O comissário europeu para Gestão de Crises exorta Israel a abrir mais vias terrestres para caravanas e camiões entregarem ajuda humanitária à Faixa de Gaza, onde chegam hoje "quantidades extremamente insuficientes" e "há risco" de fome entre a população.
"Relativamente às rotas marítimas e aéreas para entregar ajuda humanitária a Gaza, vou ser muito claro: nós e outros só estamos a fazer isso porque Israel não está a abrir mais rotas terrestres. Em termos financeiros, em termos de velocidade e de inspeção e logística, o acesso terrestre a Gaza é o melhor, o mais fácil, o mais rápido, mas existem limitações e restrições e, por isso, apelamos a Israel para que abra mais vias terrestres", diz Janez Lenarcic, em entrevista à agência Lusa e a outros meios europeus em Bruxelas.
Um dia depois de um primeiro navio de ajuda humanitária ter começado a descarregar na Faixa de Gaza, Lenarcic admite que "os lançamentos aéreos ou o transporte marítimo não podem substituir o acesso terrestre".
"A quantidade de ajuda humanitária que está a entrar em Gaza é extremamente insuficiente [porque] o número de pontos de entrada não é suficiente. A situação na Faixa de Gaza é dramática e catastrófica e os bombardeamentos contínuos da Faixa de Gaza são, evidentemente, motivo de grande preocupação", vinca o responsável.
Antecipando o Fórum Humanitário Europeu, que decorre em Bruxelas na segunda-feira e terça-feira para arrecadar doações para ajuda humanitária, o comissário reconhece que "há o risco de fome" em Gaza.
"Temos indicações muito fortes e credíveis de que já existem casos de fome na Faixa de Gaza. [...] É claro que isto exige uma ação urgente e o que é necessário é o aumento da ajuda humanitária e a sua distribuição por toda a Faixa de Gaza e, para o conseguir, a forma mais fácil e mais eficaz de o fazer é Israel abrir novas fronteiras e pontos de passagem terrestres", assinala.
Segundo Janez Lenarcic, as hostilidades devem parar por "tempo suficiente" para permitir que as organizações façam "uma distribuição adequada" de alimentos e mantimentos à população.
"Isso é difícil de fazer quando se é confrontado com bombas e foguetes a cair do céu e granadas de tanques a voar por todo o lado. A comunidade internacional está a tentar de todas as formas possíveis, [...] mas a verdade é que nada disto pode substituir as passagens terrestres", reforça o responsável.
O comissário europeu diz ainda ter visto com "bastante esperança" a chegada da primeira caravana do Programa Alimentar Mundial ao norte de Gaza, esperando "que esta rota seja alargada".
Já após acusações sob investigação de que funcionários da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Próximo Oriente (UNRWA) estiveram envolvidos no ataque terrorista de outubro passado, pelo grupo islamita Hamas, Lenarcic salienta que o organismo "reagiu muito positivamente", razão pela qual Bruxelas vai continuar a financiá-lo para que possam desempenhar o seu "papel fundamental", com "infraestruturas, armazéns e abrigos inigualáveis e capacidades logísticas, para ajuda humanitária a Gaza.
De acordo com as organizações humanitárias no terreno, é quase impossível entregar ajuda em grande parte do território devido às restrições israelitas, às hostilidades em curso e ao colapso da lei e da ordem, depois de a força policial dirigida pelo Hamas ter desaparecido em grande parte das ruas.
Não está ainda claro quão eficazes serão as entregas marítimas (nomeadamente o primeiro navio que chegou, com cerca de 200 toneladas de alimentos) na resposta à catástrofe humanitária, uma vez que ainda haverá dificuldades na entrega da ajuda.
A guerra já matou mais de 31.500 palestinianos -- dos quais um terço são crianças -- e expulsou das suas casas mais de 80% dos 2,3 milhões de habitantes de Gaza.
Grande parte da população sofre de fome e pelo menos 27 pessoas, na sua maioria crianças, morreram só no norte do enclave devido a subnutrição aguda, de acordo com o Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo Hamas, no poder no enclave desde 2007.
Israel declarou guerra ao Hamas depois de ter sofrido um ataque sem precedentes em outubro passado, que causou cerca de 1.200 mortos e duas centenas de reféns, de acordo com as autoridades israelitas.