O Ministério Público e a Polícia Judiciária realizaram na segunda-feira 100 buscas no âmbito da Operação Miríade, a investigação sobre o envolvimento de militares portugueses num caso de tráfico de diamantes, ouro e drogas.
O caso suscitou inúmeras reações e também chegou ao conhecimento das Nações Unidas, dado que os militares terão aproveitado a sua prestação em missões da ONU na República Centro-Africana.
O que é que a justiça está a investigar?
Um alegado esquema de tráfico de diamantes, ouro e droga, num esquema montado por militares portugueses que estiveram na República Centro-Africana em serviço nas missões de manutenção de paz das Nações Unidas.
Seria fácil para os militares trazerem esses materiais?
Seria relativamente fácil, porque os voos militares não eram fiscalizados e o tráfico seria feito nas malas dos próprios militares. Ao que se julga, os militares terão estabelecido contactos com elementos de grupos armados que controlam zonas mineiras da República Centro-Africana, onde são extraídos os chamados diamantes de sangue, por serem justamente obtidos em zonas de guerra.
Eram introduzidos em Portugal e depois seguiam de carro para Antuérpia, na Bélgica, considerada a capital mundial do comércio de diamantes. O pagamento era depois convertido em criptomoedas (moedas virtuais) para que não fosse detetado pelas autoridades, ou seja, uma forma de branqueamento de capitais.
Quantas pessoas foram detidas?
Até agora 10, quase todos com ligações diretas aos Comandos, militares e ex-militares, e que devem começar esta terça-feira a ser interrogados pelo juiz Carlos Alexandre. A operação envolveu 100 buscas de norte a sul do país, 95 domiciliárias e cinco não domiciliárias.
E esses 10 detidos serão todos os envolvidos no esquema?
Não. A imprensa desta terça-feira refere que 40 empresas (algumas de fachada) e cerca de 70 pessoas estarão envolvidas. Algumas dos envolvidos emprestaram as contas bancárias para que o dinheiro pudesse ser dissimulado. A investigação acredita que terão sido movimentados dessa forma cerca de um milhão e meio de euros, mas segundo a TVI, o montante total envolvido neste negócio seria muito superior, na ordem dos 500 milhões euros.
Quando é que esta rede foi descoberta?
A primeira denúncia sobre este esquema data de dezembro de 2019, esclareceu a tutela. O ministro da Defesa garantiu também que comunicou as suspeitas às Nações Unidas nos primeiros meses de 2020. Feita a denúncia, o caso foi também reportado à Polícia Judiciária Militar que, por sua vez, comunicou ao Ministério Público. Foi depois o Ministério Público que depois decidiu que a entidade responsável pela investigação seria a Polícia Judiciária.
Quem denunciou o caso?
Segundo o jornal “Público”, foi um intérprete da missão a quem Paulo Nazaré, principal arguido do caso, terá prometido 20% dos dividendos de um negócio de diamantes. Paulo Nazaré, que deixou as Forças Armadas em 2018, não foi apanhado pela polícia e, ao que se sabe, estará a viver em África.
E o Presidente da República, comandante supremo das Forças Armadas, sabia do caso?
Há dúvidas sobre se o Presidente da República foi atempadamente informado, porque segundo Marcelo Rebelo de Sousa, que está de visita a Cabo Verde, mesmo sendo comandante supremo das forças armadas não soube de pormenores, porque a investigação desta operação "Miríade" decorreu “sob sigilo" durante estas quase dois anos e culminou ontem nas buscas desencadeadas em vários pontos do país.
Além de denunciar o caso, as Forças Armadas fizeram mais alguma coisa?
Sim, reforçaram os procedimentos de controlo e verificação à chegada dos militares que vinham da Força Nacional Destacada na República Centro-Africana, bem como as suas cargas.
E porque é que esta operação se chama Miríade?
Não foi explicado, mas uma vez que “miríade” significa um grande número é de supor que tenha a ver com os montantes envolvidos e com o elevado número de pessoas implicadas e de estratégias usadas nesta rede criminosa.