António Monteiro, embaixador e antigo ministro dos Negócios Estrangeiros, entende que a Turquia pode ser decisiva para a paz na Ucrânia.
Em declarações à Renascença, na véspera de mais uma ronda negocial entre as delegações da Rússia e da Ucrânia, o diplomata considera positivo o envolvimento turco nas conversações, também pela forma como podem condicionar a ação russa no Mar Negro.
"Com a Rússia há uma oposição tradicional, até na maneira como ambos os países encaram o domínio do Mar Negro, e a Turquia tem vantagens que vêm de acordos históricos e da supervisão que faz em relação à passagem dos estreitos. A Rússia, aí, também com grande saída para o mar quente, porque senão fica apenas cingida ao Báltico. Por isso, a Turquia é uma peça chave neste equilíbrio entre potências", sustenta António Monteiro.
Terreno mais credível que o regime
O antigo ministro dos Negócios Estrangeiros avisa que, embora a Turquia goze de uma certa credibilidade por ser membro da NATO, "não se pode esperar que seja o mediador ideal".
"Pode pôr na mesa alguns argumentos que levem a Rússia a refletir e recuar. O local poderá gerar entendimentos, mas os mediadores têm de ser os próprios ucranianos e os russos", explica.
António Monteiro considera que a possibilidade de reforço de diálogo entre a Rússia e a Ucrânia "pode ser um passo positivo". Os ucranianos parecem ter "sincera vontade" de chegar a um acordo, no entanto, o diplomata mantém "sérias reservas" quanto às intenções do governo liderado por Vladimir Putin.
"A Rússia está habituada, neste tipo de situações, a ser manipuladora, a usá-las de um modo dilatório, de maneira a poder obter outras vantagens, nomeadamente no terreno militar. Por isso, temos de ser cautelosos. Ao mesmo tempo, o lado ucraniano tem dado passos muito concretos para que o sinal da paz seja possível", assinala.
Negociações por um meio termo
À Ucrânia, à falta de outros progressos, resta continuar "a resistência heroica que tem tido e a atuação política notável". O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, "tem pedido continuamente para que haja negociações" e já aceitou ceder em certas questões, como Donbass.
Para a Rússia, salvar a face depois desta "ofensiva militar desastrosa" significa "que a questão da Crimeia seja resolvida a favor do que pretende e esta abertura para que no resto da Ucrânia se possam encontrar estatutos que sejam sucedâneos dos acordos de Minsk".
"As concessões que a Ucrânia está a fazer são um aliciante para que a Rússia venha para a mesa de negociações e não fique apenas presa à necessidade de compensar o deasastre que tem sido esta ofensiva militar", explica o antigo ministro dos Negócios Estrangeiros.
O presidente turco anunciou, esta segunda-feira, que vai encontrar-se com as delegações russa e ucraniana ainda antes do encontro.