O Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, vai prestar depoimento presencial, e não por escrito como inicialmente pediam os seus advogados, numa investigação em que é acusado de pressionar e interferir ilegalmente na Polícia Federal.
A decisão foi comunicada pela Advocacia-Geral da União (AGU), órgão que defende o Executivo brasileiro em processos judiciais, pouco antes do início de uma audiência em que o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiria se Bolsonaro, como chefe de Estado, estaria obrigado a comparecer pessoalmente ao interrogatório ou se teria o direito de responder por escrito.
"O requerente manifesta perante este Tribunal Supremo o seu interesse em prestar depoimento em relação aos factos objeto deste inquérito mediante comparecimento pessoal", disse o procurador-geral da União, Bruno Bianco, perante os magistrados do mais importante órgão do Poder Judiciário brasileiro.
O defensor do Presidente acrescentou que, quando o interrogatório for aprovado pelo STF, Bolsonaro "requer lhe seja facultada a possibilidade de ser inquirido em local, dia e hora previamente ajustados".
Diante da decisão, o Supremo Tribunal Federal suspendeu o julgamento aberto para decidir sobre o assunto enquanto o instrutor do caso, magistrado Alexandre de Moraes, analisa a relevância da decisão do governante.
Embora o Código Penal brasileiro estabeleça que o Presidente tem o direito de responder por escrito nas investigações e processos em que seja citado como testemunha, não esclarece se o mesmo se aplica nos casos em que é investigado, o que levou o Supremo Tribunal Federal a abrir um julgamento para decidir sobre o assunto.
Esse julgamento havia começado no ano passado, quando o primeiro, e até agora o único, magistrado a pronunciar-se, o agora aposentado juiz Celso de Mello, argumentou que a Constituição não dá ao chefe de Estado a prerrogativa de responder por escrito a interrogatórios de autoridades judiciais em que é investigado.
A investigação foi aberta em abril de 2020 depois que o ex-ministro da Justiça Sergio Moro acusou o chefe de Estado de exercer pressão sobre a Polícia Federal, o que levou o Ministério Público a pedir autorização ao STF para interrogar o mandatário.
Moro, que ficou famoso como juiz responsável pela Lava Jato, a maior operação anticorrupção da história do Brasil, renunciou ao cargo de ministro da Justiça de Bolsonaro em abril do ano passado após denunciar as supostas pressões e interferências ilegais do Presidente na Polícia Federal.
A investigação procura esclarecer se Bolsonaro pressionou ou tentou interferir política e ilegalmente na Polícia Federal, órgão responsável por investigações de corrupção contra dois dos filhos do Presidente: o senador Flávio Bolsonaro e o vereador pelo Rio de Janeiro Carlos Bolsonaro.
As suspeitas contra Jair Bolsonaro surgiram a partir das denúncias de Moro, que no momento de renunciar ao cargo ministerial declarou que o chefe de Estado pressionava para mudar as chefias da Polícia Federal, um órgão autónomo, embora subordinado ao Ministério da Justiça.
No seu depoimento aos investigadores responsáveis pelo caso, Moro afirmou que essas pressões foram "explícitas" numa reunião ministerial realizada em 22 de abril, dias antes de sua renúncia, e que foi gravada em vídeo.
No vídeo, que o Supremo decidiu tornar público, Bolsonaro reclama de forma exaltada das poucas informações facilitadas pela Polícia Federal, afirma que está a tentar, sem sucesso, mudar a direção da instituição e avisa que tentará novamente, o que aconteceu pouco depois.
Se existissem provas suficientes contra Bolsonaro, que nega todas as acusações, o Ministério Público poderia avançar com uma ação contra o Presidente no STF, que só abriria um julgamento se este fosse aprovado por uma maioria de dois terços dos votos na Câmara dos Deputados (342 de um total de 513).
Na eventualidade de essa maioria ser alcançada, Bolsonaro seria suspenso do cargo por 180 dias, período em que o Supremo teria de realizar o julgamento. Se o chefe de Estado fosse considerado culpado, o resultado seria a sua destituição do cargo e a substituição pelo vice-presidente, o general na reserva do Exército Hamilton Mourão.