O Estado já recuperou 411 milhões de euros da garantia prestada ao Banco Privado Português (BPP) e deverá recuperar a totalidade do valor, segundo o último relatório da Comissão Liquidatária, a que a Lusa teve acesso.
De acordo com o relatório entregue a tribunal, referente a junho de 2023, do crédito garantido do Estado de quase 447 milhões de euros já foram pagos 410,9 milhões de euros. Quanto ao restante, a Comissão Liquidatária diz que os ativos líquidos e liquidados deverão valer 230 milhões de euros e que parte importante é para pagamento do crédito do Estado.
Assim, afigura que é "muito provável que o crédito garantido venha a ser pago na totalidade (no que se refere a capital)".
Em março, ao Expresso, a Comissão Liquidatária disse que o valor que receber da passagem das obras de arte do universo BPP para o Estado servirá para saldar a dívida garantida do Estado de 450 milhões de euros (referente a um empréstimo de vários bancos ao BPP que o Estado garantiu).
Quanto aos juros de mora a pagar ao Estado, no relatório é estimado que "venham a ser pagos parcialmente". Os juros de mora (garantidos pela liquidez gerada pelos ativos dados em contragarantia ao Estado) ascendem a 160 milhões de euros.
Quanto aos créditos comuns - de 944 milhões de euros - já foram pagos a credores 185 milhões de euros pelos Fundo de Garantia de Depósitos e Sistema de Indemnização aos Investidores. O restante, segundo a Comissão Liquidatária, não é possível saber que proporção será paga.
Dos créditos subordinados, de 222 milhões de euros, refere no relatório que é por "demais evidente que não será possível efetuar quaisquer pagamentos".
O relatório revela ainda a situação financeira do BPP - em liquidação. No final de junho de 2023, o ativo líquido era de 224 milhões de euros enquanto o passivo ascendia a 1.265 milhões de euros, pelo que tinha um saldo líquido negativo de 1.041 milhões de euros.
Ainda no primeiro semestre, teve custos de 3,1 milhões de euros (dos quais 1,3 milhões de euros de custo com pessoal) e rendimentos de 2,7 milhões de euros (sobretudo de juros de aplicações de dinheiro e de reversões e recuperação de perdas por imparidade) resultando num prejuízo de 400 mil euros. Tinha 27 trabalhadores.
Sobre a gestão que tem sido feita para recuperar ativos para a massa insolvente e poder pagar a credores, a Comissão Liquidatária fala da da "complexidade" da liquidação, muito litigiosa. O BPP é parte em 43 processos judiciais ativos, o que - avisa - "não permite, para já, prever o momento do encerramento da liquidação".
O organismo diz estar disponível para resolver, por acordo, alguns destes processos -- que se apresentam "em número significativo" e com a "normal morosidade e complexidade que lhes é inerente", desde que tal "não ponha em causa os interesses do BPP e dos seus credores".
"Trata-se de um caminho que, em alguns casos, para além de evitar uma evidente poupança de recursos da massa insolvente, poderá abreviar os processos em curso ou até, como se disse, evitar que os mesmos sejam sequer instaurados", aponta.
Sobre a venda de imóveis onde estão instalados os serviços do BPP, a Comissão Liquidatária disse à Lusa que recentemente foi concretizada a venda do edifício da Rua Alexandre Herculano, em Lisboa, por cinco milhões de euros. Já a venda da sede, na Rua Mouzinho da Silveira, em Lisboa, será concretizada no prazo de dois anos conforme o contrato-promessa. O valor desta última venda não é divulgado (segundo o jornal Expresso, é de quatro milhões de euros).
O colapso do BPP, banco vocacionado para a gestão de fortunas, começou com a crise financeira de 2008 e culminou em 2010 com a liquidação. Apesar da pequena dimensão do banco, a falência do BPP lesou milhares de clientes e o Estado e fez temer efeitos de contágio ao restante sistema quando se vivia uma crise financeira.
Em dezembro 2008, face à falta de liquidez, o Banco de Portugal nomeou uma administração provisória para o BPP e seis bancos emprestaram 450 milhões de euros (CGD, BCP, BES, Santander Totta, BPI e Crédito Agrícola) em troca de uma garantia do Estado.
O fundador e antigo presidente do BPP, João Rendeiro, condenado a cumprir pena de prisão por crimes relacionados com o BPP, morreu em 12 de maio de 2022 numa prisão na África do Sul, onde estava desde 11 de dezembro de 2021, após três meses de fuga à justiça portuguesa para não cumprir pena em Portugal.