Um novo "caminho" de Pedro Passos Coelho, feito através de "intervenções cirúrgicas" de um homem que pode sonhar com a cadeira de Belém. Em entrevista à Renascença, Fernando Negrão, antigo ministro da Justiça, antigo diretor da Polícia Judiciária e ex-líder parlamentar do PSD, não contorna as palavras do antigo primeiro-ministro e lança Passos para a corrida à Presidência da República.
Depois de aparecer na campanha e estremecer a direção do PSD ao correlacionar a imigração e a insegurança, Passos Coelho voltou a falar em público e não se absteve de pressionar Luís Montenegro a encontrar soluções com o Chega. Agora, Negrão fala num reposicionamento do partido que é o "desígnio" de Passos Coelho.
Como é que olha para as palavras de Pedro Passos Coelho, que na apresentação do livro “Identidade e Família”, deixou alguns recados sobre a forma como Luís Montenegro deve gerir a sua minoria no Governo?
Eu diria que Passos Coelho não deixou recados a Montenegro. O que se fez foi dar a sua opinião relativamente ao atual momento político e sobre as relações entre o PSD e o Chega. Considerando que a diferença dos resultados eleitorais entre o PS e o PSD é tão escassa, eu diria que a todos os cuidados são poucos. Estamos no início, vamos aguardar os desenvolvimentos da parte de Luís Montenegro.
Quanto a Passos Coelho, o que se sente é que está decidido em trazer uma nova forma de posicionar os partidos políticos do centro português. Ou seja, dar ao PSD uma diferença substancialmente maior relativamente ao PS, para que não seja necessário um terceiro partido.
Acha que esse reposicionamento ideológico de que fala é um caminho que pode funcionar?
É o caminho que Pedro Passos Coelho está a fazer e que os resultados eleitorais indiciam porque quiseram, de facto, uma mudança para uma coisa diferente e ele está a querer fazer essa diferença. Eu diria que é esse o desígnio de Pedro Passos Coelho.
Não acha que as palavras de um ex-líder do PSD e um ex-primeiro-ministro tão influente podem fazer sombra à liderança de Montenegro?
Naturalmente a diferença de opiniões tem sempre esse efeito, principalmente num governo que está a iniciar as suas funções. Mas Pedro Passos Coelho não é propriamente conhecido por ser uma pessoa que evita dizer aquilo que é a sua opinião. De Passos Coelho só espero uma coisa: quando tem alguma coisa para dizer que o diga, a personalidade dele é essa.
Passos Coelho deu a entender que o PSD devia abrir a porta do diálogo ao Chega. Também acha que isso é o caminho?
Acho que ainda não é. Mas Passos Coelho tem razão quando diz que os portugueses votaram por uma prática política diferente. Nós temos um Partido Socialista que está posicionado cada vez mais à esquerda, e, na opinião dele, devemos ter um PSD que deve estar posicionado de maneira a constituir-se como uma verdadeira alternativa ao PS. Por isso acha que o PSD deve dialogar com o Chega com a mesma intensidade que se deve dialogar com o PS.
Será o caminho certo neste momento para desatar o nó que dum Governo que vai apresentar o seu programa nos próximos dias?
Eu diria que Pedro Passos Coelho lançou esta discussão. Está lançada, pode fazer o seu caminho ou não, mas a é uma visão que me parece interessante daquilo que pode ser o futuro.
André Ventura lançou Passos Coelho para a corrida a Belém. Como é que o Fernando Negrão olha para essa possibilidade?
Eu vejo Pedro Passos Coelho como uma real possibilidade de ser candidato a Presidente da República, se ele assim o entender. Tem um passado que honra Portugal, que muitas pessoas reconhecem a importância enquanto primeiro-ministro. Quanto às excitações do Chega, diria que é o que tem menos interesse. Pedro Passos Coelho pode estar no início de um caminho.
É isso que interpreta das aparições públicas mais recorrentes?
Sim, é isso mesmo porque faz a aparições cirúrgicas, intervenções relativamente a temas do maior interesse, onde nunca deixa de dar a sua opinião política sobre o dia a dia.
Seria um candidato mais agregador do que Marques Mendes, por exemplo?
Não, não seria. Dado o atual quadro político, Marques Mendes é mais agregador do que que Pedro Passos Coelho. Mas os portugueses votaram para que houvesse uma mudança e Pedro Passos Coelho está a fazer querer fazer essa mudança. Vamos ver se resulta ou não.
E acha que essa mudança só estará no plano presidencial ou pode passar por um regresso à liderança do partido, no caso, por exemplo, deste governo cair?
Não, se os portugueses querem, de facto, uma mudança, como demonstraram nestas últimas eleições, ela não será só a nível da Presidência da República, mas será também a nível das legislativas e, em consequência, do Governo.