A câmara de Matosinhos quer saber que medidas excecionais serão ativadas pelo Governo para “prevenir o colapso” de empresas que dependem da refinaria da Galp localizada há 50 anos neste concelho, mas que será descontinuada, conforme foi hoje revelado.
“Que medidas excecionais serão ativadas pelo Governo relativamente aos trabalhadores da refinaria da Galp de Matosinhos? Que medidas excecionais serão ativadas pelo Governo para prevenir o colapso das empresas que dependem diretamente da atividade da refinaria da Galp, nomeadamente as empresas sediadas na região de Matosinhos e concelhos periféricos?” – são duas das perguntas que constam de uma carta dirigida pela autarquia de Matosinhos ao Ministério do Ambiente e da Ação Climática à qual a Lusa teve acesso.
A câmara liderada pela socialista Luísa Salgueiro também pede ao gabinete de João Pedro Matos Fernandes que este indique “quais os mecanismos que utilizará o Governo para assegurar o desmantelamento e descontaminação de solos da refinaria da Galp” em Matosinhos, no distrito do Porto.
“Pretende ainda o Município de Matosinhos saber se o Governo irá exigir a descontaminação de solos, mesmo perante uma possível reconversão da área ocupada pela refinaria da Galp noutras funções industriais ao serviço da mesma empresa”, lê-se na carta que é enviada ao executivo de António Costa no dia em que a Galp anunciou que vai concentrar as suas operações de refinação e desenvolvimentos futuros no complexo de Sines e descontinuar a refinação em Matosinhos a partir do próximo ano.
Na mesma carta, a câmara de Matosinhos também pede esclarecimentos sobre a utilização do “Fundo para a Transição Justa”, que dotou Portugal com 200 milhões de euros destinados à minimização dos primeiros impactos sociais e económicos da transição climática.
A autarquia faz referência ao Anexo D do “Fundo para a Transição Justa”, o qual identifica no caso português os casos de Sines e de Matosinhos como “focos de poluição derivada da indústria carbonífera e petrolífera que urge reorientar para os desígnios da agenda 2050”.
“Por outro lado, o senhor primeiro-ministro anunciou recentemente que um dos temas essenciais da presidência portuguesa da União Europeia será o reforço do pilar social europeu, especificamente no que diz respeito aos impactos sociais das transições digital e climática, pelas consequências nefastas que as mesmas trarão a nível do emprego e da sobrevivência de alguns setores da economia europeia”, recorda a câmara de Matosinhos, dirigindo perguntas a Matos Fernandes entre as quais questões sobre compensações económicas.
“O Município de Matosinhos pretende [saber] qual o valor do Fundo para a Transição Justa destinado a minorar os impactos da desativação da refinaria da Galp de Matosinhos? Manter-se-á, relativamente ao Município de Matosinhos, o mesmo objetivo de compensação económica e social previsto no Anexo D para os municípios de Sines e Abrantes?”, são perguntas que constam da missiva.
Outra das questões da câmara de Matosinhos diz respeito à tipologia de apoios, lembrando os incentivos às pequenas e médias empresas inovadoras na área ambiental e de produção de energia limpa, projetos de I&D na área da economia azul e verde, incentivos a projetos de economia circular, incentivos a projetos de utilização de energias limpas e renováveis.
A câmara também questiona se a Galp será elegível para a obtenção de fundos públicos provenientes do “Fundo para a Transição Justa”, sendo que em caso afirmativo, a autarquia pede para ter conhecimento do valor a disponibilizar e quais os fins.
Na carta, o executivo de Luísa Salgueiro reitera, ainda, o que referiu em conferência de imprensa esta manhã, de que “o Município de Matosinhos não aceitará novas utilizações das atuais instalações da refinaria de Leça da Palmeira que constituam impactos ambientais negativos para a comunidade”.
“Assim, “e sendo do conhecimento público que a Galp estará a preparar planos para a reconversão da sua unidade industrial neste concelho”, a autarquia pede ao ministro do Ambiente que este forneça “todos os estudos e documentos na posse do Governo relacionados com estas pretensões da Galp”.
“Cientes de que a desativação da refinaria da Galp em Matosinhos contribuirá para os objetivos ambientais, não podemos aceitar que Matosinhos, após 50 anos de contribuição para o país, suportando os efeitos negativos da presença da refinaria, seja a primeira vítima da transição climática, sem que a comunidade obtenha a devida compensação”, conclui a autarquia que, por fim, ainda recomenda ao Governo que “exija à Galp o cabal cumprimento das suas responsabilidades sociais e ambientais”.
A Galp anunciou hoje, num comunicado enviado à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), que “continuará a abastecer o mercado regional mantendo a operação das principais instalações de importação, armazenamento e expedição de produtos existentes em Matosinhos”, e que está a “desenvolver soluções adequadas para a necessária redução da força laboral e a avaliar alternativas de utilização para o complexo”.
A empresa diz que as "alterações estruturais dos padrões de consumo de produtos petrolíferos motivados pelo contexto regulatório e pelo contexto covid-19 originaram um impacto significativo nas atividades industriais de ‘downstreaming’ da Galp”, e afirma que “o aprovisionamento e a distribuição de combustíveis no país não serão impactados por esta decisão”.
Esta reconfiguração “permitirá uma redução de mais de €90m por ano em custo fixos e investimentos e c.900kt das emissões de CO2 e (scope 1 e 2) associadas ao sistema atual”, refere a nota.
Esta decisão já desencadeou várias reações com o Governo a considerar que a decisão da Galp "levanta preocupações" em relação ao destino dos trabalhadores, mas a lembrar que as medidas anunciadas se inserem num processo que visa a descarbonização do setor energético.