Primeiro, veio um “piquinho” na garganta. Não era bem dor, era uma espécie de irritação. Normal, tinha apanhado muito frio na véspera e, afinal, estamos no Inverno. Depois, umas cólicas e uns vómitos no primeiro dia do ano. Também normal. Tinha comido o que não devia. A seguir, umas dores das costas. Também explicáveis: tinha andado com o meu sobrinho às cavalitas, eu não vou para nova e ele já não é um bebé. Depois vieram as dores de cabeça. Isso é que não costumo ter, mas podiam ser do frio, do trabalho, do stress…
Tudo junto, começa a formar-se uma nuvem de ligeiro pânico. Afinal, cada sintoma tinha uma explicação razoável, mas todos juntos podiam ser sinal do monstro que nos assusta há dez meses. Uma vontade de estar deitada no sofá, com saco de água quente nos pés e olhos fechados. Uma tarde assim no sábado. Acordar razoável no domingo, mas voltar ao mesmo à tarde.
E se for…? Não, não é, é tudo fruto do tempo. Mas e se não for fruto do tempo, se for mesmo “o bicho”? E se ando para aí a infetar? Os meus sobrinhos que andam na escola, a minha tia que cuida de uns primos mais velhos, o padre que serve três paróquias…
Se estou infetada, eles vão ter de ficar em isolamento profilático. Que transtorno! Não, não estou. É tudo pânico, que parvoíce. Tenho cheiro e paladar, não tenho febre. Talvez passe se não estiver com mais ninguém e não falar disto a ninguém.
As dores de cabeça aumentam. Também pudera, a tentar acompanhar dois debates presidenciais. A garganta está a picar mais. Talvez seja melhor beber um chá e tomar um ben-u-ron.
Mais uma tarde e uma noite disto e a cabeça a estalar. Que parvoíce! Logo eu que acho que não stresso, que sou tão calma. É melhor não ir trabalhar na segunda. E, já agora, faço uma lista de todos os contactos dos últimos dias. “Vá lá Eunice, ganha juízo. És uma adulta informada e responsável”, digo a mim própria segunda de manhã.
Faço o que tenho a fazer: ligo para uma profissional de saúde, com muitas horas de covidário. Enumero os sintomas todos que tive nos últimos dias e a explicação que cada um pode ter.
Acha melhor fazer teste. Faço o teste. Aviso os contactos mais próximos. Agora é aguardar.
Fazer o que está certo serena-me depois de 48 horas de cabeça em parafuso.
Teste feito e, já que vim à vila, acho melhor ir comprar um termómetro que o lá de casa não me parece de confiança e está a ficar sem pilha. E, já agora, também uns coentros para fazer sopa. No regresso a casa, recrimino-me: além de uma irresponsabilidade, deve ser pecado. Por muitos cuidados que tenha tido, não devia ter ido.
Com tudo isto, entro no mundo do Trace-Covid. A enfermeira do centro de saúde liga todos os dias. No primeiro telefonema, ainda antes de saber o resultado do teste, avisa-me que tenho de ficar em casa mesmo que dê negativo. Pode sempre ser um falso negativo. Dez dias em casa se for positivo, 14 se for negativo é uma perspetiva pouca animadora.
Mais de 24 horas depois o resultado: negativo. Uffff. Avisar família que, afinal, foi só um susto. “O ser humano existe há mais de 10000 anos e sempre houve febres e tosses... covid tem 12... meses...”, goza um primo. E começa a instalar-se uma certa sensação de ridículo.
As dores de cabeça e de garganta continuam, a tosse aumenta e os ouvidos doem de vez em quando. Do covidário local, acham melhor ir a uma consulta presencial, posso precisar de tomar algo para a garganta. Lá vou. Enquanto espero, novamente a sensação de ridículo. Há mães com crianças à espera. “Chega-te mais para trás”, diz uma à filha pequena quando me ouve tossir enquanto esperamos que abram a porta.
Enquanto espero pela consulta, a enfermeira vê-me a temperatura e os níveis de oxigénio. Na sala ao lado, ouço uma criança com vómitos. Desabafo com a enfermeira que me sinto um bocado ridícula por estar a dar trabalho. “Fizeste o que devias fazer”, responde-me ela. E saio da consulta com uma receita de anti-inflamatório e comprimidos para a tosse. E a recomendação de não sair de casa enquanto tiver sintomas. Malditas constipações que nos pregam sustos!