Em cima das secretárias de três procuradores que representam o Ministério Público (MP) no Tribunal Constitucional estão mais de 17.500 declarações de rendimentos e património. Nos últimos cinco anos, estes procuradores conseguiram analisar apenas 1.700 destas declarações exigidas aos políticos, titulares de cargos no Estado ou em empresas públicas.
Os dados foram revelados à Renascença por José Santos Pais, procurador-geral-adjunto do Tribunal Constitucional.
Apesar da diferença entre o número de declarações analisadas e as que estão por analisar, “o grau de intervenção em cada ano vai aumentando progressivamente”, garante.
Os três procuradores do MP já analisaram este ano 557 declarações de rendimentos e património, mais 282 do que em 2015. Estes procuradores não se dedicam a tempo inteiro a verificar estas declarações que são exigidas aos titulares de cargos públicos.
“Há um universo que vai sendo sucessivamente aumentado. A ideia é, tanto quanto possível, intervir relativamente àqueles titulares que são potencialmente considerados em maior risco – os titulares de cargos políticos mais expostos, membros do Governo, deputados da Assembleia da República, assembleias regionais, autárquicas”, explica.
Santos Pais reconhece que, perante a quantidade de declarações por analisar, os processos podem demorar “alguns anos” e, em alguns casos, quando esse escrutínio acontecer, “haverá alguns” titulares de cargos públicos que não já não estarão nas funções que os obrigaram a entregar a declaração.
Mais competências, as mesmas mãos
O procurador-geral-adjunto do Tribunal Constitucional lamenta que o legislador tenha dado nos últimos anos mais competências a este núcleo de magistrados, sem que estes tenham visto o grupo de trabalho alargado para poder fiscalizar mais.
José Santos Pais considera que é preciso uma legislação mais clara que defina bem as competências de fiscalização (que, diz, não cabem apenas ao Ministério Público), além do reforço de pessoal.
"Desde logo, em matéria legislativa há uns aperfeiçoamentos que poderão ser introduzidos e que garantirão uma melhor interligação entre todas as entidades de fiscalização e de repressão", diz.
"A lei provavelmente tem algumas lacunas legislativas que não deixam claramente definidas as funções de todas as entidades que poderão intervir neste processo".
Esta segunda-feira, numa conferência sobre corrupção e prevenção deste crime, organizada pela Procuradoria-Geral da República, José Santos Pais apresentou os dados dos últimos cinco anos. "Em todo este período propusemos 21 acções de perda [de mandato], sete de demissão, 17 de inibição, três por crimes de falsas declarações, num total de 48 acções propostas”, elencou.
Como consequência desta actividade, houve “oito decisões de perda de mandato, uma demissão, cinco [decisões] de destituição judicial, 24 de inibição, 10 absolvições e duas não pronúncias, num total de 50 decisões judiciais proferidas”.
Normalidade no caso Caixa
Entre as 557 declarações analisadas este ano não estão ainda as dos gestores da Caixa Geral de Depósitos, que só agora começaram a chegar ao Tribunal Constitucional. O assunto ainda está a ser analisado pelo Ministério Público e vai merecer em breve uma nota dos procuradores.
Questionado sobre esta polémica, Santos Pais garante que não houve falta de acção do Ministério Público. Assegura que os prazos estão a ser cumpridos e que tanto os juízes do Tribunal Constitucional como o Ministério Público estão a fazer o que lhes compete.
Seis administradores da Caixa entregaram a declaração, dos quais quatro contestam o dever de entrega, mas outros seis não entregaram por considerarem que não o têm de fazer.