Esta é a história de um ano e meio de trabalho. O fotojornalista Eduardo Martins quis retratar em fotografia as cores da vida da comunidade indonésia piscatória das Caxinas. O resultado está na exposição “Nelayan”, no espaço Mira Fórum, no Porto e que este sábado abre uma extensão no mercado das Caxinas pelas 11horas.
Em entrevista ao Ensaio Geral da Renascença, o fotografo conta como foi “fácil” mergulhar nas vidas destes pescadores. “Houve uma grande abertura desde o início”, explica Eduardo Martins que sentiu da parte desta comunidade “uma grande vontade de pertença ao espaço onde estão a trabalhar”.
Os rostos que retratou e as histórias que conta são apenas de uma parte dessa comunidade que é composta por um total de 500 pescadores indonésios. São contratados por armadores para suprimir a falta de mão-de-obra no setor na região e representam já mais de 50 por cento da força de trabalho daquela comunidade piscatória.Segundo Eduardo Martins, a curiosidade para realizar esta fotorreportagem nasceu “por acaso”, de uma simples “ida a um supermercado indonésio no Porto”. O fotografo que viveu em Macau perguntou à dona daquele espaço comercial quem eram os seus clientes. Daí até chegar às Caxinas foi um salto.
Apesar da barreira linguística, Eduardo Martins foi em busca destes pescadores que lhe abriram as portas de casa, onde retratou as suas vidas para além do trabalho. Com eles embarcou também abordo para mostrar a “jorna de trabalho” de “pelo menos 14 horas seguidas”. As imagens que expõe no espaço Mira Fórum espelham a dureza desse trabalho.
“A mim interessou-me muito, primeiro trazer a história individual de cada um deles. Os retratos são acompanhados por cartas que lhes pedi para escreverem às famílias. Não me interessava que fosse um trabalho só sobre uma comunidade, mas tentei estabelecer um diálogo e um método quase colaborativo entre mim e eles. É o único modo de um trabalho destes se validar e ter algum peso social”, explica Eduardo Martins.
O fotografo que quis “dar voz” a esta comunidade quis mostrar “o dia-a-dia” destes homens e “tentar perceber as dinâmicas dentro do barco, e os ritmos que têm”. Para complementar a exposição de fotografia, no espaço Mira Fórum está também um ecrã com um vídeo com os testemunhos destes pescadores.
“Foi um vídeo que achei desde o início que seria muito importante fazer com entrevistas a alguns elementos para perceber as motivações deles terem vindo para Portugal”, indica o fotografo nascido em Viseu. Segundo Eduardo Martins, muitos destes pescadores procuram “dar suporte à família, querem casar e têm projetos”.
Questionado sobre se esta comunidade enfrenta algum tipo de preconceito, ainda fruto da relação entre Portugal e a Indonésia por causa de Timor-Leste, Eduardo Martins reconhece que há ainda resquícios disso. “Há ainda muitas pessoas que os questionam e que ao falarem da Indonésia nas conversas, lhes dão essa carga negativa da Indonésia. Eles muito prontamente tentam desmistificar”.
Eduardo Martins vai mais longe e conta que “existe também a questão da própria religião. Neste vídeo há pelo menos dois pescadores que falam disso e de como as pessoas têm a perceção errada daquilo que é a religião deles. Eles não estão a tentar incutir a religião a ninguém e respeitam a religião dos outros, e pedem que respeitem a deles”.
Com isto diz o fotografo, esta comunidade tenta “desmistificar e desconstruir alguns preconceitos que existem”, tal como o seu trabalho tenta dar a conhecer uma realidade desconhecida do grande público que à mesa come o peixe que estes pescadores pescam.