Michel Barnier. Quem é o ex-conselheiro de Durão Barroso que vai governar França?
05-09-2024 - 22:42
 • João Pedro Quesado

Conhecido por negociar o Brexit em nome da União Europeia, o político francês tem uma longa carreira europeia, que uns Jogos Olímpicos de Inverno ajudaram a lançar. À imagem de negociador sério juntaram-se propostas anti-imigração numa candidatura falhada às presidenciais de 2021.

Quase dois meses depois da segunda volta das eleições legislativas na França, Emmanuel Macron finalmente escolheu um primeiro-ministro (Michel Barnier) que considera capaz de não ser chumbado pela Assembleia Nacional – onde, apesar de não ter vencido as eleições, a União Nacional, de Marine Le Pen, é o partido com mais deputados, tornando-se, segundo o “Le Monde”, o “árbitro da escolha de Macron”.

O resultado das várias respostas negativas às escolhas da coligação de esquerda Nova Frente Popular foi Michel Barnier, um veterano da política francesa e europeia, com 73 anos.

Nascido em 1951, foi eleito pela primeira vez para a Assembleia Nacional aos 27 anos, representando o União para a República de Jacques Chirac até 1993. O partido, tal como Barnier, era conservador e gaulista – a corrente política dominante na França depois da Segunda Guerra Mundial.

O novo primeiro-ministro saltou para o olhar público da França com a organização dos Jogos Olímpicos de Inverno de 1992, que decorreram em Albertville – a 80 quilómetros de Grenoble, onde nasceu. O sucesso da empreitada valeu o salto para o Governo, como ministro do Ambiente, no ano seguinte, quando o partido de Chirac venceu as eleições – e, em conjunto com um partido de centro-direita, deixou pouco mais de 100 lugares no Parlamento para outros partidos.

Duas décadas em modo Bruxelas

Foi em 1995 que começou a vertente europeia da carreira, quando passou a ser secretário de Estado para os Assuntos Europeus, até 1997. Depois, entre 1999 e 2004, fez parte da Comissão Europeia de Romano Prodi.

A viagem europeia continuou depois da Comissão. Durão Barroso nomeou Barnier como conselheiro especial em 2006, ano em que apresentou uma proposta de criação de uma força europeia de proteção civil. Nessa altura, o francês também fez parte de um grupo que transformou a rejeitada Constituição Europeia no Tratado de Lisboa, assinado no Mosteiro dos Jerónimos no final de 2007.

Michel Barnier fez parte da segunda Comissão de Durão Barroso, sendo comissário para o Mercado Interno e Serviços. Durante o mandato, entre 2010 e 2014, procurou ser o sucessor do português na liderança da Comissão Europeia, mas foi derrotado por Jean-Claude Juncker na corrida à nomeação do Partido Popular Europeu.

Juncker também convidou Barnier para conselheiro especial, agora para a política de defesa e segurança, em 2015. No ano seguinte, veio a nomeação mais famosa: a de negociador-chefe da Comissão Europeia para o Brexit.

A campanha que o define

Chegado a 2021, com o Brexit e um novo acordo comercial com o Reino Unido concluídos, Michel Barnier lançou-se em campanha presidencial para as eleições de 2022.

Foi nessa campanha que definiu a maioria das políticas que defende na atualidade. A principal proposta passava por uma pausa de três a cinco anos na imigração de fora da União Europeia, parando “as regularizações condicionais de imigrantes sem documentos” e acelerando "o processo de requisição de asilo”.

“Não podemos reparar nada, não podemos construir nada sem segurança e se são os contrabandistas e os juízes que decidem quem pode entrar na França e quem pode ficar”, escreveu Barnier num texto de opinião no “Le Figaro”, em novembro de 2021.

Outra proposta polémica nessa campanha foi a de um referendo sobre a “liberdade de movimento” de imigrantes, sugerindo que a França devia deixar de cumprir as regras da União Europeia sobre a livre circulação de pessoas.

Durante a candidatura, Barnier defendeu subir a idade da reforma para 65 anos, numa altura em que a idade mínima era de 62 anos. Esse limite mudou, em 2023, para 64 anos, pelas mãos da maioria de Macron, o que provocou uma série de protestos e greves gerais entre janeiro e junho desse ano.

Michel Barnier propôs ainda reduzir os impostos em 10 mil milhões de euros, incluindo uma redução nos salários entre 1,5 e 2,5 vezes o salário mínimo. Para pagar essa redução, o francês queria reduzir a despesa pública, e assumiu o mantra do “trabalho e mérito” por oposição ao “Estado social”.

No final desse ano, no congresso do partido Os Republicanos, foi apenas o terceiro mais votado na nomeação para as legislativas, entrando num período de inatividade que Emmanuel Macron deu por terminado, esta quinta-feira.

Entretanto, não há sinal de as posições terem sofrido grandes alterações. No final de 2023, numa entrevista ao "Financial Times", culpou o Tribunal Europeu de Justiça por reduzir a liberdade dos Estados-membros da UE em assuntos de segurança nacional, assim como de expandir os direitos de imigrantes.