A presidente da Comissão de Atletas Olímpicos (CAO), a ex-nadadora Diana Gomes, disse esperar que as recentes denúncias de assédio sexual no desporto possam ajudar a derrubar um "silêncio envolvido com vergonha" em torno do fenómeno.
"Sempre foi um silêncio envolvido com vergonha, com a vítima se achar sempre culpada face a assédio sexual ou outro tipo de abusos. Acho ótimo que se estejam a quebrar estas barreiras", explicou em entrevista à Lusa.
Várias futebolistas que alinharam no Rio Ave em 2020/21 denunciaram, numa notícia publicada na semana passada pelo jornal Público, ações de assédio sexual do então treinador do clube de Vila do Conde Miguel Afonso, que atualmente orientava o Famalicão, tendo também o diretor desportivo Samuel Costa sido alvo de um processo disciplinar.
Se nunca passou por qualquer situação de assédio ou abuso sexual "na primeira pessoa", soube "mais tarde, por amigas", de três situações "que tiveram com treinadores" ao longo da carreira.
"Fiquei supertriste por elas, perguntei porque não falaram disso na altura. Todas me responderam: por vergonha, porque achavam que tinham sido provocadoras. Acabaram por assumir um bocado da culpa", contou.
No que toca ao trabalho preventivo e de combate, Diana Gomes considera essencial "um sistema em que as vítimas sintam que vão estar protegidas, de que não vão ser elas postas em causa".
"Tem sido esse o caminho, denunciam e a vítima é dada por culpada. Falta-nos aquela trajetória final em que a vítima é realmente protegida, tem ferramentas e todo um sistema que a vai projetar e não expor, como muitas vezes acaba por ser o caso. Neste caso, tiveram de ser as jogadoras a dar o murro na mesa, a exporem-se para conseguir expor o tema", lamentou.
Faltando "consolidar a parte final da solução", a partir das plataformas de denúncia e o acompanhamento e resolução dado a cada caso, a presidente da CAO nota o "dever para com a sociedade" destes desportivas, envolvidos no trabalho em prol do desporto.
Nesse âmbito, reuniu recentemente com o secretário de Estado da Juventude e do Desporto, João Paulo Correia, para falar sobre o assunto, a partir de um grupo de trabalho no Governo ligado ao fenómeno.
Nessa reunião, falou "sobre o Observatório Nacional da Violência Contra Atletas", do qual é embaixadora, e da dificuldade daquele organismo em "receber denúncias terminadas". "Muito poucas chegam ao final e muitas, crê-se, é por não verem uma solução. É mesmo por aí o caminho, e estamos a começar a pensar em algo para conseguir ajudar o sistema e todas as vítimas de violência", afirmou.
Quanto ao caso concreto que tem sido discutido e mediatizado na última semana, espera "que a consequência corresponda ao que as atletas sofreram, e não algo leve".
"Tem de haver um exemplo de que há um final que corresponde às expectativas das atletas, e eventualmente outros casos virão a aparecer", atirou.