Dissolução do Parlamento costuma gerar estabilidade e maioria nas urnas
09-11-2023 - 23:08
 • Miguel Marques Ribeiro

É a nona vez que um Presidente interrompe o mandato dos deputados. Chamados a votar depois da dissolução do Parlamento, portugueses costumam optar por concentrar os seus votos numa solução maioritária.

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Entre as hipóteses de que dispunha Marcelo Rebelo de Sousa para desatar o nó da crise política desencadeada pela demissão do primeiro-ministro, António Costa, o Presidente da República acabou por tomar a opção mais previsível: dissolveu o Parlamento e convocou eleições para dia 10 de março de 2024.

Trata-se da nona vez que um Presidente da República interrompe a legislatura. Nenhum dos cinco chefes de Estado que a democracia portuguesa já conheceu escapou a ter que se dirigir ao país para anunciar a convocação de eleições antecipadas.

O general Ramalho Eanes, primeiro Presidente eleito na história da democracia, foi aquele que mais teve que recorrer a esse expediente constitucional: foi responsável por três dissoluções.

As duas primeiras (em 1979 e 1982) foram antecedidas de governos de iniciativa presidencial ou da formação de novos executivos a partir do quadro Parlamentar já existente.

Só à terceira, em 1985, Eanes partiu de imediato para a interrupção do mandato dos deputados, quando confrontando com a demissão de Mário Soares do cargo de primeiro-ministro.

Uma lição que parece ter deixado lastro na nossa História democrática, pois, como afirmou Marcelo no seu discurso desta quinta-feira, não dissolver pode traduzir-se num “mero adiamento”, “para pior momento com situação mais crítica e desfecho mais imprevisível”.

Assim, daí para a frente, só por uma vez a demissão do Governo não redundou na exoneração dos deputados.

Sampaio não dissolveu e depois usou a "bomba atómica"

Foi com Jorge Sampaio e aconteceu em 2004. Na altura, uma coligação de direita dominava o Parlamento. Durão Barroso pediu a exoneração de primeiro-ministro para poder aceitar o cargo de presidente da Comissão Europeia.

Sucedeu-lhe Santana Lopes, sem eleições antecipadas, mas a gestão do hoje autarca da Figueira da Foz durou apenas cinco meses.

Em dezembro de 2004, o Presidente da República mesmo avançou para dissolução do Parlamento, apesar de existir uma maioria absoluta no Parlamento.

O momento ficou conhecido como o uso da “bomba atómica” constitucional.

Interromper o mandato dos deputados quando o Governo cai parece ter ainda outra vantagem. Das oito dissoluções anteriores, sete resultaram em soluções de estabilidade política.

A Agência Lusa fez as contas e em quatro situações deram origem a governos de maioria. Em 1979, com a eleição do Governo da AD. Em 1987, com a primeira maioria absoluta de Cavaco Silva, em 1987. Em 2005 e 2021, com as vitórias de, respetivamente, José Sócrates e António Costa, após o fim da "Geringonça" que garantiu ao Governo socialista o apoio parlamentar do PCP, Bloco de Esquerda e Verdes.

Noutras três circunstâncias, geraram-se governos de coligação: em 1983, com uma coligação do Bloco Central e em 2002 e 2011, com coligações entre o PSD e o CDS/PP.

Com as eleições marcadas para 10 de março do próximo, os portugueses vão a votos com uma certeza: a solução que sair do ato eleitoral nunca poderá ser mais estável, ao nível Parlamentar, do que aquela que existia até esta quinta-feira, sustentada na maioria absoluta do Partido Socialista.