Os infetados com o coronavírus SARS-CoV-2 têm um risco de hospitalização ou morte devido à Covid-19 88% menor durante pelo menos 10 meses do que os que não adquirem essa imunidade natural, indica um estudo divulgado esta sexta-feira.
Os investigadores precisam, por outro lado, que as infeções com variantes pré-Omicron forneceram uma imunidade natural "substancialmente reduzida" contra a reinfecção com a estirpe Omicron BA.1., em que 10 meses após a primeira infeção a proteção era apenas de 36%.
O trabalho publicado hoje na revista científica The Lancet constitui a análise "mais abrangente" feita até agora sobre o nível de proteção e extensão desta após o contágio por diferentes variantes daquele vírus, embora não inclua dados sobre a infeção com a variante Omicron XBB e as suas sublinhagens.
Foram revistos e analisados 65 estudos de 19 países, que comparam "a redução do risco de covid-19 entre indivíduos não vacinados contra uma reinfecção por SARS-CoV-2 e indivíduos não vacinados sem infeção anterior até setembro de 2022", refere um comunicado de divulgação do estudo.
De acordo com a investigação, o nível e a duração da imunidade "contra reinfecção, doença sintomática e doença grave" são pelo menos iguais aos fornecidos por duas doses das vacinas de mRNA (Moderna, Pfizer-BioNtech) para as estirpes Alpha, Delta e Omicron BA.1.
"A vacinação é o modo mais seguro de conseguir imunidade, enquanto a obtenção da imunidade natural (através do contágio) deve ser ponderada face aos riscos de doença grave e morte associados à infeção inicial", diz Stephen Lim, do Instituto de Métricas e Avaliação em Saúde (IHME, na sigla em inglês) na Escola de Medicina da Universidade de Washington, nos Estados Unidos, o autor principal da análise, citado no comunicado.
Caroline Stein, também do IHME e coautora do estudo, assinala que "as vacinas continuam a ser importantes para todos" para proteger quer as populações de alto risco, como os maiores de 60 anos e os que já têm outras doenças.
"Isto também inclui populações que não foram infetadas anteriormente e grupos não vacinados, bem como os que foram infetados ou receberam a última dose da vacina há mais de seis meses", adianta, defendendo que a imunidade natural e a situação em relação à vacinação devem ser tidas em conta para "obter uma imagem completa do perfil de imunidade de um indivíduo".
Desde janeiro de 2021, foram divulgados vários estudos sobre a eficácia da infeção pelo SARS-CoV-2 na redução do risco de reinfeção e como a imunidade vai diminuindo com o tempo, mas nenhum avaliava de forma abrangente quanto tempo duraria a proteção após a infeção natural contra diferentes variantes.
A análise dos dados de 21 estudos sobre a infeção com uma variante pré-Omicron "estimou que a proteção contra a reinfecção de uma variante pré-Omicron foi de cerca de 85% no primeiro mês e caiu para cerca de 79% após 10 meses", enquanto a imunidade natural conseguida com "uma infeção da variante pré-Omicron contra a reinfeção da variante Omicron BA.1 foi menor (74% num mês) e diminuiu mais rapidamente para 36% em cerca de 10 meses".
"No entanto, a análise de cinco estudos relatando doenças graves (hospitalização e morte) revelou que a proteção (a este nível) permaneceu universalmente alta durante 10 meses: 90% para as ancestrais alfa e delta e 88% para a Omicron BA.1".
Outros seis estudos que avaliaram a proteção especificamente contra sublinhagens da variante Omicron (BA.2 e BA.4/BA.5) indicavam que a proteção era bastante menor quando a infeção anterior era de uma variante pré-Omicron, mas que se mantinha a "um nível mais alto" quando a infeção anterior se deveu à estirpe Omicron, de acordo com o estudo divulgado hoje pela Lancet.
Segundo outro dos coautores do estudo, Hasan Nassereldine, do IHME, a menor proteção das infeções com as estirpes ancestrais em relação à variante Omicron e às suas sublinhagens reflete as mutações que ocorreram e que lhes permitem "escapar da imunidade adquirida mais facilmente do que outras variantes".
"Os dados limitados que temos sobre a proteção da imunidade natural da variante Omicron e das suas sublinhagens sublinham a importância de uma avaliação contínua, principalmente porque se calcula que tenham infetado 46% da população em todo o mundo entre novembro de 2021 e junho de 2022", diz o cientista, adiantando serem também necessárias mais investigações para "avaliar a imunidade natural de variantes emergentes e analisar a proteção fornecida por combinações de vacinação e infeção natural".
Os autores do estudo "Proteção da infeção com SARS-CoV-2 contra a reinfeção: uma revisão sistemática e meta-análise" observam que o trabalho tem algumas limitações, dado serem limitados os dados sobre a variante Omicron BA.1 e as suas sublinhagens, bem como sobre situação em África.
Adiantam que os cálculos sobre a proteção também podem ter sido influenciados por serem limitados os dados disponíveis além dos 10 meses após a infeção inicial, bem como por serem registadas de modo diferente ou incompleto informações, por exemplo, sobre uma infeção anterior ou internamentos hospitalares.