"Inovador, genuíno, sem peias, sem freios ou limites”. São vários os termos usados por António Vitorino para descrever o perfil que corresponde a Donald Trump, o candidato que surge à frente no campo republicano que vai lutar pela nomeação para a corrida à presidência dos Estados Unidos em 2016.
O antigo comissário europeu considera que a emergência de Trump mostra a debilidade dos adversários e explica-se pelo rasto deixado pelo movimento conservador Tea Party no seio do Partido Republicano.
“O Tea Party criou o caldo de cultura, mas tinha calculismo politico. Trump surge em estado de bruto, sem calculismos. É mais genuíno”, assinala Vitorino que acusa aquele movimento de ter criado o "caldo de cultura" para que o discurso de Trump possa ser feito nos Estados Unidos. "A persistência dos resultados dele não é apenas fruto da personalidade bastante controversa do próprio Trump, que diz aquelas enormidades sobre os mexicanos, os hispânicos, que são todos criminosas, traficantes de droga e violadoras”, insiste o antigo ministro socialista no programa “Fora da Caixa”, da Edição da Noite, da Renascença.
António Vitorino confessa que nunca esperou que alguém com o discurso e o perfil de Trump pudesse liderar de forma tão persistente as sondagens no campo republicano. Sobre o futuro de Trump, um desejo: “quero ser descrente (numa eleição de Trump) porque acredito na democracia americana.
Já Pedro Santana Lopes recorda quão desvalorizado foi o então candidato Ronald Reagan que mais tarde seria eleito Presidente. Mas Reagan, sublinha Santana Lopes, não é Donald Trump.
"Eu não quero ofender a memória de um grande presidente dos Estados Unidos nem quero com isso valorizar a figura do senhor Trump, nem pouco mais ou menos. Mas lembro-me que quando apareceu o candidato Ronald Reagan foi muito satirizado, muito menorizado, desprezado, por ser actor de cinema, por uma série de frases mas nunca como estas [de Trump]. E depois foi um grande presidente. Eu devo dizer que não acredito que isso alguma vez venha a acontecer com o senhor Trump. Passar de uma situação em que muitos o satirizam para um dia ganhar eleições e ser um grande presidente ? Nem pouco mais ou menos”, insiste o antigo líder do PSD no debate semanal de temas internacionais da Renascença.
Os problemas de Clinton
Admirador confesso de Hillary Clinton, Santana Lopes considera que a antiga primeira-dama norte-americana está a conduzir uma campanha muito fraca.
“Ela está a fazer uma campanha fraca. Às vezes há o desgaste do ‘produto'. Um rival pode espicaçá-la mas o que tenho visto dela até agora é muito fraco. Não está com força, chama, vitalidade”, observa o social-democrata que recentemente se colocou fora da corrida presidencial portuguesa. “Em Portugal tem-se falado muito nisto a propósito de outras disputas. Isto de ir muito cedo para o terreno às vezes tem prós, outras vezes tem contras”, diz Santana, que não acredita em grandes danos na imagem da candidata causados pelo caso dos emails públicos e privados. A polémica foi causada pelo uso indevido de caixas de correio electrónico privadas por Hillary Clinton, para uso público, quando era Secretária de Estado.
Hillary Clinton domina as sondagens no campo democrata, mas sobe de tom o rumor de uma possível candidatura do ainda vice-presidente Joe Biden, que o próprio estará ainda ponderar. "O senhor Biden é uma ameaça, não uma confirmação”, adverte António Vitorino. Santana Lopes fala num “ caso curiosíssimo entre a ‘amiga' e o ‘irmão' do Presidente Obama”.
O antigo primeiro-ministro lembra que Biden passou pela tragédia recente de perder um filho, causando comoção nos Estados Unidos. “ É um personagem simpático, consensual. Tem estado muito melhor em relação às gafes, mas largado em campanha não sei como será…”, graceja Santana Lopes que, sendo admirador de Hillary, não deixa de fazer uma curiosa análise política no campo democrata.
"Não sei se Biden não seria - espero que não tenha que ser - um antídoto mais eficaz contra o senhor Trump. A senhora Clinton tem uma imagem mais contrastante [mas] o senhor Trump tem ar de tudo menos de 'bonus pater familias’. O senhor Biden pode cobrir ali uma parte dos republicanos, para além dos democratas. Não sei se não seria melhor antídoto”, alvitra Santana Lopes.
Já António Vitorino chama a atenção para a subida gradual do candidato democrata Bernie Sanders nas sondagens.
“É o que está mais à esquerda no partido. O próprio aliás considera-se um socialista, o que nos Estados Unidos não é o mesmo que na Europa. O que significa que há uma franja importante dentro do partido democrata, que também não se revê num jogo clássico. Convenhamos que uma disputa eleitoral entre uma Clinton e um Bush é algo que não se pode considerar muito inovador”, remata o antigo comissário europeu.
O programa "Fora da Caixa" é uma parceria da Renascença com a Euranet, que pode ouvir às sextas-feiras depois das 23h00.