Às 20h00 de Madrid, a sede do PSOE estava gelada. Os resultados não sorriam aos socialistas, uma vez que as projeções colocavam a direita com boas chances de formar governo e acabar com o "sanchismo".
Não se via um único apoiante. Só havia jornalistas e funcionários do partido que procuravam responder ao stress acessório de uma noite eleitoral. Também não havia sinais de Pedro Sánchez, que só apareceu na sede quando as sondagens já eram mais sorridentes para a esquerda.
Quando começaram a chegar militantes, estavam nervosos e não descolavam os olhos dos ecrãs que tinham na sala: a TVE fazia a contagem dos votos passo a passo. No meio do processo, o silêncio era sepulcral e as unhas dos socialistas é que pagavam, mas havia quem já tivesse esperança na "remontada" de que Sánchez tanto falou na última semana da campanha.
"Eu estou a ver esta noite com muito entusiasmo, é uma noite especial para todos os espanhóis", explicava à Renascença uma das militantes presentes. Na altura, ainda só estavam contados 60% dos votos, mas havia alguns sinais de que a soma de todos os partidos à esquerda poderiam suplantar o PP e o Vox juntos. "Todos estamos a ficar surpreendidos", admitia Alicia Costas, enquanto olhava para a televisão.
O burburinho ia crescendo no quartel-general do PSOE. Havia uma perceção tímida de que o jogo poderia estar a virar e que a solução de 2019 poderia ver a ser repetida em 2023: uma espécie de geringonça espanhola.
Também ensimesmado a olhar para a contagem dos votos estava Martin Martínez, outro socialista presente na sede que não tinha medo de demonstrar confiança, mesmo que os números não assegurassem nada na altura. "A noite ainda não acabou, mas está a correr bem", dizia com uma tranquilidade inquietante.
"Acho mesmo que Pedro Sánchez vai voltar a liderar o governo", atirava com convicção. E se o PP for o partido mais votado, deve o PSOE viabilizar o governo? "O senhor Feijóo nunca fez isso, essa proposta é um gesto de cinismo da parte dele", vociferava.
Chegada de Sánchez: êxtase
O momento em que a contagem dos votos começou a indicar que a esquerda tinha hipóteses e que o PP não tinha o poder garantido, coincidiu com o momento em que Pedro Sánchez chegou à sede do PSOE. "Pedro presidente, Pedro presidente, Pedro presidente!", gritavam já centenas de militantes que começavam a inundar os passeios da Calle de Ferraz e a pintá-los de vermelho com bandeiras.
A chegada do líder socialista já demonstrava um entusiasmo que se proliferava facilmente entre os apoiantes. Mas em menos de 10 minutos, quem chegasse à porta da sede diria que o PSOE tinha ganho com maioria absoluta. Não era isso, tinham é cumprido o que pediu Pedro Sánchez: "uma remontada!".
Contra a esmagadora maioria das sondagens, o PSOE chegava a um ponto em que poderia destronar a direita caso conseguisse fazer uma coligação com vários partidos, além do Sumar. No ar respirava-se alegria. Cantavam, dançavam e gritavam pelo atual presidente do governo espanhol.
As razões para festejar podem ter apanhado até o partido de surpresa: na rua não havia um palco para Pedro Sánchez discursar. Os funcionários socialistas deram ao pedal e em 20 minutos ergueram uma estrutura de metal que serviu para o curto discurso do líder do partido, onde - sem dizer o que vai fazer- garantiu apenas que o resultado era "o fracasso" do bloco que quer fazer retrocessos em Espanha.
"A esquerda às vezes não chega a votar. Mas Espanha levantou-se e saiu à rua", explica Noué à Renascença. Já estava no final da festa e apontava esta como a razão para a reviravolta.
Feijóo deve procurar "fazer os pactos que forem necessários"
É um cenário pouco usual, mas na noite deste domingo houve festejos nas duas sedes rivais. No PSOE festejava-se a potencial maioria de esquerda, no PP celebrava-se a conquista efetiva do primeiro lugar. Os populares começaram a juntar-se bem antes dos socialistas. Às 21h da noite já a praça em frente à sede do PP estava a compor-se sobretudo de jovens que foram puxar por um partido afastado do poder há cinco anos.
Mas o resultado que deixou o PSOE para trás pode não ser suficiente para formar governo já que o Vox foi depenado, perdeu 19 deputados e complicou as contas dos partidos à direita do hemiciclo espanhol. No final da noite, o ambiente era mais eletrizante junto à sede do PSOE do que junto à sede do PP.
Os populares tiveram uma vitória agridoce que pode acabar por replicar um cenário como o que aconteceu em 2015 em Portugal, quando António Costa formou a geringonça sendo o segundo partido mais votado. "Há cinco anos que estão nisto!", dizia irritado um militante do PP ao amigo que levava uma bandeira espanhola à cintura.
A matemática parlamentar não faz, no entanto, com que os populares atirem a toalha ao chão. Sentem-se no direito de governar: "Tenho medo de voltar a Sánchez. O PP tem de fazer as coligações para acabar com isto", defende Carlota Pérez.
E não há que ter medo de uma mega-coligação de esquerda: "Estou positiva, espero que consigamos fazer os pactos que forem necessários", suspira esta militante popular.