As divisões democráticas sobre questões raciais, idade e ideologia marcaram o segundo debate entre os pré-candidatos democratas às eleições presidenciais norte-americanas na quinta-feira à noite.
A saúde voltou a estar em destaque, à semelhança do que sucedera na quarta-feira com outros dez pré-candidatos do Partido Democrata, mas o debate foi também marcado por um confronto de palavras entre o ex-vice-Presidente norte-americano Joe Biden e a senadora californiana Kamala Harris.
Este foi um dos vários momentos que mostraram Biden, de 76 anos, na defensiva, enquanto tentava convencer os eleitores dos Estados Unidos de que é o mais bem posicionado para negar ao Presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, um segundo mandato.
"Eu não acredito que você seja racista", disse Harris a Biden, apesar de descrever como "doloroso" o histórico do adversário, que trabalhou com senadores republicanos segregacionistas em questões não raciais.
Biden classificou a crítica de Harris como "uma completa descaracterização" do seu trabalho político. O ex-vice-Presidente de Barack Obama disse que a sua motivação foi a salvaguarda dos direitos cívicos e mais tarde acusou a administração Trump de validar o racismo.
O debate mostrou as profundas divisões dentro do Partido Democrata, a oito meses do início das eleições primárias e, tal como o da noite anterior, deu a oportunidade a milhões de norte-americanos de terem o primeiro contacto com as propostas de 20 dos 25 pré-candidatos democratas.
O confronto desta quinta-feira contou com quatro dos cinco candidatos mais fortes, pelo menos de acordo com as primeiras sondagens: Biden, Bernie Sanders, Pete Buttigieg e Harris. A senadora Elizabeth Warren, que participou no debate de quarta-feira à noite, é a quinta.
Há tantos candidatos a perfilarem-se para enfrentar Trump que nem todos conseguiram garantir um lugar nos dois debates. Vinte democratas debateram na televisão nacional esta semana, em conjuntos de dez pré-candidatos, os restantes cinco ficaram de fora.
A diversidade dos pré-candidatos não tem precedentes num grande partido político nos Estados Unidos: seis mulheres, dois afro-americanos, um asiático-americano e dois homens com menos de 40 anos, um deles assumidamente homossexual.
Apesar de no início da campanha dois septuagenários brancos liderarem as sondagens, Biden e Sanders, a lista de candidatos de quinta-feira, e o debate em si, destacaram essa mesma diversidade no Partido Democrata.
Harris tornou-se na única mulher afro-americana a conseguir participar num debate presidencial.
O autarca de Indiana, Pete Buttigieg, de 37 anos, ex-militar homossexual, é quatro décadas mais novo que Sanders, e tem aproveitado a pré-candidatura para fazer um pedido de mudança geracional no partido.
Buttigieg enfrentou duras perguntas sobre um recente tiroteio policial racial na sua cidade, no qual um agente branco disparou fatalmente sobre um homem negro Eric Logan, e acabou por reconhecer as tensões raciais naquela cidade.
Um dos candidatos menos conhecidos em palco, o representante da Califórnia, Eric Swalwell, pediu que Buttigieg demitisse o seu chefe da polícia, apesar de ainda estar a decorrer uma investigação.
O mesmo Swalwell procurou sublinhar a idade de Biden, já que, caso o ex-vice-Presidente ou Sanders ganhassem as próximas eleições para a Casa Branca, tornar-se-iam nos mais velhos líderes dos Estados Unidos.
"Joe Biden estava certo quando disse que era hora de passar a tocha para uma nova geração de norte-americanos há 32 anos", disse Swalwell. Biden respondeu: "Eu ainda estou a segurar a tocha".
A luta ideológica do partido ficou, por vezes, em segundo plano, devido às divisões raciais e geracionais. Contudo, temas que têm sido centrais na discussão política para os democratas como a imigração, a saúde e as alterações climáticas não foram esquecidas.
Biden levantou a mão para dizer que seu plano de saúde forneceria cobertura mesmo para os imigrantes que se encontrassem ilegais no país.
O ex-governador do Colorado John Hickenlooper defendeu que uma rutura agressiva à esquerda nas políticas-chave acabaria por prejudicar o objetivo central do Partido Democrata: a derrota de Trump.
"Se não definirmos claramente que não somos socialistas, os republicanos vão-nos perseguir de todas as formas possíveis e chamar-nos de socialistas", alertou.
Em palco, na quinta-feira à noite, estiveram também a senadora de Nova Iorque Kirsten Gillibrand, Michael Bennet, do Colorado, o empresário nova-iorquino Andrew Yang e a ativista social Marianne Williamson.
Biden procurou evitar as divisões intrapartidárias e tentou focar-se em Trump.
"Donald Trump acha que Wall Street construiu a América. Norte-americanos comuns de classe média construíram a América", disse o ex-vice-presidente. "Trump colocou-nos numa situação horrível. Temos uma enorme desigualdade de rendimentos", acrescentou.
A estratégia de Biden é projetada para destacar o estatuto de favorito e, como tal, o democrata mais bem posicionado para derrubar o atual Presidente.
Acima de qualquer desacordo político, as sondagens mostram que os eleitores democratas defendem que nada é mais importante do que encontrar um candidato capaz de derrotar Trump.
Já Sanders, destacou-se ao pedir uma "revolução política" para mudar um país, onde as três pessoas mais ricas, Bill Gates, Jeff Bezos e Warren Buffett, possuem mais riqueza que a metade mais pobre dos EUA.
O mesmo senador do Vermont, que perdeu a nomeação em 2016 contra Hilary Clinton, sublinhou que é possível nos Estados Unidos garantir um seguro médico público para toda a população, desde que todos se levantem contra as empresas farmacêuticas e seguradoras.