​“Descoordenação” na Protecção Civil afectou a resposta das outras entidades em Pedrógão
09-08-2017 - 21:17
 • Eunice Lourenço, Paula Varela, Ricardo Vieira e Elsa Araujo Rodrigues

Ministra apontou falhas no posto de comando, mas Protecção Civil diz que houve resposta adequada a uma situação excepcional. Maioria dos mortos decorreram de situações para as quais nem sequer houve alerta.

Veja também:


A ministra da Administração Interna assumiu que houve “descoordenação” no posto de comando do incêndio de Pedrogão Grande. E das palavras de Constança Urbano de Sousa, na conferência de imprensa desta quarta-feira, assim como da leitura dos vários relatórios entretanto divulgados, resulta um quadro de descoordenação e de falta de informação e de meios que afectou a resposta de todas as outras entidades envolvidas no combate ao incêndio de Pedrogão Grande e no socorro às populações.

Constança Urbano de Sousa disse que ainda espera pelo relatório da Direcção Nacional de Auditoria e Fiscalização da Protecção Civil para perceber que se há matéria para abrir processos disciplinares.

A descoordenação chegou ao ponto de a GNR não ter sido avisada da mudança de localização do posto de comando, detalha o relatório final da Guarda Nacional Republicana, que também não encontrou provas de que militares tenha indicado a estrada nacional 236-1, a "estrada da morte", como alternativa ao IC8.

O período mais crítico, e que corresponde à agudização da situação e à ocorrência da maioria das mortes, foi entre o fim da tarde e as 22h00 do dia 17 de Junho, período esse em que a liderança das operações foi assumida pelo segundo comandante operacional distrital de Leiria (Codis), Mário Cerol.

No entanto, o relatório da Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC) não assume essa descoordenação, apresentando antes considerações finais que apontam para uma “resposta adequada” face a uma “ocorrência absolutamente excepcional”. E considerando que a maioria das mortes decorreu de situações para as quais nem sequer houve alerta.

Falta de meios e de comunicações

“Não há meios disponíveis para enviar ao local” e “não houve possibilidade dos meios de socorro enviados chegarem de imediato ao local devido à intensidade de chamas”, são duas frases várias vezes repetidas no relatório ANPC que é, no seu corpo, a fita do tempo dos acontecimentos desde as 14h43 de dia 17 de Junho, quando é recebido o alerta para incêndio em Escalos Fundeiros/Pedrogão Grande.

Ao longo das quase 40 páginas que relatam os pedidos de socorro e a resposta dada até às 7h00 de dia 18 de Junho, há também, no entanto, vários relatos de resposta que permitiram salvar vidas.

Nas considerações finais, a ANPC considera que as medidas de antecipação desde o dia 15 de Junho até ao fim da ocorrência “foram sempre ajustadas e adaptadas quer às informações meteorológicas disponibilizadas pelo instituto Português do mar e da Atmosfera, quer à evolução da situação operacional.

O relatório, assinado pelo presidente da ANPC, Joaquim leitão, lembra que houve uma simultaneidade de incêndios florestais na mesma zona, que obrigou a “uma expressiva dispersão de meios” e considera que “o incêndio florestal de Pedrogão assume-se como uma ocorrência absolutamente excepcional, com um comportamento imprevisível”.

“Perante a constatação da absoluta excepcionalidade desta ocorrência foram garantidos a todo o momento os adequados reforços em diferentes vertes”, lê-se ainda no relatório, que aponta as falhas de comunicação como factor que dificultou a resposta. Na conferência de imprensa desta quarta-feira, a ministra Constança Urbano de Sousa manifestou a intenção de penalizar a rede de emergência SIRESP pelas falhas de comunicação, confirmadas por um relatório do Instituto de Telecomunicações.

“As dificuldades registadas nas várias redes de comunicações foram um obstáculo ao normal desenvolvimento das estruturas de comando e controlo, afectando de forma directa a capacidade de mobilização e resposta”, considera a ANPC, apontando assim também para as já conhecidas falhas no sistema de informações de emergência (SIRESP). E terá sido por falta de informação que ocorreram as mortes.

“A maioria das vítimas mortais decorrem de situações para as quais nunca chegou a haver qualquer alerta, pelo que foi impossível o sue conhecimento e consequente resposta”, lê-se nas considerações finais desta Autoridade, que conclui: “Não obstante todas as dificuldades e constrangimentos registados neste teatro de operações, verifica-se que foi ainda assim possível garantir assistência e o socorro à grande maioria dos alertas que foram conhecidos”.