Quando o apresentador da cerimónia dos Globos de Ouro, que decorreu no domingo à noite, fez uma brincadeira a sugerir que Oprah Winfrey deveria ser a próxima presidente dos Estados Unidos, a própria riu-se. Menos de uma hora mais tarde a apresentadora foi receber um prémio e fez um discurso que pôs o mundo a pensar que talvez a ideia não seja tão absurda, afinal.
Oprah não comentou sequer a ideia e do seu passado não há qualquer indício de que tenha interesse em candidatar-se a um cargo político, mas uma vez que a Casa Branca é ocupada agora por um homem cuja candidatura foi entendida como um “fait divers” durante muito tempo, já se percebeu que nada é impossível.
Nas redes sociais, e depois na imprensa generalista americana, começou-se rapidamente a questionar se a dinâmica entre Seth Meyers e Oprah não teria sido combinada e já há jornais de renome a escrever sobre o que esperar de uma administração Oprah.
Por um lado a apresentadora parece uma candidata muito improvável. As suas opiniões sobre questões estritamente políticas são desconhecidas e a única vez que apoiou um candidato à presidência foi em 2008, nas primárias do Partido Democrata. Calcula-se que o seu apoio a Obama possa ter rendido cerca de um milhão de votos ao homem que se tornaria o primeiro Presidente afro-americano da história dos Estados Unidos, ajudando-o a derrotar Hillary Clinton na luta pela nomeação. Mais recentemente Oprah apoiou Lavern Chatman, uma candidata afro-americana ao congresso que já na altura estava envolvida num escândalo financeiro.
De resto, Oprah é uma personalidade quase avessa ao campo político. Disse publicamente que não se sente uma “pessoa política” e que raramente entrevista políticos. Na altura em que apoiou Obama chegou-se a falar no seu nome para ocupar o seu lugar no senado, mas ela recusou dizendo que não estava minimamente interessada, mas ao mesmo tempo admitindo que se conseguia imaginar no Senado. Contudo, em Junho afirmou noutra entrevista que jamais se candidataria a um cargo público e que isso era algo “bastante definitivo”.
Por outro lado, a ausência de um passado de compromissos políticos poderá funcionar a favor de Oprah Winfrey, que é talvez uma das personalidades televisivas mais populares dos Estados Unidos. Numa época em que aumentam as queixas sobre o clima partidário no país, uma personalidade menos divisiva poderia ser uma vantagem.
Acresce uma longa carreira ao serviço de causas sociais. Em 2004 Oprah tornou-se a primeira pessoa negra a entrar na lista dos 50 americanos mais generosos em causas filantrópicas.
Causas fracturantes
Se Oprah se candidatar de facto à Casa Branca um dos assuntos que certamente terá de enfrentar são as causas fracturantes, conhecidas nos Estados Unidos como as “culture wars”, que movem paixões e dividem a nação entre esquerda e direita, progressistas e conservadores.
São poucas as figuras públicas americanas, muito menos entre políticos, que não tenham posições assumidas e um historial de compromisso com causas como o aborto, os direitos dos homossexuais ou, em menor grau, a eutanásia.
Mas Oprah é uma dessas pessoas. Embora tenha reconhecido que aos 14 anos ficou em pânico quando soube que estava grávida e até tentou beber detergente na esperança de provocar um desmancho, Oprah não tem um historial de posições fortes sobre o tema do aborto e apenas lhe é apontada uma participação como oradora num almoço de um grupo favorável à liberalização do aborto nos Estados Unidos.
Oprah já deu voz em várias ocasiões a pessoas influentes na área da promoção dos chamados direitos homossexuais, e num dos seus programas, nos anos 90, defendeu-se de uma espectadora que a acusou de estar a promover a agenda homossexual ao mesmo tempo que se dizia cristã, afirmando que na sua opinião Deus não se interessa pela orientação sexual das pessoas.
Embora pareça claro que as suas opiniões tendem para o liberal nestes assuntos, talvez o mais importante seja que Oprah não é vista como uma pessoa profundamente comprometida com eles. Não lhe são conhecidas palavras de apoio nem donativos à Planned Parenthood, a principal organização promotora do aborto nos Estados Unidos, nem intervenções significativas em questões como o casamento homossexual ou outros assuntos divisivos que marcam a agenda política e social americana.
Em termos de crenças religiosas Oprah também apresenta poucas desvantagens, do ponto de vista político. As sondagens têm revelado diversas vezes que o eleitorado americano confia pouco em ateus e Oprah assume publicamente a sua crença, mas ao mesmo tempo as suas palavras sobre Deus e a religião tendem a ser muito vagas, quase panteístas, e por isso, pouco chocantes.
Cabe ao povo
Depois do discurso de domingo, quando as redes sociais entraram em acção, o "Los Angeles Times" perguntou ao seu namorado Stedman Graham se os rumores tinham fundamento e ele terá respondido que “isso cabe ao povo, ela avançaria, sem dúvida”.
O mesmo jornal perguntou a Oprah directamente o que ela achava e respondeu apenas que estava contente por ter conseguido fazer o discurso. Perante a insistência do jornalista foi evasiva.
Talvez a sua recusa de vir a ocupar cargos públicos não seja tão definitiva assim.