O Supremo Tribunal de Justiça abriu um inquérito ao primeiro-ministro, António Costa, no âmbito de uma investigação relacionada com os negócios do lítio (em Boticas e Montalegre), do hidrogénio e a instalação de um "data center" em Sines.
O comunicado da Procuradoria-Geral da República (PGR) enviado às redações explica que surgiram
suspeitas “do nome e da autoridade do Primeiro-Ministro e da sua intervenção
para desbloquear procedimentos
no contexto suprarreferido”.
Estas "referências serão autonomamente analisadas no âmbito de inquérito instaurado no Supremo Tribunal de Justiça, por ser esse o foro competente", adianta a nota.
No mesmo comunicado, a PGR revela ainda que o ministro das Infraestruturas, João Galamba, foi constituído arguido no âmbito da mesma investigação.
Este caso já levou à detenção de cinco pessoas, adianta o comunicado, entre os quais o chefe de gabinete do primeiro-ministro, Vitor Escária, o presidente da Câmara de Sines, Nuno Mascarenhas..
Os outros três detidos estão ligados à empresa "Start Campus" e ao que Renascença apourou junto de fonte ligada a esta sociedade trata-se do presidente executivo Afonso Salema e o diretor Jurídico e de Sustentabilidade Rui Oliveira Neves e ainda um advogado/consultor contratada pela sociedade, Diogo Lacerda Machado, que é também publicamente amigo de António Costa.
Há ainda mais dois arguidos, que não foram detidos: o ministro João Galamba e também o presidente da Agência Portuguesa do Ambiente (APA).
Segundo a nota da PGR, "em causa poderão estar, designadamente, factos suscetíveis de constituir crimes de prevaricação, de corrupção ativa e passiva de titular de cargo político e de tráfico de influência". O documento justifica a emissão dos mandados de detenção "por se verificarem os perigos de fuga, de continuação de atividade criminosa, de perturbação do inquérito e de perturbação da ordem e tranquilidade públicas".
Os detidos vão ser presentes a primeiro interrogatório judicial para aplicação das medidas de coação.
A investigação está a ser conduzida pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP). A operação desta terça-feira prevê a realização de 17 buscas domiciliárias, cinco busas em escritório e domicílio de advogado e 20 buscas não domiciliárias, nomeadamente, "espaços utilizados pelo chefe de gabinete do primeiro-ministro; no Ministério do Ambiente e da Ação Climática, no Ministério das Infraestruturas e na Secretaria de Estado da Energia e Clima; na Câmara Municipal de Sines e na sede/espaços de outras entidades públicas e de empresas.
As buscas estão a ser executadas com o apoio de cerca de 145 elementos da PSP e nove da Autoridade Tributária.
Participam também nas buscas 17 magistrados do Ministério Público, três magistrados judiciais e dois representantes da Ordem dos Advogados.
Presidente da Assembleia da República quer esclarecimentos da PGR
Em declarações à Renascença e jornal "Público", o presidente da Assembleia da República Augusto Santos Silva já falou sobre a investigação em curso. A segunda mais alta figura do Estado considera que "o Ministério Público tem não o dever, mas o poder - não é uma obrigação, é uma faculdade - de prestar esclarecimentos públicos sempre que entender sobre processos que estejam em curso".
Santos Silva lembra que este tipo de investigações causa "alarme social" e considera que esta investigação não será "mais uma questão de casinhos".
Audiências de emergência e agendas canceladas
A operação do DCIAP e o envolvimento do nome de António Costa levaram a que o primeiro-ministro, António Costa, ancelasse a agenda prevista para esta terça-feira de manhã e foi a Belém falar com o Presidente da República. Marcelo Rebelo de Sousa tinha um único ponto na agenda pública para hoje, que foi também cancelado.
Já depois do primeiro encontro com Costa e de ter recebido a procuradora-geral da República, Marcelo reuniu-se uma segunda vez com o primeiro-ministro.
Também o ministro das Infraestruturas, João Galamba, e o ministro do Ambiente, Duarte Cordeiro, alteraram as suas agendas para o dia.
A investigação já tem suscitado diversas reações, a vários níveis. A Frente Cívica, por exemplo, defende a demissão de António Costa "se se confirmarem as suspeitas".
No plano político, o PSD já decidiu reunir de emergência a comissão permanente do partido, encontro marcado para esta tarde. Autonomamente, Miguel Albuquerque, presidente do Governo da Madeira, disse que as buscas contribuem para o "descrédito das instituições democráticas" e beneficiam "partidos radicais à esquerda e à direita".
O Bloco de Esquerda pediu que a Justiça seja célere, "doa a quem doer". O PAN considerou que o ministro das Infraestruturas não tem condições para se manter no cargo e apelou ao primeiro-ministro que dê explicações ao país.
O PCP quer ver "concluídos os apuramentos" da investigação sobre lítio, e que depois "retiradas as devidas consequências das conclusões".
Rui Rocha, da Iniciativa Liberal, pediu a demissão de António Costa, e afirmou que "não podemos ter um primeiro-ministro em funções com pessoas do seu círculo íntimo detidas ou arguidas".
A demissão de António Costa também foi pedida por André Ventura, considerando que se atingiu "o grau zero da credibilidade do Governo".
[atualizada às 16h44]