Ser bispo de Pemba “foi uma experiência de cruz e de dor”, diz D. Luiz
22-02-2021 - 17:42
 • Filipe d'Avillez

Apesar dos problemas que marcaram a região moçambicana nos últimos três anos, o bispo brasileiro diz que o que lhe ficou marcada foi a generosidade do povo.

D. Luiz Fernando Lisboa, o bispo brasileiro que recentemente deixou a diocese de Pemba, em Moçambique, diz que os últimos anos do seu ministério foram marcados pela dor, por causa da insurreição armada jihadista que atingiu a zona de Cabo Delgado e que já causou mais de dois mil mortos e centenas de milhares de deslocados.

“Foi uma experiência muito forte, uma experiência de cruz, uma experiência de dor”, sublinha D. Luiz, em declarações à fundação Ajuda à Igreja que Sofre.

“Dessa guerra, eu pude tirar muitas lições. A principal delas é a gradeza desse povo que é pobre mas que é muito solidário. Eu vi muitas histórias, ouvi muitas histórias, vi muitas situações e percebi quanto é que, mesmo na pobreza, nós podemos ajudar, nós podemos repartir, partilhar. Nesse tempo de guerra cada família que não era deslocada acolheu uma ou duas ou até três famílias deslocadas, dentro da sua casa, no seu quintal repartindo o pouco que tinha com aqueles que não tinham nada e estavam ainda no desespero, na estrada, sem ter norte.”

O bispo garante que “a experiência do povo de Cabo Delgado vai ficar sempre marcada na minha vida”.

Questionado pela AIS sobre se considerava injusta a sua remoção de Cabo Delgado, o bispo nega. “De maneira nenhuma. A missão é de Deus, não é nossa. Nós somos apenas instrumentos de Deus. Na Igreja, uma das características do missionário e sobretudo do religioso, porque eu sou também da vida religiosa, é a itinerância. Nós nunca nos fixamos num lugar. Nós somos transferidos para onde a Igreja precisa, para onde Deus nos manda, e nós temos que estar sempre prontos a desmontar a nossa tenda e montá-la em outro lugar. E neste momento, o Papa Francisco entendeu que seria melhor que eu fosse trabalhar em outro lugar e eu acolhi e agradeço todo o apoio que ele deu, todo o empenho que ele teve em nos ajudar e toda a preocupação que ele teve e ainda tem para com Cabo Delgado, porque além de rezar ele quer continuar a ajudar aquele povo.”

Na semana passada, em declarações à Renascença, D. Luiz admitiu que a decisão do Papa de o fazer sair de Moçambique poderia estar ligada à existência de ameaças à sua vida, mas rejeitou que o pedido para sair tivesse partido de si.

Nesta entrevista à Ajuda à Igreja que Sofre o bispo aproveita para agradecer todo o apoio que recebeu enquanto esteve em Pemba. “Eu queria aproveitar para agradecer à AIS por todos esses anos de parceria, por toda a ajuda que já prestou, que já deu à nossa diocese. Da AIS e daqueles que colaboram com a AIS nós recebemos carros para os missionários, nós já recebemos ajuda para a formação de padres e seminaristas, para retiros, ajuda de subsistência para irmãs, projetos, agora no tempo da guerra, para a alimentação da população deslocada, projetos para a compra de material agrícola para o pessoal deslocado… e estamos ainda com alguns projetos em pleno desenvolvimento! Nesse tempo da guerra a AIS tem-nos ajudado muito com vários pequenos projetos que têm possibilitado ao nosso pessoal missionário trabalhar e levar o socorro às vítimas dessa guerra.”

O Papa Francisco nomeou D. Luiz bispo da diocese de Cachoeiro de Itapemirim, cargo que deve assumir em março. Apesar do regresso ao seu país natal, o prelado garante que “África nunca vai sair de mim”.