Recebido num auditório embalado durante horas com músicas natalícias, Rui Rio abriu o 39.º Congresso Nacional, em Santa Maria da Feira, a falar, mais uma vez, para os militantes – e distante de qualquer registo festivo. “O PSD não é o seu presidente, nem, tão pouco, os seus dirigentes. O PSD são as suas bases, que, de forma livre e desinteressada”, disse.
Na senda das vitórias recentes do partido, como a conquista da câmara de Lisboa - "êxitos dos quais muito poucos acreditavam" -, o líder do PSD garantiu também que, com "o incentivo e lealdade de todos", conseguirá derrotar António Costa nas eleições legislativas.
Segundo Rio, ser-se social-democrata em 2022, não é o mesmo que o ter sido há 50 anos. Por outras palavras: Rio procura, conforme dita o mote do congresso, “Portugal ao Centro”.
“Há momentos em que a social-democracia tem de ter respostas de perfil mais à direita, e outros em que o faz com uma postura mais à esquerda. E é assim que tem de ser, precisamente porque nos colocamos ao centro e, por isso mesmo, temos de estar sempre disponíveis para corrigir os excessos, sejam eles de direita ou de esquerda”, afirmou.
De forma enviesada, o líder do PSD deixou também um breve recado para a Iniciativa Liberal, partido do qual poderá estar dependente para formar uma maioria no pós-legislativas. “Não somos liberais ao jeito do laissez faire, laissez passer, que minimiza ou até despreza o Estado, mas somos pela total e completa liberdade individual, quando ela não é limitadora dos direitos de todos e de cada um”, atirou.
Bandeiras à vista: descentralização e regionalização
O programa que o PSD irá levar às legislativas ainda não é conhecido, mas Rio, no discurso de abertura, deixou já algumas pistas. O caso da “descentralização e a desconcentração da administração pública”.
“O recente chumbo da passagem do Tribunal Constitucional e do Supremo Tribunal Administrativo para Coimbra, sendo emblemático e próprio de um País mais justo e mais desenvolvido, não nos deixa infelizmente alimentar hoje grandes expectativas relativamente ao Partido Socialista, que, através do seu voto, reprovou essa nossa corajosa iniciativa”, lembrou.
Para Rio, ao transferir a gestão de uma parte significativa do Orçamento do Estado para as autarquias locais ou regionais, “o Estado conseguirá, por certo, fazer mais e melhor com menos despesa pública”.
“Conseguirá, se tiver sentido da responsabilidade, fazer uma lei rigorosa, que possa assegurar ao País uma gestão das finanças públicas mais controlada e menos dependente de uma administração central despesista que conduziu Portugal para o miserável patamar dos Estados mais endividados do mundo”, lembrou.
Rio quer políticas de captação de investimento e de criação de postos de trabalho que “assegurem oportunidades aos jovens do interior”.
“Nas palavras e na propaganda, o Partido Socialista é um encanto. Na ação, na coerência e na coragem, o PS é, quase sempre, uma desilusão”, atirou.
À baila regressaram também velhos temas: a revisão da Constituição da República e o sistema eleitoral. “Quando a degradação é visível, é um ato de irresponsabilidade não estar disponível para fazer uma rotura. Porque só com uma rotura, nós podemos rasgar novos horizontes. Porque só com uma rotura, nós conseguimos reconquistar a esperança”, sublinhou.
A par da descentralização, Rui Rio pretende reduzir o número de deputados; a discriminação positiva dos círculos eleitorais mais pequenos em detrimento das grandes concentrações urbanas; a determinação de um número máximo de mandatos para os deputados à semelhança do que já acontece com os autarcas; o reforço da isenção nas nomeações dos presidentes das entidades reguladoras, do Governador do Banco de Portugal e dos juízes do Tribunal Constitucional, ou o alargamento das legislaturas para cinco anos, “permitindo uma governação mais estruturada e menos influenciada pela conjuntura”.
“Imobilismo” da justiça
Rui Rio guardou uma parte significativa do seu discurso para criticar o estado da justiça portuguesa.
“É no setor da Justiça, que, em Portugal, mais se nota o imobilismo e a incapacidade para dar uma resposta satisfatória às necessidades da sociedade, seja na área cível, no crime ou, especialmente, na área administrativa e fiscal, onde um cidadão pode esperar mais de quinze anos por uma sentença”, atirou.
O líder do PSD relembrou o aumento dos salários dos magistrados em “choque frontal e injusto com o que não fez com os demais servidores públicos”.
“A justiça está melhor? Presta hoje um melhor serviço aos Portugueses? Estão julgados e terminados os casos que, há anos, se arrastam penosamente nos meandros do sistema e que tanto lesaram os portugueses? Como são disso exemplos paradigmáticos os casos do BES e da operação Marquês, ou, mais recentemente, as fundadas dúvidas sobre a capitalização pública do Novo Banco com base em sucessivos e estranhos pacotes de menos valias”, afirmou.
Boas “energias” para o líder
Uma das questões no ar e possivelmente definidoras do que virá a ser história do congresso do PSD é se as pessoas que estiveram na retaguarda de Paulo Rangel nas diretas irão apresentar listas ao Conselho Nacional, de forma manterem alguma influência e peso na estrutura do partido.
Este fim de semana, vão a votos vários órgãos internos do partido: Conselho Nacional, Comissão Política Nacional, Comissão Permanente Nacional, Conselho de Jurisdição Nacional e Comissão Nacional de Auditoria Financeira.
“Esta distrital [de Aveiro] não tem vacilado. Tem estado ao lado da direção nacional desde o início”, fez questão de frisar Salvador Malheiro, um dos homens de Rio desde o primeiro momento, na abertura do congresso.
Malheiro pediu também aos presentes para dar “energia” ao Rio, líder como “legitimidade mais do que reforçada” após três eleições diretas.