A concentração marcada pela oposição venezuelana liderada por Juan Guaidó para uma praça na zona leste de Caracas, no sábado, não conseguiu encher a zona. Mas os que responderam ao apelo falam do medo que existe nas famílias.
Uma manhã quente em Caracas, com os grupos a procurarem as sombras. Presença de polícia muito discreta, apenas a regular o trânsito. As 't-shirts' brancas da “Operação Liberdade” dominam na paisagem.
"Hoje estamos perto de atingir a mudança na Venezuela", dizia o autoproclamado Presidente interino, Juan Guaidó, para a multidão que enchia a praça Alfredo Sadel, nas Mercedes, zona leste de Caracas.
Alguns populares explicavam à equipa da Lusa que a multidão não era tanta como a que deveria ser porque este é um fim de semana festivo, com preparativos para o dia da mãe (que se comemora no domingo). Outros diziam que as pessoas já estão exaustas, e muitos falam mais em medo. "Sim, as pessoas têm medo, já morreu muita gente nos protestos", contou Eudyl Silva.
"Quem exerce um direito não comete um delito", podia ler-se num cartaz enorme que um só indivíduo transporta no meio da multidão.
Yoni Gil foi jornalista e está agora desempregado. Veio do estado de Miranda para protestar, como faz todos os dias de protesto, porque "é preciso acabar” a “ditadura".
Marianella de La Cruz hoje dá aulas, mas já teve outras profissões. Não desiste até que "o regime mude para uma democracia".
A sua amiga ouve a conversa e ri-se: "Maduro diz que os americanos querem meter-se cá só por causa do petróleo... que vontade de rir. Então ele quer dizer que os russos, chineses e cubanos estão cá metidos só para provar os panados e as arepas?".
Marianella afirma que lê todos os dias os resumos do El País sobre a Venezuela, porque não confia nos jornais nacionais, a maior parte é controlada pelo Governo e "os jornalistas já fazem autocensura por terem medo".
O português João Martins é de Los Teques, fora de Caracas, mas diz que sente obrigação de se deslocar à capital para "lutar pela mudança do regime".
É produtor de flores e trouxe um milhar de jarros. "Digo às pessoas que guardem num frasco. Um dia vai ser uma recordação dos tempos da ditadura, como os alemães que guardaram pedras do Muro de Berlim".
Em relação ao futuro, diz não esperar nada do governo de Maduro nem dos seus apoiantes internacionais: "Então países violadores dos direitos humanos como a Rússia e a China é que nos vão ajudar a correr com outro violador dos direitos humanos como o Maduro? Não. Só contamos com a Europa, os Estados Unidos, a Colômbia, o Brasil e quase toda a América Latina."
Sobre a posição do português António Guterres, secretário-geral das Nações Unidas, criticada pelos venezuelanos que consideram estar a ser muito passivo perante os atropelos de Maduro, João Martins diz que não é uma posição fácil. "Está encostado contra a parede", afirma.
Para Portugal tem um recado: "Gostava que esses comunistas em Portugal que dizem que não há crise humanitária na Venezuela viessem cá ver. Como eu, que estou cá há 40 anos, venham, venham, não oiçam só o que o ditador Maduro lhes diz, venham ouvir as pessoas".
Diz-se "enojado" com a hipocrisia dos partidos políticos que "dizem existir para defender os povos, mas depois, afinal, tudo não passa de ideologias e politiquices...".
No fim da intervenção, Juan Guaidó gritou: "Vamos continuar sempre na rua. Vamos para a frente Venezuela".
Cantou-se o hino com muita emoção, as pessoas começaram a desmobilizar e voltou a eletricidade àquela zona da cidade.