Um consórcio formado pela Universidade de Coimbra, Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra e duas empresas, uma portuguesa e outra canadiana, quer desenvolver uma terapia inovadora para eliminar “em poucos segundos” o vírus que provoca a Covid-19.
Ouvido pela Renascença, Carlos Serpa, diretor da LaserLeap - a empresa de Coimbra envolvida neste projeto - explica como funciona esta terapia inovadora.
O Fotovid consiste numa terapia inovadora que elimina o vírus responsável pela Covid-19 em poucos segundos. Como é que funciona?
O que pretendemos é fazer algo que se chama terapia fotodinâmica, que consiste na conjugação de um medicamento com a aplicação de luz laser na zona que queremos tratar.
E é eficaz?
Pensamos que sim. Aliás, pensamos, mesmo, que há probabilidades altas de conseguir eliminar o vírus, aplicando esta terapia nas fossas nasais, que são a porta de entrada do SARS-CoV-2.
É, também, uma zona onde costumamos mexer em demasia, o que pode exponenciar o risco de transmissão do vírus. Ora, se conseguirmos inativá-lo nessa zona, sobretudo quando ainda há pouca presença do vírus, isso será extremamente positivo.
Mas em que medida é que a ação específica do medicamento conjugado com o laser tem na eliminação do vírus?
Aí, entramos mais em detalhe: através da conjugação das duas coisas, vamos criar espécies radicalares de oxigénio que são tóxicas para o vírus e, sendo tóxicas para o vírus, vão inativá-lo.
Essa é a primeira fase do projeto. Numa segunda fase, vamos desenvolver o instrumento a usar no nariz e o que pensamos é que ele pode ser usado em múltiplos contextos mas, desejavelmente, em contexto hospitalar de forma a precaver o possível contágio logo no princípio, desde logo no pessoal médico.
Diga-se, de passagem, que a terapia fotodinâmica já é utilizada em bactérias multirresistentes e noutras terapias, designadamente no tratamento de cancros.
Ou seja, a ação conjugada de medicação com a luz laser, vai levar à morte de células cancerígenas por via da formação de espécies de oxigénio reativas que são tóxicas para essas mesmas células.
Ou seja, estão a aplicar ao SARS-CoV-2 uma tecnologia que já é usada noutras situações...
Exatamente. É um processo similar.
Em que fase está o projeto?
Vamos arrancar de imediato. O projeto integra a Universidade de Coimbra, através da Laserleap, mas conta, também, com a colaboração dos Hospitais da Universidade de Coimbra, onde faremos a recolha do vírus.
O objetivo é provar a eficácia da terapia nos testes in vitro, após o que passaremos aos ensaios clínicos.
Quando?
Este projeto já tem nove meses. Pela razão de ser um projeto para algo muito premente, a nossa expectativa é de que poderemos ter o instrumento pronto a testar em doentes voluntários daqui por nove meses, provando, obviamente, que é eficiente e seguro.
Eu estou particularmente otimista porque um aparelho similar é usado no controlo de bactérias hospitalares, exatamente com a mesma lógica e com o mesmo método de recolha de amostras.
Mas estamos a falar de uma terapia invasiva...
Apesar de tudo, menos invasiva do que os testes de despistagem para a Covid-19 que se realizam atualmente.
Quanto vai custar?
O aparelho talvez vá custar entre 10 mil e 15 mil euros. Mas estamos a falar de um instrumento que será usado de forma recorrente nos hospitais.
Nesse sentido, não é, de todo, um equipamento dispendioso.
Numa nota enviada à agência Lusa, a Universidade de Coimbra (UC) indica que o projeto pretende eliminar o vírus SARS-CoV-2 “logo na principal ‘porta de entrada’ no organismo, isto é, nas fossas nasais, usando a terapia fotodinâmica”, afirma a Universidade de Coimbra (UC),
A investigação, que “acaba de obter 450 mil euros de financiamento” do Programa Operacional Centro 2020, reúne em consórcio a UC, através de equipas multidisciplinares das faculdades de Ciências e Tecnologia (FCTUC) e de Medicina (FMUC), o Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC) e as empresas LaserLeap, de Coimbra, que coordena o projeto, e Ondine Biomedical (Canadá), líder mundial na fotodesinfeção antibacteriana.
O FOTOVID assenta no “conhecimento recente de que o SARS-CoV-2 se associa a uma proteína preferencialmente presente nas cavidades nasais, onde se cria um reservatório de vírus responsável pela transmissão da doença e generalização da infeção”, referem os responsáveis do consórcio.
Assim, “a inativação dos vírus presentes nas cavidades nasais nas fases iniciais da doença Covid-19 poderá acelerar o tratamento, permitir que apenas se manifestem as formas mais benignas da doença e contribuir para impedir a propagação da pandemia”.
Partindo de uma tecnologia de desinfeção nasal criada pela empresa canadiana parceira no projeto, que já é utilizada em todo mundo para eliminar bactérias multirresistentes, o consórcio vai desenvolver uma terapia inovadora capaz de matar vírus, em particular o coronavírus responsável pela Covid-19.
A investigação será, assim, “muito mais rápida e, em caso de sucesso, a colocação no mercado será mais fácil e a custo reduzido”, destaca a UC.
“Esta é a inovação do projeto, pois a tecnologia nunca foi aplicada na inativação de vírus”, sublinha, citado pela UC, Luís Arnaut, um dos cientistas envolvidos na investigação.
“Estamos a propor um procedimento já com elevado grau de sofisticação, que já demonstrou ser eficaz na desinfeção de fossas nasais, mesmo para bactérias multirresistentes onde as alternativas terapêuticas existentes falham sempre, ou seja, tem sido possível fazer a inativação de bactérias multirresistentes com a terapia fotodinâmica”, esclarece.
“Este elevado grau de sofisticação faz prever o maior sucesso da terapia para combater a Covid-19”, sustenta Luís Arnaut.
Na prática, sintetiza o catedrático da FCTUC, o consórcio propõe “um reposicionamento de moléculas”, ou seja, recorre a uma terapia que “está a ser usada para destruir bactérias multirresistentes”, reposicionando-a para matar vírus.
Os primeiros testes terão início em outubro, na Faculdade de Medicina da UC, com amostras de vírus de doentes infetados por Covid-19, fornecidas pelo CHUC.
Posteriormente, quando for comprovada a eficácia da inativação fotodinâmica do vírus, seguir-se-ão os ensaios clínicos (que serão coordenados pelos especialistas Manuel Santos Rosa e José Saraiva da Cunha) com doentes voluntários, previsivelmente no próximo ano.
A terapia fotodinâmica é um tratamento não invasivo, rápido (pode durar apenas alguns segundos) e de baixo custo.
Os responsáveis do projeto defendem que esta tecnologia tem como objetivo ser a primeira opção terapêutica, eliminando o vírus numa fase muito inicial e impedindo, deste modo, a evolução da doença para fases mais graves.
Esta é uma alternativa terapêutica, que consiste em atacar diretamente a porta de entrada do vírus no organismo, para reduzir a carga viral no sítio onde ela é mais crítica, sintetiza Luís Arnaut.
A tecnologia “é para ser aplicada numa fase inicial de tratamento, para evitar complicações posteriores, em ambulatório”, concluiu.