Os chefes da diplomacia dos 27 membros da União Europeia, de outros 15 países mediterrânicos e da Comissão Europeia debatem na segunda-feira em Barcelona a situação no Médio Oriente, com a presença da Autoridade Palestiniana, mas sem Israel.
Trata-se do oitavo Fórum Regional da União pelo Mediterrâneo, um encontro dos países que integram esta organização intergovernamental ao nível de ministros dos Negócios Estrangeiros, incluindo o chefe da diplomacia portuguesa João Gomes Cravinho.
Israel e a Autoridade Palestiniana fazem parte da União pelo Mediterrâneo (UpM), mas Telavive cancelou na sexta-feira a presença em Barcelona.
A UpM revelou na quinta-feira, num comunicado, que apesar de a agenda inicial do fórum ter como foco o 15.º aniversário da organização "e as reformas em curso", os ministros vão afinal "debater a situação crítica em Israel e em Gaza-Palestina, assim como as consequências na região".
"O fórum é a oportunidade para um intercâmbio entre todos os membros sobre a situação dramática no terreno e o caminho a seguir", defendeu a UpM.
Poucas horas depois, fontes do governo israelita disseram a meios de comunicação espanhóis que Israel não vai ao encontro anual de ministros da UpM em Barcelona. Em paralelo, a Autoridade Palestiniana confirmou que vai estar presente.
Israel lamentou "a mudança de agenda original" do fórum da UpM, que deveria ser "uma plataforma prática para fomentar a cooperação entre diferentes países em benefício de todos os povos do Mediterrâneo".
As mudanças "prejudicam o propósito da UpM e correm o risco de a transformar noutro fórum internacional em que os países árabes criticam Israel", disseram as fontes de Telavive, citadas pela agência Europa Press.
O boicote de Telavive frusta o objetivo do Governo espanhol de fazer da UpM e do encontro de segunda-feira uma plataforma de diálogo e de aproximação entre Israel e os países árabes, incluindo a autoridades palestiniana.
Em 17 de outubro, dias depois do início da guerra em Gaza na sequência do ataque do grupo islamita radical Hamas a Israel, o primeiro-ministro de Espanha, Pedro Sánchez, propôs ao Conselho Europeu fazer da UpM essa plataforma de diálogo entre várias partes, com o argumento de que israelitas, palestinianos e outros países europeus e árabes têm assento neste fórum em igualdade de condições.
"Tanto os europeus como os árabes se sentam em volta da mesa. É, em nosso entender, uma boa oportunidade para ser aproveitada", disse Sánchez.
A decisão de Israel não estar em Barcelona coincidiu também com a visita de Sánchez, em conjunto com o homólogo da Bélgica, Alexander de Croo, na quinta e na sexta-feira, ao Médio Oriente, durante a qual ambos fizeram declarações que o Governo de Telavive considerou de "apoio ao terrorismo" do Hamas.
O primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, segundo um comunicado do Governo de Telavive, "condenou energicamente" as declarações de Sánchez e de Croo, por considerar que não atribuíram ao Hamas, que controla a Faixa de Gaza, "toda a responsabilidade pelos crimes contra a humanidade que perpetuou: massacrar cidadãos israelitas e usar os palestinianos como escudos humanos".
Numa conferência de imprensa na sexta-feira em Rafah, no Egito, na fronteira com Gaza, Sánchez e de Croo pediram a libertação dos reféns israelitas por parte do Hamas, mas voltaram a criticar, e repetidamente, Israel pelo desrespeito pelo direito internacional e a morte de "demasiados civis" palestinianos, incluindo milhares de crianças, na operação militar israelita das últimas semanas naquele território.
"Penso firmemente que temos de fazer um apelo a Israel para que cumpra com as suas obrigações em matéria de direito internacional", disse Pedro Sánchez, que usou expressões como "matança indiscriminada de civis inocentes" em Gaza.
O primeiro-ministro belga, por seu turno, disse que foi à região com Sánchez com uma "mensagem de solidariedade e de humanidade", afirmou que do outro lado da fronteira onde se encontravam, no território palestiniano, "perderam a vida demasiados civis" e considerou que "a destruição de Gaza é inaceitável".
Tanto Sánchez como De Croo realçaram que condenam o ataque do Hamas de 07 de outubro e que Israel tem o legítimo direito de se defender no quadro das leis internacionais.
Fazem parte da UpM 43 países - os 27 da UE e mais 17 estados mediterrânicos da Europa, do Norte de África e do Médio Oriente, incluindo a Palestina, não reconhecido oficialmente como estado por todos os restantes.
O Fórum Regional da UpM, um encontro de ministros dos Negócios Estrangeiros (MNE), realiza-se anualmente em Barcelona e é co-presidido pelo chefe da diplomacia da UE, o espanhol Josep Borrell, e pelo ministro da Jordânia Ayman Safadi.
A UpM foi criada em 2008 e é herdeira da Conferência Euro-mediterrânica, fundada em 2015 e conhecida como "processo de Barcelona", tendo como objetivo fomentar a cooperação na região euro-mediterrânica.
Barcelona corta relações com Israel até haver um cessar-fogo definitivo
A iniciativa partiu da coligação que dirige a autarquia, a BComú, com o apoio dos socialistas catalães do PSC e da Esquerda Republicana da Catalunha (ERC).
Durante a sessão plenária realizada na sexta-feira à noite, estes partidos instaram a câmara municipal de Barcelona a suspender as relações institucionais com o atual Governo de Israel, liderado por Benjamin Netanyahu, "até que haja um cessar-fogo definitivo e que sejam respeitados os direitos básicos do povo palestiniano".
A proposta contou com a oposição do partido JxCat (Juntos pela Catalunha, fundado em 2020 pelo independentista Carles Puigdemont), do Partido Popular e do radical de direita Vox.
A Comunidade Israelita de Barcelona (CIB), a instituição judaica mais icónica da cidade, admitiu, logo a seguir, que os seus membros "ficaram desconcertados com as decisões tomadas pela autarquia depois do ataque terrorista do Hamas", em 7 de outubro.
"Não entendemos como a câmara municipal pode apoiar" esta proposta, referiu a CIB numa mensagem publicada na rede social X (antigo Twitter), em que recorda também a violência dos ataques do Hamas, que fizeram 1.200 vítimas.
As relações entre Espanha e Israel já se tinham tornado hoje tensas, depois de o primeiro-ministro, Pedro Sanchéz, ter admitido a possibilidade de Espanha reconhecer o Estado palestiniano unilateralmente, à margem da União Europeia e de outros Estados-membros do bloco comunitário.
A posição do primeiro-ministro espanhol levou o Governo de Israel a chamar o embaixador de Espanha para lhe dizer que considerou as declarações de Sanchéz como um "apoio ao terrorismo".
A acusação foi rejeitada "categoricamente" pelo ministro dos Negócios Estrangeiros espanhol, José Manuel Albares, que adiantou que o Governo estava a analisar "uma resposta adequada".
Pouco depois, o Ministério dos Negócios Estrangeiros espanhol convocou a embaixadora israelita em Espanha, não sendo ainda conhecido todo o teor da reunião.
Albares tinha dito anteriormente que as acusações de Israel foram "especialmente graves" por terem sido dirigidas contra o líder do país que atualmente preside ao Conselho da União Europeia e lembrou que Sanchez "não hesitou em condenar o ataque terrorista do Hamas de 07 de outubro e deixar bem claro que não representa o povo palestiniano e é apenas uma organização terrorista".
[Notícia atualizada às 11h32 de 25 de novembro de 2023]