“Vista Chinesa” é o nome de um famoso miradouro no Parque Nacional da Tijuca, no Rio de Janeiro, onde foi construído no início do século passado um pagode de estilo oriental. “Vista Chinesa” é também o título do mais recente livro da escritora Tatiana Salem Levy, nascida em Lisboa e criada no Brasil.
Em entrevista ao Ensaio Geral da Renascença, a partir do Brasil onde está, a autora conta que este é um livro que tem por base factos reais. “Ele começa como testemunho, porque a história surge a partir de um evento real que foi a violação de uma das minhas melhores amigas”, conta Tatiana Salem Levy.
A escritora quis escrever sobre esse acontecimento traumático. “A violação aconteceu na Vista Chinesa, no Rio de Janeiro, que é um dos lugares turísticos do Rio, na floresta da Tijuca, na subida para o Corcovado”, explica Tatiana Salem Levy.
“O processo de escrita parte das entrevistas” que a escritora fez com a sua amiga, mas Tatiana quis transformar este testemunho em literatura. O nome da sua amiga foi transformado no de Júlia, a personagem principal deste livro intenso.
“Sempre soube que queria escrever um romance, não queria escrever meramente um relato disso. Queria saber como a literatura poderia dar conta desse evento tão horroroso e dolorido. Queria, como escritora, experimentar como é que a literatura poderia me aproximar e aproximar os leitores daquela dor que era dela, mas que não é só dela, porque milhões de mulheres passam por isso.”
É por isso que no livro a narradora diz que este relato “é mais um testemunho”, mas é também, como diz Júlia, “um testamento”. Tatiana Salem Levy explica: “acho que nomear é o primeiro passo para as coisas não se repetirem”.
Neste livro, que é também um grito de alerta para histórias de violação como as de Júlia que se repetem, Tatiana Salem Levy explica que a sua personagem diz aos filhos: “este é o testamento que não quero deixar para vocês. Então, é a ideia de, ao contar esta história, poder não deixá-la”.
“Vista Chinesa” saiu primeiro no Brasil, chega agora ao mercado português pela mão da editora Elsinore.
Em conversa a partir do Brasil e questionada sobre o atual estado do país que a viu crescer, Tatiana Salem Levy diz esperar uma mudança política para breve.
“O Brasil está vivendo um momento muito difícil e muito triste, para quem é da cultura, mas não só. A gente tem um Presidente genocida, literalmente. Abandonou a população. Realmente deixou a população morrer. Cada vez há mais gente a ir para a rua a gritar ‘Fora Bolsonaro’. Espero que a gente só tenha mais um ano dele! Cada ano dele, é muita destruição de floresta, vidas e cultura. Sem dúvida alguma é o momento mais triste da minha existência no Brasil”, reconhece a autora que se estreou na literatura com o romance “A Chave da Casa”.