O passo apressado de quem anda, e a velocidade que se mistura com o stress de quem conduz não deixam espaço para dúvidas: esta segunda-feira marca o regresso às aulas de todos os alunos. Ou mais, regresso à escola. Aulas nem todos têm.
No portão da Escola Secundária José Gomes Ferreira, em Lisboa, antes das 9h da manhã já há alunos a sair. Já se aperceberam que não têm a primeira aulas porque não há professor: "Tivemos furo", conclui Gonçalo Veigas, aluno de 17 anos, em declarações à Renascença.
Rodeado pelos amigos que o verão separou, este estudante assume que "acontece algumas vezes" e explica que desta vez não tiveram aula porque a professora colocou baixa médica. Deslocam-se e sentido contrário à maioria, saem da escola e voltam mais tarde para os blocos de aulas seguintes.
Mais cedo, muitos carros param à frente da escola em quatro piscas e os pais despedem-se dos filhos. Ao lado, outros descem o autocarro que para mesmo à frente do portão. As mochilas às costas são o denominador comum.
"Crítico", assume diretora
O cenário de falta de professores é indisfarçável: "Este ano a situação é crítica", introduz Rosária Alves, diretora da escola secundária de Benfica. Está à porta e demonstra ter proximidade com os alunos pela forma como fala com eles.
"Este problema não se conseguia resolver no início do ano letivo, exige a aplicação de medidas a médio e longo prazo", assume a dirigente, dando conforto ao que diz o governo. Luís Montenegro já admitiu que não é possível preencher os horários das escolas onde faltam professores no imediato, apesar de ter deixado promessas mais ambiciosas quando era oposição e durante a campanha.
Nesta escola, em Lisboa, faltam 32 professores, mais do que aqueles que faltavam no início do ano lectivo do ano passado. "É o resultado de anos de desinvestimento na Escola Pública", relaciona de imediato Rosária Alves.
Apesar do choque inicial, a diretora aguarda com expectativa para perceber se as medidas anunciadas pelo governo podem cativar mais professores a dar aulas em Lisboa e Algarve, as zonas mais carenciadas de docentes.
"Preocupa-nos muitíssimo", dizem os pais
De sentinela, também à porta da escola secundária de Benfica, está a representante da associação de pais cujos filhos estão neste estabelecimento. Irina Alpalhão desabafa que "muitos dos alunos já sabem que não têm professor".
Personalizando, exemplifica com o seu próprio filho, que não tem professor a três disciplinas diferentes. "É uma situação que nos preocupa muitíssimo", lamenta.
De bom humor, Irina Alpalhão assume que "alguns alunos até agradecem" não ter aulas. Do outro lado da balança estão os pais: "Não estão agradados", garante em sua representação.
"Sabemos que a situação em Lisboa é particularmente grave. Um professor não quer vir trabalhar para aqui para deixar metade de um salário para pagar uma casa. Eu compreendo".
E do problema, apela ao governo à solução: "O que é facto é que o problema acontece, e se auxiliassem os professores nesta matéria [habitação], podia ser que tivéssemos mais professores", conclui.
Do portão, continuam a sair alunos que entram com a mesma velocidade a que saem, porque não tiveram aulas no primeiro tempo.