Em entrevista à Renascença, Luís Paixão Martins considera que a TAP não será um tema tóxico para Pedro Nuno Santos na campanha eleitoral, dado que o líder socialista "conseguiu ter uma narrativa relativamente regular, consistente, constante, coerente" sobre a companhia, mas avisa que a polémica em torno de Alexandra Reis pode ser um "problema".
No seu livro "Como perder uma eleição" referia a TAP como um tema tóxico da campanha de 2022. Há temas tóxicos em que o novo líder do PS não deva tocar?
Na última campanha eleitoral de 2022, o único tema que era difícil de argumentar da parte do PS e do líder da altura, António Costa, era o relacionado com a TAP. Acabei por comentar que o PS tinha a obrigação, num próximo ato eleitoral, de resolver o dossier da TAP. Não está resolvido, ou seja, continua a ser uma empresa controlada pelo Estado, mas, apesar de tudo, é uma situação do ponto de vista comunicacional mais fácil para Pedro Nuno Santos, do que para António Costa.
Pedro Nuno Santos conseguiu ter uma narrativa relativamente regular, consistente, constante, coerente, relativamente à TAP. Acresce que, entretanto, por intervenção dele próprio e da equipa do governo e da equipa da companhia, a TAP passou a produzir resultados diferentes. Passou também a crise da pandemia e hoje em dia, como até está a produzir lucros, tem uma operação normal, qualificada, hoje em dia não pode ser utilizada da mesma maneira como foi na última campanha eleitoral. Mesmo assim, há um problema que é o da indemnização de Alexandra Reis. Admito que possa vir a ser utilizado na campanha eleitoral para ser esgrimido contra Pedro Nuno Santos.
Em relação ao novo aeroporto de Lisboa. Pedro Nuno Santos teve um problema a meio do percurso e foi desautorizado pelo primeiro-ministro. Essa desautorização não poderá servir também de arma de arremesso das oposições?
Em relação ao aeroporto, a situação é um bocadinho diferente. Não se trata da decisão, mas da formalidade da decisão. A solução que Pedro Nuno Santos apresentou naquela célebre noite que foi desmentida no dia seguinte, era a solução correta. Não é um problema de conteúdo, é um problema de forma, o facto de ele ter tomado a decisão, sem ter consultado previamente o primeiro-ministro. Isso pode ser usado para tentar atribuir-lhe alguma intempestividade em relação à maneira como funciona.
Pedro Nuno Santos sobre isso também já falou e disse que ia seguir as orientações da comissão independente. Ele tem procurado resolver o tema antes de começar a campanha dizendo que o que ele vai fazer é aquilo que, entretanto, começou a ser iniciado por pelo Governo de António Costa.
Então, não há temas tóxicos em que Pedro Nuno Santos esteja mais ou menos inibido de falar e de ser fragilizado pelas oposições?
A vantagem das campanhas eleitorais, do ponto de vista até dos jornalistas, é que a gente não sabe o que é que vai acontecer nelas. A imaginação dos vários partidos da oposição vai ajudar a que apareçam outras armadilhas, outras peças de comunicação que perturbem a campanha de Pedro Nuno Santos.
Há outra questão que tem a ver com as promessas eleitorais, tem sido usada pelo nomeadamente pelo PSD, o principal partido da oposição ao PS, cujo líder é o único outro candidato a primeiro-ministro, Luís Montenegro. Ao contrário do que muitas vezes é referido, os eleitores não confiam nas promessas dos políticos e não votam em função disso. E, portanto, desse ponto de vista, não me parece que, se Pedro Nuno Santos for relativamente reservado, recuado em relação às promessas eleitorais , seja uma coisa muito importante em termos de decisão dos eleitores.
Vamos a um exemplo prático. Esta promessa de Pedro Nuno de recuperação integral do tempo de serviço dos professores, ainda sem ter definido números para essa recuperação. Poderá ser futuramente penalizado se não conseguir cumprir esta promessa?
