A Igreja Católica em Moçambique está cautelosamente otimista com as notícias de que as forças leais a Maputo conseguiram conquistar terreno aos terroristas que levam a cabo uma insurgência naquele território, há já três anos.
D. António Juliasse, administrador apostólico da diocese de Pemba, disse em entrevista à fundação Ajuda à Igreja que Sofre que só se recomendará o regresso dos missionários e membros de ordens religiosas depois de se confirmar no terreno os avanços em Mocimboa da Praia e em Palma, como tem sido anunciado pelas autoridades.
“Primeiro, não sei se constitui verdade que todas as zonas estão libertadas. Nós precisamos ainda de evidências. Uma coisa é o Presidente que fala, pode falar para animar o país, e isso é muito bom, pode falar para criar um certo sentido de esperança para o país, o que também tem o seu sentido, mas na prática, no terreno, ainda há muito que se deve fazer”, afirma.
D. António refere ainda o perigo de promover o regresso da população antes de tempo. “Na medida em que o povo regressar então nós também equacionaremos a possibilidade de os missionários retornarem para lá. Mas, para nós, o termómetro será compreendermos efetivamente no terreno de que existe segurança. Não se podem expor as pessoas que já saíram do sofrimento e estão com traumas para voltarem para situações de drama, de novo de conflito, serem maltratadas como aconteceu. Portanto, vai exigir um pouquinho mais de tempo.”
Terroristas ou mercenários?
Sem medo de entrar em polémica, D. António fala ainda da destruição da Igreja de Palma, dizendo que falta esclarecer quem causou os danos, os terroristas que estavam a ocupar o terreno ou as forças mercenárias que a libertaram, utilizando meios aéreos. “A destruição veio de cima, dos bombardeamentos dos helicópteros, ou veio dos que estiveram lá a ocupar? Tanto em Muidumbe como em Mocímboa da Praia, a questão é a mesma: quem foi que destruiu?”
“Na vila de Palma, quando eles [os insurgentes] entraram, a igreja ficou intacta. Não tocaram na igreja, nem entraram lá dentro, inclusivamente na casa dos padres. Os insurgentes não tocaram em nada. Nós tínhamos ainda pessoas lá e que testemunharam isso. Nós estamos nessa dúvida sobre quem é que está a vandalizar as coisas, inclusivamente as coisas da Igreja católica. Quando tivermos a clareza, então manifestaremos o nosso sentimento a quem de direito. As destruições não são tão recentes, mas as imagens são recentes. Aí temos de ter cuidado.”
D. António Juliasse, que é ainda bispo auxiliar de Maputo, foi chamado pelo Papa Francisco a substituir D. Luiz Fernando Lisboa, o prelado brasileiro que era bispo de Pemba até ao início de 2021 e que foi o primeiro a chamar atenção para o que se estava a passar na região, com uma insurgência que tem sido atribuída a grupo terroristas fundamentalistas islâmicos.
Na altura em que foi anunciada a sua transferência para fora de Moçambique D. Luiz admitiu,em entrevista à Renascença, que ela se devia ao facto de ele ter recebido ameaças, insinuando que estas não vinham dos terroristas. Mais tarde, noutra entrevista, disse especificamente que vinham do Governo.
D. António Juliasse elogia o papel desempenhado por D. Luiz naquele tempo, bem como a importância do Papa Francisco. “Ele fez bem em encontrar vias para fazer conhecer ao mundo o que estava a acontecer por aqui. Isso foi bem feito e a colaboração do Papa Francisco foi de um valor que é difícil de calcular. Quando ele se fez presente e se fez muito próximo desta situação de Cabo Delgado, todo o mundo também se fez próximo de Cabo Delgado. A chamada do Santo Padre, o telefonema que ele fez a D. Luiz não significou apenas palavras. Significou a presença dele e ao mesmo tempo o convite para que os outros também se fizessem presente. Isso foi feito e agradecemos imensamente este coração do Santo Padre de encontrar sempre dentro da sua agenda a oportunidade de estar próximo daqueles que mais sofrem. Sabemos que o Santo Padre está interessado, interessa-se, escuta, acompanha, mas no momento que ele achar que é apropriado, porque as circunstâncias exigem que ele diga alguma coisa, ele irá fazê-lo e pronto.”
Quanto ao seu próprio futuro, diz que está inteiramente à disposição da vontade do Papa, e de Cristo. “Quando nós nos entregamos a Jesus respondemos que a nossa vida é para Ele. Foi o que eu fiz, não tem reservas. Neste caso, não depende do meu querer. Digo sempre assim: onde Deus achar que eu posso ser útil, só Ele pode saber, a minha resposta é que eu estou aqui. E vou. Foi dessa forma que respondi para vir para Cabo Delgado e se for essa a indicação de Deus pelas vias que a Igreja acredita e usa, se o Santo Padre indicar, eu estou na disponibilidade total, seja para continuar a ser Bispo auxiliar de Maputo ou então assumir uma outra missão que achar que eu estou à altura de colaborar e oferecer a minha vida para isso. É uma abertura total quanto a isso. Esse tem sido o meu princípio. Não há condicionalismos.”