As consequências dramáticas dos incêndios de dia 15 de Outubro poderiam ter sido evitadas se tivesse havido um alerta à população, defende José Manuel Moura, o comandante da Proteção Civil que foi afastado pelo actual Governo.
No programa Em Nome da Lei da Renascença deste sábado, José Manuel Moura disse que se as medidas de prevenção adoptadas para este fim-de-semana tivessem sido aplicadas há 15 dias, a tragédia que provocou 45 mortos poderia ter sido evitada.
“Poderia ter feito algum sentido ir à antena ou a tutela ou a estrutura operacional dar o grito do Ipiranga e colocar carga nesse alerta e aí as pessoas estarem mais preparadas para o que aí vinha. Porque é público que três dias antes, o IPMA [Instituto Português do Mar e da Atmosfera] conseguiu dados com uma previsão muita acertada que iria ser o pior dia em termos de condições meteorológicas. O alerta vermelho estava adequado, mas poderia ter havido uma difusão maior usando a comunicação social, as rádios e as televisões, no sentido de alertar que vinha aí um dia complicado.”
José Manuel Moura sublinha que o alerta à população era tanto mais importante quanto se sabe que nestas alturas do ano é normal que nas zonas rurais se façam queimadas.
O ex-comandante nacional da Proteção Civil foi um dos peritos que participou no relatório da Comissão Independente sobre Pedrogão. Na sua primeira entrevista, depois de ter sido afastado, José Manuel Moura, rejeita que tenha sido tendencioso nas críticas feitas à Proteção Civil.
Diz que o relatório elogia o que correu bem e critica o que tem de criticar, e recusa dizer se foi ele que fez este ou aquele capítulo. O relatório é de todos os que nele participaram, sublinha.
Uma das recomendações feitas no relatório é que o Governo compre meios aéreos para o combate aos fogos, em vez de depender do seu aluguer.
José Manuel Moura explica que é muito difícil antecipar ou prolongar a fase Charlie (aquela em que há mais meios e que vigora entre 1 de Julho e 30 de Setembro), porque ela está muito dependente dos contratos de aluguer dos meios aéreos. O futuro tem de passar por adquirir meios próprios, defende.
“Se algumas das recomendações forem seguidas nós caminharemos, com toda a certeza, para nos libertarmos um pouco desta questão das fases. Desde logo se o Estado tiver meios aéreos próprios isso também obriga a ter uma flexibilidade completamente diferente e não estar só agarrado à questão dos meios aéreos alugados”, afirma.
Questionado sobre a intenção do Governo de afastar os bombeiros voluntários dos fogos florestais, o ex-comandante nacional da Proteção Civil diz que a reforma não pode ser feita contra os bombeiros, mas com os bombeiros.
A ideia de colocar os voluntários apenas na proteção das populações e o combate aos fogos florestais ser feito por bombeiros profissionais pelos militares não vai funcionar, defende José Manuel Moura. Portugal deve apostar em ter ao nível local um corpo de bombeiros capaz de fazer o ataque inicial ao incêndio.
Atirar dinheiro para cima dos problemas
A mesma opinião tem Xavier Viegas, especialista em fogos florestais. O autor de um dos dois relatórios feitos sobre Pedrogão Grande diz que criar uma equipa de incêndios florestais não faz sentido, precisamos é de saber aproveitar melhor o conhecimento que temos.
Xavier Viegas diz que o Governo está a atirar dinheiro para cima dos problemas e continua a ignorar que há um quarto pilar no sistema de defesa da floresta que é a população, e para essa não há medidas.
O arquiteto paisagista Henrique Pereira dos Santos é absolutamente crítico das soluções aprovadas pelo Governo na sequência dos incêndios. Diz que continuamos a apostar na ideia errada de que é possível haver um Portugal sem fogos.
O autor do livro “Portugal, paisagem rural” defende que o que seria eficaz para reduzir o número e a dimensão dos incêndios florestais era o governo apoiar atividades económicas de ecossistema que fazem gestão de combustíveis, como a pastorícia ou os resineiros.
O Em Nome da Lei é um programa com edição da jornalista Marina Pimentel, que pode ouvir aos sábados, depois do meio dia, na Renascença.