Veja também:
- À margem de Lisboa. Como Alfama se está a mudar para Cacilhas
- Mães ocupas. Quando viver com os filhos na rua não é opção
A associação Habita apelou esta terça-feira à mobilização cívica num "cordão de resistência" para impedir o despejo de uma idosa em Lisboa enquanto não for encontrada uma alternativa de habitação adequada, criticando à falta de resposta das entidades públicas.
A viver há quatro décadas numa casa na zona do Marquês de Pombal, em Lisboa, Nazaré, de 82 anos, recebeu ordem de despejo, porque o contrato de arrendamento estava em nome da tia, que faleceu há dois anos.
Com uma pensão de 475 euros, em que já quase metade é gasta na atual renda de 202 euros, a idosa não consegue encontrar uma nova casa em Lisboa que consiga pagar.
"Pedimos às pessoas para se mobilizarem pela dona Nazaré, porque isso significa que se estão a mobilizar também por aquilo que se passa na cidade de Lisboa relativamente a esta ofensiva brutal que é a expulsão e o despejo", afirmou à Lusa a presidente da Habita - Associação pelos Direitos à Habitação e à Cidade, Rita Silva.
De acordo com a responsável da Habita, a Nazaré já se dirigiu a todas as entidades públicas responsáveis, nomeadamente a Câmara Municipal de Lisboa e a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, e "não consegue ter qualquer vislumbre, qualquer luzinha, de qualquer tipo de solução".
Neste sentido, a idosa está a pedir "tempo para não ser despejada já", o que pode acontecer a partir de sexta-feira, e "apoio das entidades do Estado", de forma a conseguir encontrar uma solução de habitação digna e adequada.
A Lusa questionou a Câmara de Lisboa para saber se vai intervir no caso de Nazaré, ao que a autarquia indicou que está a acompanhar a situação, juntamente com a SCML, "na procura de uma solução possível".
Na procura de uma nova casa para viver em Lisboa, Nazaré foi aconselhada a ir para um lar, mas a idosa rejeita essa alternativa.
"Isto tem andado um bocadinho na moda, que é quando as pessoas são despejadas oferecem às pessoas instituições [...]. Não podemos agora prender as pessoas em instituições, institucionalizar as pessoas porque temos um problema de habitação, as pessoas se quiserem ir para um lar, vão por sua livre vontade", defendeu a presidente da Habita, criticando, ainda, a ideia de que, se a Nazaré tem um filho, apesar de este não viver em Lisboa e não ter condições para abrigar a mãe, devem ser os familiares a acolhê-la.
Com a mobilização de várias organizações, incluindo a associação Habita e a plataforma Stop Despejos, pretende-se "começar a agir, de uma forma coletiva e concertada, em solidariedade com estes casos para impedir o despejo", avançou Rita Silva, referindo que, no caso da Nazaré, se vier a acontecer o despejo, a ideia é formar "um cordão de resistência para impedir que esse despejo aconteça sem estarem garantidas as alternativas necessárias" para uma habitação adequada.
Ainda sem data marcada, o despejo de Nazaré pode acontecer a partir de sexta-feira, pelo que as organizações estão atentas e preparadas para se mobilizarem no dia em que tal aconteça.
Questionada sobre as alterações legislativas à lei do arrendamento, a presidente da Habita afirmou que "não são de todo suficientes e estão muito longe de responder ao problema que se passa no terreno", considerando que se tem "fingido que se faz alguma coisa para que fique tudo na mesma".
"Como há uma crise de despejos nesta cidade [Lisboa], é muito importante que haja uma moratória a sério aos despejos, que haja uma interrupção a todos os despejos, já que a moratória que existe agora é para uma percentagem ínfima da população que está a ser despejada, porque há muitos mais que não entram na moratória, como o caso da dona Nazaré", apontou Rita Silva, destacando a necessidade de existir mais habitação pública e de regulamentação do mercado do arrendamento.
Expressando que "não tem havido vontade política" para resolver o problema, a presidente da Habita lembrou que "o orçamento de 2019 para a habitação é minúsculo, como se não existisse uma crise na habitação neste país".