Chamada pelo Parlamento a emitir parecer em relação ao projeto de lei do Bloco de Esquerda que prevê a despenalização da prática da eutanásia, a Ordem dos Advogados respondeu ao pedido dos deputados 16 dias depois e deu a mesma resposta que já tinha dado em 2020: é inconstitucional.
Os bloquistas foram os primeiros a entregar o projeto de lei no Parlamento nesta sessão legislativa - cumprindo, de resto, uma promessa eleitoral - e a resposta do Conselho Geral da Ordem dos Advogados surgiu com data de 6 de maio e com novo parecer negativo.
Num texto assinado por Tiago Oliveira Silva lê-se que "a Ordem dos Advogados não mudou de opinião, e como tal não encontra justificação para a necessidade de alterar o referido parecer, para o qual remete a fundamentação".
O vogal do Conselho Geral da Ordem dos Advogados remete, assim, para o parecer negativo produzido em 2020, também a pedido do Parlamento e relativo ao projecto de lei de então da Iniciativa Liberal. Nesse texto lê-se que "a vida sendo inviolável constitui um direito irrenunciável e, portanto, indisponível, bem como os demais direitos de personalidade previstos na lei".
E ainda mais incisivo, o parecer da Ordem diz que "tal salto de pensamento configuraria uma alteração estruturante no quadro dos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos que consideramos não ser admissível, nem tão pouco arriscável, tal seria o perigo que encerraria abrir uma tal 'caixa de Pandora'.
Os Advogados consideram, por isso, que "a despenalização da morte assistida ofende, de forma flagrante, a Constituição da República Portuguesa", referindo mesmo que acompanha a posição do constitucionalista Jorge Miranda.
PS ainda não entregou projeto de lei no Parlamento
Há dez dias que o PS apresentou em conferência de imprensa o seu próprio projeto de lei que prevê a despenalização da prática da eutanásia, diploma que deixa cair o conceito de "doença fatal", mas até agora o texto não deu entrada nos serviços da Assembleia da República.
A Renascença consultou o sítio da internet do Parlamento e até esta sexta-feira o PS não tinha entregue o projeto de lei que apresentou a 3 de maio na sala de conferências de imprensa da Assembleia da República e que contou com o próprio líder parlamentar Eurico Brilhante Dias e a deputada e membro do Secretariado Nacional do partido Isabel Moreira.
O projeto de lei do PS aproxima-se agora do do Bloco de Esquerda - o diploma que agora teve parecer negativo da Ordem dos Advogados -, sendo que um dirigente socialista já admitiu à Renascença que não tem "a menor dúvida" que o Presidente da República irá enviar o diploma para fiscalização do Tribunal Constitucional.
O PS deixou de fora do projeto de lei que apresentaram, mas que ainda não entregaram no Parlamento, o conceito de "doença fatal", sendo esta precisamente a expressão que o Presidente da República alertou que não deveria deixar de ser mencionada na lei. Nos fundamentos do veto político do ano passado, Marcelo levantava a questão.
"Admitamos que a Assembleia da República quer mesmo optar por renunciar à exigência de a doença ser fatal, e, portanto, ampliar a permissão da morte medicamente assistida, ou seja, do suicídio medicamente assistido e da eutanásia", lançando depois a pergunta: "Corresponde tal visão mais radical ou drástica ao sentimento dominante na sociedade portuguesa?".
E o Presidente deixava ainda outra pergunta nos fundamentos do veto político: "Ou, por outras palavras: o que justifica, em termos desse sentimento social dominante no nosso país, que não existisse em fevereiro de 2021, na primeira versão da lei, e já exista em novembro de 2021, na sua segunda versão? O passo dado em Espanha?".
Os socialistas estão confiantes que a avaliação dos juízes do Palácio Ratton até lhes poderá ser favorável, mas que no caso de a opção do Presidente da República ser a de vetar o texto que lhe chegar, então irá funcionar como resposta a confirmação do diploma e o voto da maioria absoluta do PS, obrigando a promulgação de Belém.