A inflação na Argentina atingiu 20,6% em janeiro, acumulando 51% desde que o Presidente, Javier Milei, tomou posse há dois meses e decretou o fim de preços controlados e congelados, provocando uma perda no poder de compra.
"A inflação acumulada nos últimos dois meses impactou em 50% no meu poder de compra. Essa foi a redução. Hoje, consigo comprar metade das coisas que comprava há dois meses", declarou à Lusa o argentino Patricio Araneda, de 28 anos, empregado administrativo.
"Se antes eu comprava quatro pães doces, agora compro dois. Se antes eu podia convidar alguém para comer fora, agora nem posso sair de casa", ilustrou, à saída de uma padaria.
Mas Patricio não é das pessoas que está em pior situação, admite o dono do estabelecimento, Omar Santullo.
"Pessoas que antes vinham comprar normalmente passaram a vir à noite e fazer fila à porta, quando nós doamos o que sobrou do dia", contou, calculando que dos 200 clientes diários, desde há dois meses entre 30 e 40 passaram a pedir doação de pães, embora a Argentina seja um dos maiores produtores de trigo do mundo.
"É que a matéria-prima - trigo, manteiga, ovos, leite - subiram entre 20 e 40%, levando a uma redução nas vendas entre 30% e 40%", explicou.
Os alimentos, setor mais sensível para o bolso das famílias, aumentaram 20,4% em janeiro e 296,2% nos últimos 12 meses.
Javier Milei tomou posse em 10 de dezembro, herdando uma economia à beira do colapso com preços congelados e controlados durante os quatro anos de governo do ex-Presidente Alberto Fernández (2019-2023), quando a inflação acumulada chegou a 930%.
O índice de preços de janeiro é o primeiro totalmente sob a administração Milei, marcada por uma libertação dos preços. Porém, limitado pelo Congresso e pela Justiça, Javier Milei ainda não conseguiu aprovar nenhuma das suas leis reformistas.
Os 20,6% de janeiro só são superados pelos 27% de fevereiro de 1991 e os 254,2% dos últimos 12 meses só encontram proximidade com os 267% de abril de 1991, quando o país saía da hiperinflação.
Os números de janeiro, no entanto, ficaram em sintonia com o esperado pelo Governo, que projeta uma queda contínua, alcançando um índice abaixo de 10% em abril.
Já os principais agentes económicos do país, na sondagem mensal conduzida pelo Banco Central da Argentina, calculam que fevereiro terá uma inflação de 18%, que um índice abaixo de 10% só virá em junho (08%) e que o ano terminará com 227%, superando os 211,4% de 2023, a taxa de inflação mais alta do mundo, da qual só se aproximam Líbano (192%) e Venezuela (190%).
Enquanto a inflação no ano passado chegou a 211,4%, os salários aumentaram 152,7% em média. Só em dezembro passado, a inflação foi de 25,5%, enquanto os salários aumentaram apenas 8,9%.
Os mais afetados foram os trabalhadores informais, responsáveis pela metade da força de trabalho. A perda real do poder de compra nesse segmento foi de 31%, enquanto os reformados perderam entre 15% e 40% nas pensões.
O governo Milei conta que a inflação diminua via recessão económica. Os salários públicos e as reformas, sem nenhum aumento desde dezembro, têm sido diluídos, permitindo alcançar o défice fiscal zero já em janeiro.
Em 2023, o défice fiscal financeiro chegou a 06% do Produto Interno Bruto, enquanto o défice fiscal primário (antes do pagamento de dívidas) tocou os 3,1%.
"A estabilização macroeconómica, baseada no equilíbrio financeiro e na transparência dos preços relativos, é condição necessária para que a economia argentina entre num caminho virtuoso de crescimento do salário real e da geração de emprego de qualidade", sustentou o Ministério da Economia, indicando que o custo social de estabilizar a economia é condição para o futuro.