A ministra da Presidência rejeita que o Governo esteja a adotar critérios diferentes no caso do secretário de Estado adjunto, Miguel Alves, constituído arguido em dois processos, e outros casos de governantes que foram igualmente constituídos arguidos e saíram do executivo.
Na conferência de imprensa após o Conselho de Ministros desta quinta-feira, Mariana Vieira da Silva foi confrontada com casos como os dos três secretários de Estado que, em 2017, saíram do Governo - João Vasconcelos, Fernando Rocha Andrade e Jorge Oliveira - após terem sido constituídos arguidos no caso “Galpgate”.
Mariana Vieira da Silva não falou em casos concretos, mas fez questão de "rejeitar a premissa da pergunta, dizendo que essa diferente atitude em diferentes casos não corresponde à realidade".
A ministra da Presidência aconselhou mesmo os jornalistas a "revisitar os comunicados" de António Costa nessa altura e "o que foi dito em cada um desses momentos", para daí concluir-se, diz a governante, que "não existe nenhuma diferente atitude relativamente ao facto específico" relacionado com o caso que envolve o secretário de Estado adjunto do primeiro-ministro.
Miguel Alves está constituído arguido em dois processos, ainda não manifestou intenção de sair, e a tese do Governo do PS é que não é por estar nessa condição que será forçado a abandonar as funções em São Bento.
Mariana Vieira da Silva reforçou que "basta revisitar comunicação feita nesse momento", em 2017, e as "declarações do primeiro-ministro, nesse momento, para poder concluir e perceber" porque é que o Governo rejeita "a premissa da pergunta" de que os critérios adotados há cinco anos não são os mesmos adotados agora.
O que aconteceu no Galgate?
O comunicado do primeiro-ministro a que Mariana Vieira da Silva se refere é relativo a 9 de julho de 2017 (leia aqui em formato PDF) e surgiu quando os secretários de Estado envolvidos no “Galpgate” pediram a demissão.
É escrito pela mão de António Costa que nessa altura decidiu "aceitar o pedido de exoneração, apesar de não ter sido deduzida pelo Ministério Público qualquer acusação, nem consequentemente uma eventual acusação ter sido validada por pronúncia judicial".
Ou seja, os secretários de Estado em causa foram constituídos arguidos, mas não foram acusados pelo Ministério Público. Costa faz a diferença entre os dois pressupostos. Mesmo apenas constituídos arguidos, os três governantes - Rocha Andrade, Jorge Oliveira e João Vasconcelos - poderiam ter-se mantido em funções, se quisessem.
Para o Governo, seguindo as regras deste comunicado de 2017, é o que vale exatamente para o caso atual de Miguel Alves, que foi constituído arguido em dois processos, mas que até agora não foi acusado pelo Ministério Público.
De resto, já na terça-feira, dirigentes socialistas recordavam à Renascença a posição do primeiro-ministro sobre o caso que envolveu em 2018 o então ministro das Finanças, Mário Centeno, que estava a ser investigado pela Procuradoria Geral da República no âmbito de um eventual recebimento indevido de vantagem.
Nessa altura, António Costa veio a terreiro dizer que “mesmo que venha a ser constituído arguido não vejo nenhum motivo para sair do Governo”. São estas palavras que dirigentes socialistas recuperam agora para justificar a manutenção de Miguel Alves no cargo de secretário de Estado adjunto do primeiro-ministro.
Nessa altura, em 2018, António Costa segurou Mário Centeno com outra frase: “Quem decide a composição do Governo sou eu. Mantenho toda a confiança”. E agora ensaiou exatamente a mesma posição em relação a Miguel Alves, dizendo aos jornalistas na Web Summit que "com certeza" que mantém a confiança "senão não estaria membro do Governo".
Confrontado com o caso concreto do chamado “Galpgate”, que levou à saída de três secretários de Estado na sequência de um convite da Galp para assistir a jogos do Euro2016, um dirigente do PS salientava na terça-feira à Renascença que "foram eles que quiseram sair", lembrando mesmo que no caso de Fernando Rocha Andrade, à época secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, nem Costa o conseguiu demover, apesar da insistência.
À pergunta da Renascença se se pode concluir daqui que Miguel Alves mesmo constituído arguido - e se não pedir para sair - não será forçado a abandonar o cargo em São Bento, o mesmo dirigente socialista respondeu com um "sim", sempre à luz daquele "antecedente".
É assim justificada pela cúpula socialista, e agora pelo Governo, a manutenção do secretário de Estado adjunto do primeiro-ministro no cargo, tratando-se, de resto, de um homem muito próximo e da total confiança de Costa, que já o acompanhou em funções nos tempos da câmara de Lisboa e quando esteve como ministro da Administração Interna.
Esta quinta-feira, Mariana Vieira da Silva considerou que Miguel Alves já "deu os esclarecimentos" que tinha a dar e "agora é tempo" de o Governo se "dedicar" ao trabalho. Quanto ao resto, segundo a ministra da Presidência, são questões relacionadas com a justiça e não é ao Governo que dizem respeito".