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Já está com os cabelos em pé a tentar trabalhar, tratar de uma casa e ainda orientar os estudos dos seus filhos? A má notícia é que só passaram dois dias e ainda tem muitas semanas pela frente. A boa notícia é que não tem de ser tão desesperante.
Ana Rute Cavaco está numa situação parecida. Tem quatro filhos em idade escolar em casa, mas os pequenos Cavacos estão nessa situação o ano todo, em regime de “homeschooling”, por escolha de Rute e do seu marido Tiago, pastor batista e músico.
Também por opção, Ana Rute não trabalha, embora colabore ativamente com o ministério religioso do marido, e reconhece que isso constitui uma diferença importante para as famílias em que ambos os pais estão a tentar controlar os filhos e trabalhar ao mesmo tempo. Apesar disso, tem conselhos práticos a dar.
Os primeiros podem parecer evidentes: “é importante ter um rumo, disciplina, horário a seguir”, mas logo vem uma importante ressalva. “Mas ao mesmo tempo é preciso olhar para este tempo como um tempo de exceção, em que precisamos de ter uma maior compreensão uns com os outros e saber aceitar que provavelmente há partes do dia em que não vamos conseguir fazer aquilo a que nos propusemos, a bem da sanidade mental de todos – e creio que é mesmo uma questão de sanidade – em alguns casos em que as pessoas estão em pequenos apartamentos, com vários filhos, a ter de trabalhar, a ter de fazer escolhas e dizer que por hoje está terminado.”
A experiência desta mãe de quatro diz que uma das coisas mais importantes é criar o hábito de respeitar o silêncio, e sugere “negociar com os filhos pequenos períodos de silêncio, e de parar e saber estar. É importante ensiná-los neste desafio de estarem 24 horas uns com os outros a respeitarem também o espaço uns dos outros, a terem momentos em que podem brincar sem fazer barulho ou ler, mas haver no fundo um hábito de partilhar o mesmo espaço, dando espaço aos outros.”
Embora compreenda que para as famílias o período de confinamento está a ser um grande desafio, Ana Rute Cavaco acredita que bem gerido, a longo prazo as famílias podem sair fortalecidas.
“É uma altura em que as pessoas, pais, filhos e irmãos podem-se aproximar mais uns dos outros e uma das coisas que temos experimentado – e esta é a mais valia que temos encontrado em fazer ‘homeschooling’ – é aprendermos que na dificuldade de estarmos juntos há coisas boas e quanto mais tempo estamos juntos e somos testados, mais aprendemos a estar uns com os outros e a partilhar, a saber dar o tal espaço uns aos outros”.
Outra vantagem que destaca é a virtude da entreajuda. “Uma das coisas que vemos mais a acontecer connosco é que os irmãos, obviamente, estão mais tempo juntos e chateiam-se muito mais, mas ao mesmo tempo também se ajudam mais e aprendem a fazer mais coisas em conjunto. Se estivessem segmentados por faixas etárias seria mais difícil encontrar uma adolescente quase de 16 anos a ter algumas coisas em comum com o irmão que vai fazer 10”, diz, dando o exemplo da mais velha e do mais novo lá de casa.
Entreter os filhos, mas sem exageros
Muitos pais tremem só de pensar que vão ter de ajudar os filhos a resolver contas de matemática ou de ciências, ou revisitar as regras gramaticais. Ana Rute lembra que mesmo no "homeschooling" o pai nunca veste a pele de professor, mas está lá apenas para tentar ajudar o filho a ultrapassar obstáculos.
“Eu, enquanto mãe, com a matéria, vou verificar quando eles não estão a conseguir alguma coisa, não estão a entender e peço ajudas exteriores, e muitas das vezes acabo mesmo por dizer que vamos ter de saltar esta parte, vamos ter de ver mais tarde, ou às vezes não é fundamental para o resto do raciocínio e fazem-se as escolhas necessárias para atingir aquele objetivo.”
No caso da maioria dos pais em confinamento, ainda por cima, há a ajuda constante dos professores, que deve ser aproveitada.
Mas outra das preocupações de muitas famílias é encontrar formas de entreter a criançada. Esta, contudo, é uma preocupação exagerada, acredita Ana Rute.
“A coisa que mais se descobre quando as famílias passam muito tempo juntas é que o entretenimento deixa de ser um objetivo, porque quanto mais tempo aprendemos a estar juntos, menos os pais têm a preocupação do entreter e do arranjar atividades”, diz.
“Nessa ausência de entretenimento surge alguma criatividade, surgem áreas de interesse. No nosso caso eles gostam muito de desenhar e têm surgido imensas coisas gratuitas na internet durante este tempo, têm descoberto alguns sites com cursos de desenho e têm desenvolvido muito isso. Há quem goste mais de música, há quem goste mais de experimentar outro tipo de pinturas e eles próprios sugerem que gostavam de experimentar alguma coisa e vão à procura disso e o que acaba por acontecer é que um tem essa ideia e os outros querem experimentar também.”
“Portanto se calhar devemos libertar um pouco os pais do entretenimento e habituarem-se mais a estarem juntos”, conclui.