As famílias estão a deixar cada vez mais dinheiro nas farmácias. Os pagamentos diretos aumentaram 57% em 20 anos, para 1.419 milhões de euros em 2020, uma subida acompanhada pela despesa do Serviço Nacional de Saúde (SNS), segundo o estudo “Despesas de Saúde em farmácias comunitárias”.
Este trabalho, dos investigadores Eduardo Costa e Pedro Pita Barros, no âmbito do Observatório da Despesa em Saúde, concluiu que os pagamentos diretos das famílias portuguesas em produtos e serviços de saúde disponibilizados nas farmácias (que representam cerca de 25% dos pagamentos diretos das famílias em saúde) passou de 903 milhões de euros em 2000 para 1.419 milhões em 2020.
Os investigadores sublinham que esta despesa acompanhou o aumento da fatia assegurada pelo SNS, que passou de 1.068 milhões de euros (em 2000) para 1.543 milhões (em 2020), segundo este trabalho, realizado no âmbito da Iniciativa para a Equidade Social, uma parceria entre a Fundação "la Caixa", o BPI e a Nova SBE.
"Se no início do século as despesas de saúde em farmácia eram asseguradas em 46% pelo SNS e 39% pelas famílias portuguesas, 20 anos depois, o peso de ambas aproxima-se e o crescimento de 3% (para o SNS) é acompanhado pelo dobro do crescimento para as famílias portuguesas (6%)", revela o comunicado.
À Renascença, Pedro Pita Barros explica este efeito com "o aumento do consumo, claramente, e nos últimos anos há também novamente um efeito de aumento de preços, que está a criar esta pressão. Não houve propriamente uma diminuição muito grande das comparticipações do Estado".
Por outro lado, este aumento da despesa das famílias reflete também o peso "insignificante" dos seguros de saúde e subsistemas no pagamento de medicamentos em farmácias, que caiu de 16% em 2000 para apenas 5% em 2020 e evidenciam "uma potencial desproteção financeira crescente da população face a este tipo de despesa". Ainda assim, Pedro Pita Barros admite que "é difícil perceber como podiam ter um papel mais ativo, uma vez que os medicamentos já são cobertos pelo SNS".
É preciso reforçar a comparticipação
Com a crise financeira diminuiu de forma expressiva a comparticipação dos medicamentos do SNS: de um máximo de 71,9% registado em 2010 para 62,5% em 2014. Desde então, "a taxa média de comparticipação nunca regressou aos valores históricos registados antes da crise financeira".
Já o consumo de medicamentos aumentou 40%, o que pode estar relacionado com a evolução da carga de doença na população, mas também alterações nas terapêuticas de determinadas patologias ao longo do tempo.
Este aumento do consumo agravou os encargos com medicamentos em 37%. Em sentido inverso, a redução dos preços contribuiu para uma redução dos encargos em 16%. Logo, "a conjugação destes dois efeitos resultou num aumento dos encargos em 21%".
Os investigadores concluem que "o crescimento do consumo de medicamentos surge como o principal determinante do aumento da despesa com medicamentos - quer os encargos cobertos pelo SNS, quer os encargos dos utentes". No entanto, não é possível mexer com a terapêutica dos doentes, "não queremos que as pessoas deixem de ser tratadas".
As reduções de preços "são sempre possíveis, mas também não têm tido um crescimento desmesurado", defende o economista.
Para Pedro Pita Barros, é preciso dar "mais atenção em quanto é que o Estado comparticipa, como é que comparticipa, o que é que comparticipa e aumentar esse nível de proteção financeira".