O tratamento do cancro é prioritário no SNS, mas o efeito das greves e da falta de profissionais no sector da saúde começa a sentir-se também no Instituto Português de Oncologia, no Porto, ainda que de forma pontual.
Susana Ferreira é doente oncológica há dez anos e referiu que o tempo que demora a conhecer os resultados dos exames está a aumentar. “Esta consulta que eu vou ter hoje [terça-feira] é de um exame que fiz em setembro. É um grande hiato de tempo para nós sabermos, não é?”, declarou à Renascença, junto à entrada do IPO.
Esta situação é preocupante na medida em que o atraso no diagnóstico do cancro leva ao aparecimento de casos mais graves.
Susana, que é natural do Porto, fez análises semelhantes “há dois anos” e nessa altura a espera pelos resultados fez-se num "período mais curto”. Uma situação que acontece, no seu entender, “porque os médicos não conseguem marcar as consultas atempadamente, ou porque os exames não ficam prontos”.
A residir mais a norte, em Ponte de Lima, a vida da família Esteves sofreu um abalo em setembro, quando o pai Casimiro, de 68 anos, foi diagnosticado com um cancro no pescoço e na cabeça. Agora têm que se deslocar 80 km, de quinze em quinze dias, da cidade minhota até ao IPO. Na semana passada, no entanto, a viagem fez-se em vão.
Os médicos não conseguem marcar as consultas atempadamente ou os exames não ficam prontos
“O meu pai tinha uma consulta com o médico, com hora marcada. Chegámos e depois, quando chegou a hora de entrar, informaram que devido às greves o médico não ia estar disponível, que não havia nenhum médico a substituir e tivemos que voltar outra vez para trás”, afirmou a filha de Casimiro, Clarisse Esteves.
A convulsão vivida pelo sistema Nacional de Saúde (SNS) faz temer pelo acompanhamento do doente. “Vemos a saúde da pessoa a degradar-se e queremos tentar perceber se realmente as coisas estão a andar para a frente ou se está estagnado e não temos ninguém que nos dê resposta”.
O pai, disse Clarisse, "fica frustrado" pelos esforços feitos em vão e por já ter sido obrigado a regressar a casa “sem ter a mínima atenção de um médico”.
“Neste tipo de doenças, o tempo e as esperas obviamente que têm impacto”
Recentemente, através de um comunicado, a direção-executiva do SNS admitiu que o sistema público "atravessa um período crítico da sua existência”, que obrigou a uma reorganização da rede de serviços de saúde.
Este contexto de incerteza “causa inquietação” e “ansiedade”, explicou Susana Ferreira. “Neste tipo de doenças, o tempo e as esperas obviamente que têm impacto”.
Outra doente oncológica, Ana Policarpo, que esteve internada uma semana em setembro devido a uma mastectomia radical dupla, não hesita em afirmar que existe uma “falta estrutural de pessoal”, com impacto no dia-a-dia dos doentes.
No entanto, vê nisso uma boa razão para que os profissionais de saúde estejam em greve. “Eles têm mesmo que fazer greve porque não têm condições de trabalho”, concluiu.