Com a legalização da eutanásia aprovada em votação final global, a única dúvida agora é se terá promulgação direta ou não.
As vozes dos que estão contra este processo voltam-se agora para Belém. Contudo, o Presidente da República não pode travar a lei, ou seja, não pode impedi-la de entrar em vigor. Só o Tribunal Constitucional poderá se for chamado a analisar o diploma e se pronunciar pela inconstitucionalidade.
Que opções tem o Presidente?
O Presidente pode promulgar, vetar ou enviar para o Tribunal Constitucional para fiscalização preventiva. Marcelo Rebelo de Sousa recusou várias vezes dizer o que fará, argumentando que não se podia pronunciar sobre um diploma que ainda estava no Parlamento.
Então, o Presidente pode impedir que a lei entre em vigor?
Não. Quando muito pode adiar. Se o Presidente usar o veto político - que consiste em reenviar a lei para o Parlamento, com ou sem mensagem a justificar o seu veto -, a Assembleia da República pode voltar a aprovar a lei tal e qual e, nesse caso, o Presidente é obrigado a promulgar. Se o Parlamento alterar o diploma depois do veto, o Presidente ainda pode voltar a vetar.
Contudo, Marcelo Rebelo de Sousa não tem intenção de usar o veto político nesta matéria. “O veto político não será uma afirmação de posições pessoais”, disse o Presidente, em maio de 2018, em entrevista à Renascença e ao Público, quando questionado sobre este assunto.
Uma votação expressiva como a que decorreu esta sexta-feira pode levar, portanto, a uma promulgação direta por parte do Presidente, a não ser que encontre algum problema legal no diploma. A lei foi aprovada por maioria absoluta dos deputados, conseguindo ainda mais votos a favor e menos votos contra que na votação na generalidade, há quase um ano. Na votação na generalidade, projeto mais votado tinha sido o do PS com 127 votos a favor, 14 abstenções e 86 votos contra. Agora, a versão final que resultou dos cinco projetos iniciais foi aprovada com 136 votos a favor, quatro abstenções e 78 votos contra.
Quando é que o Presidente tem de decidir?
Depende da data em que o diploma chegue a Belém. A lei só deve ser enviada para o Presidente no fim da próxima semana. Depois, Marcelo tem oito dias para decidir se a envia para o Tribunal Constitucional. Não enviando, tem 20 dias para decidir se promulga ou veta. Ou seja, até ao fim de fevereiro haverá decisão.
E o Tribunal Constitucional?
Se o Tribunal Constitucional considerar que a lei é inconstitucional, o Parlamento terá de alterar a lei com base nas recomendações dos juízes. Contudo, haverá poucas hipóteses de isso acontecer. Segundo fontes contactadas pela Renascença, a maioria dos juízes será favorável ao entendimento de que a eutanásia não representa um problema de constitucionalidade. O atual presidente do Tribunal Constitucional, Costa Andrade, manifestou esse entendimento quando foi ouvido no Parlamento na anterior legislatura, antes de presidir àquele órgão.
Em causa, para quem defende a inconstitucionalidade da eutanásia, está o artigo 24.º da lei fundamental, que garante o direito à vida. O número 1 desse artigo diz “A vida humana é inviolável” e o número 2 garante que “em caso algum haverá pena de morte”.
Só o Presidente é que pode mandar para o Tribunal Constitucional?
Não. Mas só o Presidente é que pode pedir a fiscalização preventiva, ou seja a fiscalização antes de a lei entrar em vigor. Os deputados também podem pedir fiscalização constitucional, desde que o requerimento seja assinado por 23 parlamentares (um décimo do número total de deputados), mas só depois de a lei entrar em vigor. Chama-se fiscalização sucessiva. Na anterior legislatura, por duas vezes grupos de deputados pediram fiscalização sucessiva de leis que o Presidente não enviou para o Tribunal Constitucional e conseguiram que os juízes lhes dessem razão: nas normas sobre gestação de substituição (vulgarmente conhecida por lei das “barrigas de aluguer”) e na legislação sobre o acesso a metadados.
Quanto tempo demora o Tribunal Constitucional a decidir?
Se for fiscalização preventiva o prazo é de 25 dias, a não ser que o Presidente peça urgência. Para a fiscalização sucessiva, não há prazo definido.