O Ministério Público (MP) tem sido alvo de críticas e de receios de que as suspeitas que levantou não se venham a confirmar em tribunal. As críticas partem sobretudo de quem tem dificuldade em aceitar que um “golpe judiciário” possa derrubar um primeiro-ministro apoiado por uma maioria parlamentar democraticamente eleita. Os receios surgem entre quem não tem uma ideia exata do papel do MP.
Ora, o MP não é um tribunal. Como explicou em artigo no Público de sábado passado o Presidente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, Adão Carvalho, a lei processual penal obriga sempre à abertura de um inquérito perante notícia de um crime. “A instauração de um inquérito não comporta qualquer juízo do MP sobre a bondade dos indícios, ou seja, sobre se os mesmos são ou não bastantes para levar a alguém a julgamento – isso é o que resultará da prova a recolher nesse âmbito e que importará um juízo dessa natureza no final dessa fase processual, não no início”. É a fase da instrução, em cujo desfecho é decisivo o papel do juiz de instrução, como agora estamos a assistir.
Vimos muita gente, no início do processo judicial, a comentar indícios como se, numa fase preliminar, já fosse admissível formular conclusões. Se alguns advogados de arguidos o fizeram, tal não revela rigor mas compreende-se – aí trata-se de contrariar a má imagem pública que o facto de ter sido constituído arguido implica para o seu cliente. Já não é aceitável que outros, não envolvidos neste processo, ignorem a missão do MP e avancem com “palpites”, que frequentemente visam atacar a independência do MP.
Comentou o Presidente do Sindicato dos Magistrados do MP: “talvez muitos prefiram delinear uma estratégia anti-MP, em vez de implementar uma estratégia anti-corrupção”. É desta última estratégia que o país precisa, para ultrapassar o trauma que este caso implica – o trauma de um Estado minado pela corrupção.