Os bancos centrais e os juros
28-08-2023 - 06:30
 • Francisco Sarsfield Cabral

Enquanto Erdogan teve de abandonar a sua absurda política de taxas de juro, os presidentes da Reserva Federal e do BCE mostram-se favoráveis a manter juros altos. Mário Centeno concorda.

Surgiu há dias a notícia de que o banco central da Turquia tinha subido a sua taxa de juro de referência para 25%. Uma taxa tão alta provocou alguma surpresa em quem não estava familiarizado com o comportamento do banco central turco.

Acontece que, até junho passado, o presidente da Turquia, Erdogan, obrigava o banco central a descer juros. Num capricho típico de autocrata, Erdogan achava que a inflação devia ser combatida com descidas e não subidas de juros.

Com uma tal terapêutica absurda, a inflação na Turquia chegou a ultrapassar os 80%. Uma vez reeleito presidente, em junho, Erdogan resolveu mudar a sua posição. Convidou para presidir ao banco central uma economista, Efise Erkan, decisão inédita em países islâmicos. E certamente esta economista apenas aceitou o cargo sabendo que poderia subir os juros do banco.

Assim, depois de oito sucessivas descidas, o juro de referência do banco central turco subiu para 15% em julho. Depois subiu para 17,5% e agora para 25%. Não é fácil inverter as expectativas durante anos alimentadas com juros a cair; daí a necessidade, agora, de um choque violento.

Também o Banco Central Europeu (BCE) se atrasou um pouco, em 2022, na necessária subida de juros – cerca de um ou dois meses, durante os quais Christine Lagarde tentou classificar a inflação na zona euro de fenómeno temporário.

A inflação na zona euro desceu para 5,3% em julho, contra quase 9% um ano antes; mas está ainda distante o alvo de 2%. Por isso Christine Lagarde afirmou na semana passada que uma política monetária restritiva iria ser mantida pelo BCE enquanto a inflação se mantivesse elevada. Esta afirmação aconteceu em Jackson Hole, no simpósio anual promovido pela Reserva Federal, o banco central dos EUA.

A intervenção do presidente da Reserva Federal, Jerome Powell, em Jackson Hole, foi no mesmo sentido – manter taxas de juro altas enquanto a inflação não abrandar para menos de 2%. Note-se que a Reserva Federal, ao contrário do BCE, não tem apenas como objetivo estatutário manter preços estáveis, também deve atender à evolução do emprego.

Mas uma subida do juro do BCE no próximo dia 14 de setembro, a concretizar-se, irá condenar a zona euro a uma recessão? A economia alemã está à beira da recessão, que prejudicará o crescimento económico na zona euro. Mas o próprio presidente do Bundesbank, o banco central alemão, Joachim Nagel, disse que ainda é cedo para fazer uma pausa nas subidas das taxas de juro. É uma típica reação alemã, excessivamente dominada pelo receio de surtos inflacionistas. O que tem a ver com a memória da terrível híper inflação na Alemanha em 1921-1923, que levou muita gente à miséria e abriu o caminho à ascensão do nazismo.

Mário Centeno, governador do Banco de Portugal, participou igualmente no simpósio de Jackson Hole e defendeu a política de juros do BCE, afirmando: “acho que fomos comedidos e razoáveis nas nossas decisões”. Aliás, a descida da inflação na zona euro, embora ainda insuficiente, mostra que a subida dos juros foi eficaz.