Kasparov. "No xadrez, temos regras fixas e resultados imprevisíveis. Na Rússia de Putin é o contrário"
08-11-2017 - 19:49
 • Paulo Ribeiro Pinto

Crítico do regime defendeu boicote às eleições presidenciais na Rússia como forma de protesto contra uma “farsa”. Mikhail Khodorkovsky, outro crítico de Putin, discorda.


São dois dos maiores críticos do regime de Vladimir Putin, talvez os mais conhecidos: Garry Kasparov, ex-campeão mundial de xadrez, e Mikhail Khodorkovsky, ex-magnata do petróleo, estiveram esta quarta-feira, na Web Summit, em Lisboa, para falarem de democracia, privacidade e inteligência artificial. Mas, com as eleições presidenciais na Rússia marcadas para o próximo ano, as perguntas dos jornalistas acabaram por seguir para a política interna russa.

As estratégias para tentar abalar o Kremlin são distintas. Mikhail Khodorkovsky rejeita um boicote geral dos eleitores, mas Garry Kasparov vê nele uma forma de protesto contra uma “farsa”.

“[Um boicote] Não terá um grande impacto nos resultados das eleições”, diz Khodorkovsky. “Consideramos que terá mais impacto a ida às urnas para que façam alguma coisa, que sejam activas. O que propomos é que apareçam nas urnas de voto e que votem no candidato em que acreditam, de preferência outro que não Putin. E, caso não tenham nenhuma preferência, que escrevam o nome da pessoa que consideram ser a mais apropriada”, diz o ex-magnata do petróleo.

Garry Kasparov, estrela dos direitos humanos na Rússia, defende que “o boicote não é um acto passivo”: é também uma forma de protesto. “É um desafio à legitimidade do regime. Sabemos que estas eleições são uma charada, uma farsa. O resultado é previsível”, disse.

Putin distorceu o sistema

As eleições russas ainda não têm candidatos e, para já, Vladimir Putin faz tabu de uma eventual recandidatura. Para Kasparov, o escrutínio será sempre uma farsa. “No xadrez, temos regras fixas e resultados imprevisíveis. Na Rússia de Vladimir Putin é exactamente o contrário. Negar a legitimidade desta farsa é muito importante porque, independentemente do número de pessoas a votar, o regime vai ser abalado. Se ficarmos em casa, nada vai acontecer, mas temos de promover a ideia de que é ilegítimo”, afirma o astro do xadrez.

E se houvesse uma nova revolução na Rússia, como há 100 anos? A pergunta foi dirigida ao ex-magnata do petróleo Mikhail Khodorkovsky. A resposta: “Os que se recordam da revolução russa não querem outra. Muito sangue derramado, uma economia destruída… Para nossa infelicidade, as alterações legislativas feitas durante os anos de poder de Putin distorceram de tal forma o sistema legal que tenho muita dificuldade também em perceber como o sistema pode alterado.”

Khodorkovsky acredita que ainda falta um longo caminho para que os eleitores russos percebam a responsabilidade do voto, uma espécie de maturidade que, para o empresário, ainda não existe na Rússia.