António Guterres alertou esta terça-feira para o perigo de um conflito crescente entre a China e os Estados Unidos, dizendo que será muito mais imprevisível do que a Guerra Fria.
Sem referir os dois estados por nome, Guterres mencionou as divisões entre “as duas maiores economias do mundo”.
“Não podemos abordar os desafios e desenvolvimentos dramáticos enquanto as duas maiores economias do mundo estão de costas voltadas. Temo que o nosso mundo esteja cada vez mais perto de dois conjuntos diferentes de regras comerciais, financeiras e tecnológicas, bem como duas abordagens divergentes em relação à inteligência artificial e, no final de contas, duas estratégias militares e geopolíticas diferentes.”
“Esta é uma receita para problemas e seria muito menos previsível do que a Guerra Fria”, sublinhou, ecoando afirmações feitas recentemente em entrevista à CNN.
António Guterres referia-se nesta fase do seu discurso ao que chamou a “divisão da paz”, em que lamentou ainda o ressurgimento de tomadas de poder pela força, dizendo que “os golpes militares estão de volta”.
Especificamente, o secretário-geral mencionou o Afeganistão, o Myanmar, a Etiópia, o Sahel, o Iémen, a Líbia, a Síria, Israel e Palestina e o Haiti e “todos os lugares que ficaram para trás”.
Guterres falou então noutras cinco divisões que merecem a atenção da ONU, a começar pela divisão climática, pedindo aos estados para “não esperar que os outros ajam primeiro. Façam o que vos compete”.
As outras divisões, na opinião de António Guterres são aquelas que opõem os ricos aos pobres, agravadas pela pandemia; a diferença de género; a divisão digital, onde, considera Guterres, falta um enquadramento jurídico para fazer frente a ciberataques e, por fim, a divisão geracional, com o secretário-geral a prometer criar um gabinete da ONU para apoiar as novas gerações.
Tocando várias vezes na questão da pandemia, Guterres classificou como "obscenidade" e grande "falha ética" global o facto de as vacinas não estarem a ser distribuídas de forma uniforme no mundo, devido à "tragédia de falta de vontade política e egoísmo".
"Em vez do caminho da solidariedade, estamos num caminho sem fim para a destruição", lamentou Guterres, que também declarou que a "interdependência tem de ser a lógica do século XXI".
A pandemia também afeta diretamente a questão da desigualdade de género, considera o secretário-geral da ONU, uma vez que elas foram as mais duramente atingidas pelos efeitos sociais da Covid-19. "A igualdade das mulheres é essencialmente uma questão de poder. Devemos transformar urgentemente o nosso mundo dominado pelos homens e mudar o equilíbrio de poder, para resolver os problemas mais desafiadores de nossa época", considerou o antigo alto comissário das Nações Unidas para Refugiados.
A assembleia geral da ONU começou esta terça-feira e continua ao longo dos próximos dias, em Nova Iorque, a sede da organização.
[Notícia atualizada às 16h27]