A violência doméstica, sobretudo sobre mulheres e crianças, mas também idosos, é uma preocupação crescente para a PSP de Benfica e para a Junta. A Esquadra local tem duas equipas, cada uma com dois elementos, especialmente destacadas para o policiamento de proximidade, na prevenção da violência doméstica: uma atua no Bairro da Boavista; a outra no resto da área abrangida pela freguesia.
À Renascença, o agente João Jardim, que integra há três anos uma das equipas sublinha o facto de se registarem cada vez mais casos, nomeadamente de violência no namoro. Com jovens cada vez mais novos. O lado positivo “por assim dizer”, é que as vítimas estão mais alerta, denunciam mais os abusos e pedem ajuda mais cedo.
Paulo Sousa, outro dos agentes nestas equipas de policiamento de proximidade, considera que as ações de sensibilização, as palestras, o acompanhamento que é feito às vítimas, as reavaliações de riscos, faz com que as pessoas tenham menos receio de reportar a violência – física e psicológica – a que estão sujeitas. “Quer dizer que as pessoas confiam nas instituições e nas forças de segurança”, diz. Neste momento as equipas da PSP de Benfica acompanham cerca de quatro dezenas de pessoas.
Mas, refere o agente João Jardim, pelo menos “nos últimos três anos, o número de casos anual reportados ao Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) rondou sempre a centena, para mais. Mais de 90% envolve mulheres, sobretudo com filhos”.
Baixo, médio e elevado, são os níveis de risco a ter em conta na violência doméstica. Segundo os elementos da PSP de Benfica, a maioria dos casos ali referenciados são de risco médio e até agora, “felizmente”, sem fim trágico, ou seja, que tenha resultado na morte da vítima. Por outro lado, há suspeitos que acabaram por ficar em prisão preventiva.
Na hora de aflição, também batem à porta da Junta de Freguesia
Carla Rothes, vogal da Junta de Freguesia de Benfica para os Direitos Sociais, diz que há mulheres que procuram apoio em situações “muito aflitivas”. Além de encaminharem os casos para as autoridades, tentam arranjar soluções para as vítimas. “Vivem normalmente em situação de dependência, saem das suas casas com receio de serem atacadas e depois, têm medo de voltar porque o agressor continua lá”, descreve.
Dos vários casos que tratou, Carla Rothes lembra um ocorrido no verão: uma mulher que ficou literalmente fora de casa, com um filho de quatro anos. Era completamente dependente economicamente do agressor, imigrante que não dominava a língua portuguesa e sujeita a um jogo psicológico que se prolongava há anos.
“No próprio dia tivemos de arranjar casa, alimentação, forma de subsistência para esta família. Em articulação com a PSP e a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (SCML) instalou-se uma rede, arranjaram-se soluções e agora a família já está a fazer o seu percurso de forma autónoma”. Quanto ao agressor, optou por sair do país, o que acabou por ser um alívio para todos, admite a autarca.
Mas nem todos os casos correm tão bem, em que os agressores acabam por descobrir onde estão as vítimas. Isto acontece sobretudo quando as mães resistem a sair da área de residência para que os filhos não percam a escola e os amigos. Encontrar um equilíbrio entre estar em segurança e estar num sítio conhecido é uma gestão complexa e difícil. Só se consegue com a intervenção das autoridades, diz Carla Rothes. Normalmente, a Junta arranja outra habitação fora da freguesia, mas próxima e com reforço policial, no acompanhamento às vítimas e às crianças, na escola. Em simultâneo, trabalham com as vítimas adultas.
No entanto, sublinha que a ajuda depende de uma queixa formal, o que nem sempre é fácil. “Só assim poderemos despoletar os mecanismos que permitem que estejam cá fora com segurança. Mas há muitas dependências, económicas e emocionais; com menores à mistura, a ajuda necessária é maior”, explica.
“NO!” à violência doméstica em marcha
Para tentar travar a evolução da violência doméstica na freguesia de Benfica, apresentou o projeto NO!, no âmbito da EEA Grants, um Mecanismo Financeiro Plurianual, através do qual a Islândia, o Liechtenstein e a Noruega apoiam financeiramente os Estados membros da União Europeia com maiores desvios da média europeia do PIB per capita, onde se inclui Portugal.
Para este projeto, a Junta de de Freguesia estabeleceu parceria com cinco entidades, quatro nacionais e uma internacional. Os parceiros nacionais são a PSP- 3ª Divisão Policial de Lisboa, Esquadra de Benfica, o Agrupamento de Escolas de Benfica, o Agrupamento de Escolas Quinta de Marrocos e a Associação Dignidade para os Direitos das Mulheres e das Crianças. A associação dinamarquesa Likestillingssenteret-Hamar é o parceiro internacional.
O Projeto NO! é um projeto do Programa Conciliação e Igualdade de Género, operado pela CIG. É um projeto do concurso Small Grant Scheme #2– Projetos de prevenção e estratégias de apoio a crianças e jovens na área da violência contra as mulheres e a violência doméstica, inserido no Programa Conciliação e Igualdade de Género. O objetivo é o desenvolvimento de programas de prevenção da violência doméstica e de género e, ainda, a formação de profissionais em matéria de prevenção da violência doméstica e de género.
Nos próximos dois anos, a entidade parceira da noruega vai dar formação aos técnicos do Projeto NO! para que possam atuar no terreno. Em troca, esperam exemplos de boas práticas, refere à Renascença a coordenadora do NO!, Ana Galamba.
Há grupos prioritários nesta formação para a prevenção da violência doméstica: professores e educadores de infância, auxiliares de ação educativa, agentes da PSP e crianças e jovens em contexto de vulnerabilidade social.
A autarca Carla Rothes frisa que na área da Junta de Freguesia há 11 mil alunos, desde a creche à Escola Superior de Comunicação Social. De forma adequada à idade, todos têm de ser sensibilizados para os riscos e para a necessidade de os denunciar, se necessário. Nomeadamente, em relação à violência no namoro.
Ana Galamba, por seu turno, espera que os futuros jornalistas também sejam sensíveis a esta temática e que tomem consciência do papel que podem ter para evitar esta situação, através dos seus trabalhos.
Além da formação, também será desenvolvido trabalho específico com as vítimas que são mulheres, em larga maioria. Mas há cada vez mais homens nessa situação. Por isso, o Projeto “NO” envolve o “empoderamento de mulheres e homens, numa perspetiva de igualdade de género”, refere a sua coordenadora.