Todo este tipo de promessas são cumpridas num plano de uma legislatura, seja o que for que seja proposto seja por quem seja, nenhuma das medidas propostas das promessas feitas é para ser concretizada no dia a seguir às eleições. É, normalmente, para ser concretizada ao longo de um percurso, demora quatro anos.
Pedro Nuno Santos, se quiser ganhar a confiança dos eleitores, não vai entrar na mercearia das medidas e o que ele tem que dizer é um compromisso global. António Costa pegou nos problemas que eram trazidos à sociedade portuguesa pelas medidas introduzidas pela "troika" no Governo de Passos Coelho e tem procurado desmontar os aspetos negativos dessas disposições.
O que cumpre agora a Pedro Nuno Santos é continuar esse processo e, se puder fazer esse compromisso, garantir que num plano de uma sessão legislativa vai acabar com todos esses problemas. E isso significa, naturalmente, um tratamento diferente em relação às reivindicações não só dos professores, mas de todas as outras classes profissionais, nomeadamente funcionários públicos que ficaram para trás por causa da intervenção da Troika.
Quanto menos prometer e quanto menos se comprometer, melhor para Pedro Nuno Santos?
Quando um político promete que vai baixar impostos o que os eleitores concluem é que ele é um mentiroso. Não há ninguém que acredite que um político vai baixar impostos. As pessoas votam nos políticos por outras razões que não por causa das promessas eleitorais. Votam porque querem mudar ou não querem ou porque querem estabilidade ou porque querem um primeiro-ministro que já conheçam ou porque querem apostar num primeiro-ministro novo. Nada tem a ver com com promessas.
Aquilo que o Pedro Nuno Santos terá que fazer é o de ganhar a confiança dos eleitores. Ele sucede a António Costa, que é o político português da atualidade que tem o maior capital de promessas da parte dos eleitores, foi isso que lhe deu a maioria absoluta nas últimas eleições.
Pedro Nuno Santos terá que conseguir gerir do ponto de vista comunicacional o legado que António Costa deixa, introduzindo aquilo que era mais negativo no Governo que é uma falta de dinâmica, uma inércia, uma falta de atitude combativa que o Pedro Nuno Santos, aparentemente, tem.
Pedir a maioria absoluta é uma armadilha que Pedro Nuno Santos deve evitar falar?
É uma situação que não é óbvia. O que aconteceu na campanha de José Sócrates foi que, na altura, as sondagens indicavam que havia um crescendo de adesão à proposta do PS e, depois de anos de governos meio falhados, fazia sentido apresentar uma proposta de estabilidade de maioria absoluta. No caso António Costa foi considerado que isso não fazia sentido, embora o resultado produzido tenha sido idêntico.
No caso de Pedro Nuno Santos ele não tem esse problema, porque neste momento ninguém pensa que será possível a nenhum partido ter maioria absoluta. Há uma certa balcanização da nossa vida política. E os eleitores estão mais dispersos.
Nas sondagens que são conhecidas, mais de metade das pessoas contactadas não quiseram responder à sondagem, são aquilo a que podemos chamar os falsos indecisos. Essas pessoas, se forem chamadas a votar e se se dispuserem a ir votar no dia 10 de março, só nos últimos dias vamos conseguir perceber o sentido de voto de grande número de eleitores.
Sem conhecer o comportamento dos eleitores é um bocadinho tonto estar a falar se é maioria absoluta ou se não é maioria absoluta. António Costa acabou por falar na maioria absoluta porque as pessoas iam insistindo no tema do modelo de governação. Com Pedro Nuno Santos isso nem sequer se coloca. O tema está tão fora da agenda que mesmo os jornalistas vão ter que se entreter com outros temas. Por exemplo, se o PSD vai fazer coligação com o Chega ou não. Há outros temas que dominam a agenda mediática e que são mais pressionantes do que este.