No dia em que o Governo vai aprovar o Programa de Estabilização Económica e Social (PEES) com o objetivo de ajudar empresas e famílias em dificuldades financeiras, o economista João Duque defende na Renascença que é importante o apoio da maioria dos partidos a esse plano de base.
“Acho fundamental para termos uma linha de orientação, a reorganização do tecido empresarial e da estrutura da economia portuguesa”, afirma o presidente do ISEG nesta quinta-feira.
O professor catedrático admite que ficou “um bocadinho surpreendido” por o primeiro-ministro “ir buscar uma pessoa” de fora (António Costa e Silva), “quando há tanta gente no Governo, que é o maior de há décadas”. Mas prefere comentar o estado da economia, defendendo a existência de “um plano de base para se discutir”.
Até porque “viver em cima da restauração e de baixo valor acrescentado por unidade de trabalho criado é um erro que se paga tarde ou em qualquer crise”.
Por isso, no seu entender, a atual conjuntura – de reação à crise financeira criada pela pandemia de Covid-19 – é “uma oportunidade extraordinária para modificar a estrutura da economia portuguesa”.
“Temos de dar estímulos fortes às empresas para se capitalizarem”, defende João Duque. Havia muitas empresas “a viver com o chamado pelo do próprio cão” – ou seja, “numa linha de grande dificuldade, que a qualquer sobressalto causa muitos problemas”.
As empresas precisam, por isso, “do mínimo de capitalização para lhes dar estabilidade”.
A “mentira” das moratórias
Na opinião de João Duque, a possibilidade de extensão do prazo de pagamento das dívidas à banca (moratórias), concedida a empresas e famílias e que agora se pondera alargar a 2021, vai trazer problemas à economia.
“Trata-se de escolher o momento em que nos vamos defrontar com o problema grave do incumprimento”, porque o que vivemos é uma “mentira sobre a qualidade dos empréstimos concedidos”, afirma.
Quando chegar “a data de vencimento destas moratórias, vamos verificar que muitas das empresas não vão ter capacidade de pagar”, tal como aquelas “pessoas que estão em situação muito periclitante em nível de emprego e aí vamos ter um problema”, avisa.
E o turismo?
Sendo o turismo uma peça chave da economia portuguesa, o presidente do ISEG estranha que ainda não tenham sido anunciados apoios para o setor e para o transporte aéreo em particular.
“É fundamental alimentar um ‘pipeline’ de turistas a chegarem que, por sua vez, possa ocupar a extensa capacidade que temos instalada na área da hotelaria”, afirma no programa As Três da Manhã.
João Duque chama ainda a atenção para o impacto que o aumento de novos casos na região de Lisboa e Vale do Tejo pode ter no turismo.
“Há uma coisa com que temos que contar: o receio das pessoas de se meter num avião para viajar, especialmente quando começamos a assistir em Portugal a algum aumento de novos casos que, apesar de estarem confinados numa área, que por acaso é uma das maiores áreas de atração turística, que é a zona de Lisboa”, sublinha.
O turismo é essencial para a economia portuguesa, que não pode, por outro lado e na opinião deste especialista, basear-se em salários baixos.
“Esta crise, parece-me, afetou muito mais pessoas e mais profundamente do que a anterior. Não houve tempo de pestanejar antes de se entrar numa situação de absoluta necessidade”, afirma João Duque, que diz ter tido conhecimento “de situações dramáticas, por as próprias instituições não terem capacidade de dar despacho a tanto pedido simultâneo”.
Por isso, defende, todas as medidas que venham e se destinem a evitar “uma situação de calamidade social” são bem-vindas, venham elas do Governo ou do PSD ou de ambos (e mais lados e partidos).