A resolução do BES já custou cerca de 5.000 milhões de euros ao Estado e a fatura deverá ainda subir para compensar o Novo Banco e fazer face a outros encargos por pagar.
Esta quinta-feira, o ministro das Finanças, Mário Centeno, será ouvido na Assembleia da República para explicar como se chegaram a estes valores, mas esta é uma história que já leva quase cinco anos e atravessa dois governos.
A 3 de agosto de 2014, quatro dias depois de ter apresentado prejuízos de quase 3,6 mil milhões de euros, o 'histórico' Banco Espírito Santo (BES) acabou tal como era conhecido. O Banco de Portugal, apoiado pelo Governo PSD/CDS-PP, liderado por Pedro Passos Coelho, aplicou uma medida de resolução ao BES e criou o Novo Banco, uma instituição que, para proteger os depositantes, foi capitalizada pelo Fundo de Resolução (entidade na esfera do Estado, gerida pelo Banco de Portugal) com 4,9 mil milhões de euros.
Desde então os encargos para o Estado não pararam de aumentar.
Sem dinheiro suficiente para capitalizar o Novo Banco, o Fundo de Resolução pediu ao Tesouro público 3,9 mil milhões de euros, mas apesar desse empréstimo, rapidamente se percebeu que a capitalização tinha sido 'curta', até porque muitos dos ativos com que o Novo Banco ficou estavam longe de ser 'bons', eram mesmo muito 'tóxicos' (crédito malparado, imóveis sobrevalorizados) e acarretavam grandes perdas para o banco.
Em dezembro de 2015, face a novas necessidades de capitalização do Novo Banco, o Banco de Portugal passa para o 'banco mau', o BES, obrigações seniores que inicialmente ficaram no Novo Banco, provocando grandes prejuízos nos investidores dessa dívida, sobretudo institucionais como os grandes fundos de investimento Pimco e BlackRock. Os processos correm agora em tribunal.
Assim, no total, o Novo Banco foi numa primeira fase capitalizado com 6,9 mil milhões de euros, dos quais 3,9 mil milhões de euros públicos, ainda que através de um empréstimo.
Entretanto, o Banco de Portugal tentava vender o Novo Banco e o discurso que vinha do Governo e da própria instituição liderada por Carlos Costa era de que o Novo Banco era atrativo e poderia ser vendido por um valor que compensaria o empréstimo do Tesouro, pelo que o Estado seria logo reembolsado. Não foi assim.
A primeira tentativa de venda
Arrancou no final de 2014 e foi cancelada em setembro de 2015. Eram então três os interessados: os grupos chineses Anbang e Fosun (que, entretanto, se tornou acionista do BCP) e os norte-americanos da Apollo (donos da seguradora Tranquilidade, que pertencia ao BES).
No início de 2016, já com o atual Governo liderado por António Costa em funções, arrancou o segundo processo de venda. O Banco de Portugal contratou o ex-secretário de Estado do governo PSD/CDS-PP Sérgio Monteiro para vender o Novo Banco e a escolha recaiu no Lone Star, um fundo de investimento norte-americano.
Em troca de ficar com 75% do Novo Banco (o Fundo de Resolução manteve 25%), o Lone Star não pagou qualquer preço, tendo injetado 1.000 milhões de euros no Novo Banco.
Acordou ainda um mecanismo pelo qual, durante oito anos (até 2026), e com um limite de até 3.890 milhões de euros, o Fundo de Resolução compensa o Novo Banco pelas perdas num conjunto de ativos 'tóxicos' que ponham em causa os rácios de capital.
Injeção de 792 milhões
Referente a 2017, o Novo Banco recebeu uma injeção de capital de 792 milhões de euros do Fundo de Resolução, dos quais 430 milhões de euros vieram de um empréstimo do Estado. Já a semana passada pediu mais 1.149 milhões de euros.
Assim, até ao momento, o Estado já gastou 4.692 milhões de euros na capitalização do Novo Banco (3.900 da capitalização inicial mais 792 milhões do mecanismo de compensação o ano passado), que podem subir para 5.841 milhões de euros, a concretizar-se o valor agora pedido (que terá ainda de ser validado).
Esta quarta-feira à noite, em entrevista à RTP 3 o ministro das Finanças, Mário Centeno, disse que "nem um euro" público será gasto no Novo Banco, já que o dinheiro que o Estado está a emprestar ao Fundo de Resolução para recapitalizar o banco será pago por este em 30 anos.
Novos custos
Mas os custos em que o Estado está a incorrer no Novo Banco podem não ficar por aqui.
Desde logo há ainda quase 2.000 milhões de euros do mecanismo de compensação acordado com o Lone Star que ainda poderão ser acionados nos próximos anos, e o Novo Banco já admitiu quer 'limpar' o mais rápido possível o seu balanço.
Além deste valor, segundo explicou o governador do Banco de Portugal no Parlamento, em julho de 2017, o Fundo de Resolução ainda pode ser chamado a entrar com mais capital no Novo Banco caso haja outras perdas que resultem da restante atividade do banco (não protegida pelo mecanismo de compensação).
É que nesse caso, segundo o contrato de venda, as perdas têm de ser assumidas "pelos acionistas na proporção do capital" e o Fundo de Resolução tem 25%.
Por fim, a Comissão Europeia - nas negociações para a venda do Novo Banco - obrigou a ficar prevista outra condição que no futuro pode aumentar os encargos públicos.
Caso se venha a perceber que o Novo Banco precisa de capital "em circunstâncias adversas graves que não possam ser resolvidas pelo Lone Star ou por outros operadores de mercado", refere o comunicado de Bruxelas de outubro de 2017, "Portugal disponibilizará capital adicional limitado".
O objetivo de Bruxelas - que não quantificou o até quanto pode ir esta injeção de capital - será o de garantir que o Novo Banco seja viável, mesmo que o Estado tenha de intervir.
Aos encargos públicos com o BES/Novo Banco há ainda que somar os custos com a solução dos lesados do papel comercial, de 140 milhões de euros de empréstimo do Estado ao fundo de recuperação dos créditos (para pagar a primeira prestação das indemnizações) e mais uma garantia estatal de quase 153 milhões de euros (para a segunda e a terceira prestações das indemnizações).
Processos e custos
Por fim, há ainda muitos processos em tribunal que podem implicar significativos custos caso os contestatários vençam as ações. Por exemplo, processos contra o Banco de Portugal.
Mesmo os processos que visam o Novo Banco, segundo explicou o Banco de Portugal em 2015, casos esses decorram de processos relativos à resolução, será o Fundo de Resolução que terá de pagar ao Novo Banco os valores pelos quais seja condenado.
O Fundo de Resolução terá ainda de pagar a quem for reconhecido ter créditos sobre o BES. A consultora Deloitte concluiu, em auditoria pedida pelo Banco de Portugal, que os credores comuns do BES recuperariam 31,7% dos seus créditos caso o banco tivesse ido para liquidação, em vez de resolução, pelo que o Fundo de Resolução terá de pagar esse valor.
Ou seja, a herança do BES/Novo Banco ainda poderá custar muito dinheiro ao Estado e já vai mesmo acima do que até agora custou a nacionalização do BPN.
Segundo o Tribunal de Contas, na Conta Geral do Estado divulgada em dezembro, os custos com a nacionalização e a reprivatização do BPN e o funcionamento das empresas que ficaram com os ativos 'tóxicos' do banco superavam os 4.000 milhões de euros. Também neste caso é provável que os encargos aumentem significativamente.