus cursos, suas profissões. Ainda não existe um sistema em Portugal para que, por exemplo, um canalizador possa fazer um teste para testar que é canalizador e ter uma certificação. Para que uma pessoa que tenha um curso superior possa fazer uma equivalência, se não conseguiu trazer os documentos que o comprovam. Esse sistema ainda está em criação e, portanto, é uma coisa que faz muita falta, tanto das competências profissionais, como das escolares, mas também ao nível da formação em posto de trabalho, da aprendizagem da língua... Nós temos cursos de aprendizagem da língua, mas que não são suficientes.
Sobretudo ao nível avançado, não é?
Exato. Nós temos cursos muito básicos. A rede, inclusivamente de que o CPR dispõe por falta de financiamento, também é muito básica. E já não falo da comunidade oriunda do mundo académico. Para profissões que requerem um nível de secundário ou intermédio, como, por exemplo, a agricultura. Na indústria, é preciso um conhecimento de um português mais técnico e, portanto, temos trabalhado e sensibilizado o Governo para a necessidade de criar níveis mais aprofundados de formação e que seja muito uma formação prática, no contexto de trabalho envolvendo as empresas, para que, no fundo, as pessoas consigam também aceder a empregos melhores.
Se as pessoas não desenvolverem o português e não reconhecerem as suas competências escolares e profissionais, nunca passam daqueles empregos com baixa qualificação, de baixos salários e precários. É isso que nós queremos um pouco combater, do ponto de vista do refugiado. Do ponto de vista da sociedade de acolhimento, efetivamente, com o número de refugiados a aumentar, criam-se mais oportunidades e criam-se mais formas de a sociedade interagir com os refugiados. Há bons exemplos disso nos municípios do interior, onde, por exemplo, as escolas estariam a fechar se os refugiados não fossem para lá. São muito bem acolhidos pela comunidade.
A escola acaba por ser um veículo fenomenal nisso. Aliás, o CPR tem uma creche e um jardim de infância na Bobadela por causa disso. Temos dois centros - na Bobadela e São João da Talha - e achamos que a forma mais fácil de as pessoas conhecerem os refugiados, de compreenderem os refugiados é exatamente na interação, algo que a escola facilita, porque as crianças tornam-se amigas umas das outras e os pais também se conhecem uns aos outros. É assim que a inclusão se faz. Nesse aspeto, acho que ainda falta trabalhar um pouco mais, até porque os portugueses têm um pouco de receio daquilo que é diferente.
Episódios como o que ocorreu no Centro Ismaelita de Lisboa acabam por ser atos isolados ou marcam, de alguma forma, a imagem que vamos tendo do refugiado?
Acho que são atos isolados que podem acontecer em qualquer circunstância, em qualquer país, sendo ou não refugiados. Acho que isso não marca nada a questão dos refugiados.É muito negativo, causa grande tristeza, obviamentetem impacto, mas são situações que acontecem muito esporadicamente. Agora, também é verdade que essa é uma das questões para que nós temos alertado. Há preocupações que nós temos ao nível dos refugiados e também dos migrantes em geral, que se prendem, por exemplo, com a saúde mental, com acompanhamento. Nesse campo, as respostas que existem não só em Portugal, mas na realidade dos países da União Europeia são diminutas, ainda.
Quando temos pessoas que têm percursos de fuga muito longos, que passam por situações muito complicadas poderá haver motivos que potenciem certas ações. Não faço ideia, nesse caso de que falou, qual foi a motivação. Poderá não ter nada a ver com isto, mas o que eu digo é que esses casos são casos muito esporádicos.
Temos duas perguntas finais e uma delas é: como vê a intenção do Papa de se encontrar com estudantes refugiados na sua próxima visita a Portugal?
Olhe, nós, inclusivamente, já dirigimos também um convite para que o Papa visite os nossos centros, se assim entender. Através do Governo, dirigimos esse convite.
Eu acho muito positivo. Aliás, acho que a Jornada Mundial da Juventude, sobretudo para os católicos, mas também para quem não é católico, é um momento de esperança e de convívio de jovens que, obviamente, no futuro vão intervir na sociedade e vão trabalhar na sociedade para determinar o mundo melhor. É muito bom que contactem com esta realidade e acho que a vinda do Papa é sempre um momento de esperança nesse sentido, de também sensibilizar. E o Papa tem-no feito muitas vezes, inúmeras vezes. É das pessoas que mais alerta para a questão dos refugiados no mundo e para os seus problemas, e para necessidade de proteção internacional.
A JMJ é um momento de grande esperança e vejo isso muito positivamente. Inclusivamente, se o Papa, por razões de agenda, não poder ir ao nosso centro e for a outro falar com refugiados, isso é que é o mais importante. Não é tanto o ir ao CPR. O importante é estar com os refugiados e contactar com uma esperança, mesmo que as pessoas sejam de outras religiões porque nós também recebemos muitos refugiados que não são católicos. O Papa é sempre um sinal de esperança e um veículo transmissor da melhoria que se pretende que o mundo tenha e de alertar para os problemas do mundo.
Falava das várias instituições e é a minha última pergunta vai para a forma como avalia a articulação entre os vários centros, os vários organismos que trabalham com refugiados em Portugal?
Acho que a articulação já foi bastante pior. Ainda está longe de ser perfeita. Temos um grupo operativo único criado pelo Governo que engloba várias instituições que trabalham com refugiados, no qual o CPR está incluído. Tem-se procurado fazer um trabalho e um caminho, mas, efetivamente, ainda se nota uma falta de articulação entre as organizações, sobretudo nesta dinâmica entre o que é que é o acolhimento e a integração.
Vemos, por exemplo, ao nível da ANQEP, a Agência para as Qualificações do IEFP, da Segurança Social... Às vezes, há uma certa desarticulação. Acho que falta, sobretudo, uma dimensão da inclusão em Portugal. Para dar um exemplo muito concreto: os refugiados são apoiados pelo CPR na parte inicial do processo, depois são transferidos para a Segurança Social ou para a Santa Casa e a Segurança Social tem competências no acolhimento, mas não têm competências na integração.
É esta articulação às vezes é que falha um pouco. Mas também falha para os portugueses. Aliás, costumo dizer que os problemas que os refugiados enfrentam em Portugal, muitos deles os portugueses, também enfrentam, quer no acesso aos serviços de saúde quer no acesso ao IEFP. Portanto, há operacionalização que é necessário e acho que se podia fazer envolvendo mais associações empresariais, o setor privado porque são eles que vão ser o motor desta integração e, no fundo, não se deixaria tudo para o Estado.
O Estado tem que ter um papel central e eu sou defensor de que o Estado tem que assumir essa responsabilidade e que a responsabilidade de apoiar requerentes de proteção internacional é do Estado, mas o Estado deve chamar a si outras entidades para poderem dar um apoio nesta integração.